Antes das eleições, a valsa das alianças
Um pouco mais de um mês das eleições federais na Suíça, as negociações para estabelecer alianças entre os partidos estão a todo vapor. Em um sistema onde há perdedores e vencedores, algumas dessas uniões são controversas. É preciso escolher bem o seu parceiro.
Raramente se falou tanto do jogo de alianças que ocorre entre os partidos antes das eleições legislativas. Este ano, a polêmica ao redor de uma decisão tomada pelo Partido Popular Suíço (SVP, direita conservadora) em Solothurn colocou o tema sob os holofotes.
Em 29 de julho, Nicolas Rimoldi, presidente do movimento Mass-Voll, desfilou ao lado de grupos de extrema direita na Áustria. Dois dias mais tarde, a seção do SVP de Soluthurn anunciou uma aliança com o movimento, conhecido por seu ceticismo quanto ao combate do coronavírus.
O partido nacionalista se recusou a comentar a decisão. “Não é da nossa conta. As seções cantonais são livres para estabelecer suas próprias alianças, mesmo que a nossa recomendação seja de se aliar ao Partido Liberal Radical (PLR/FDP, direita)”, enfatizou o presidente do SVP, Marco Chiesa, durante a conferência de imprensa que marcou o lançamento da campanha do partido.
O SVP tem um bom motivo para não querer se intrometer nos assuntos das seções cantonais. A aliança com o Mass-Voll em Solothurn não deve prejudicar o partido, afirma o cientista político Sean Müller. “Pelo contrário, se houver um assento a mais para ser distribuído graças a essa aliança, ele beneficiará o SVP. Dentro da aliança, os assentos conquistados são distribuídos de acordo com o número de votos dos dois partidos. Dessa forma, o partido maior se beneficia mais”, explica.
Em 25 de agosto, a seção do SVP de Lucerna também declarou que apresentaria uma lista eleitoral conjunta com o Mass-Voll. A decisão tem como objetivo recuperar a cadeira no Conselho Nacional que foi perdida nas eleições de 2019.
A corrida por alianças
O SVP não é o único partido à procura de parceiros. Em ano eleitoral, todos os partidos negociam com possíveis aliados para maximizar suas chances de conquistar assentos. O sistema eleitoral suíço permite que dois ou mais partidos unam suas listas para a eleição do Conselho Nacional (câmara baixa), que é regida pelo sistema proporcional, exceto nos cantões que só elegem um deputado ou deputada. A ideia de base é possibilitar que os pequenos partidos sejam representados no Parlamento.
O modo de distribuição dos assentos parlamentares depende do sistema eleitoral. No sistema proporcional, os assentos são inicialmente divididos entre os partidos de acordo com o número de votos obtidos. Depois, são atribuídos aos candidatos com mais votos dentro da lista eleitoral. No sistema majoritário, o candidato com o maior número de votos é eleito.
Os votos obtidos pelos dois partidos são contabilizados juntos. Assim, no momento da contagem, o grupo de aliados obtém um determinado número de assentos, que são então divididos entre os partidos em função do número de votos recebido. Esse número, contudo, nunca é redondo. Nesse caso, a união de listas permite que os votos restantes sejam contabilizados juntos numa tentativa de conseguir mais uma cadeira no Parlamento.
Esse sistema tem se mostrando bastante desfavorável ao SVP, que tem dificuldade de formar alianças. Nas últimas eleições legislativas, as alianças dos outros partidos fizeram com que o SVP, o maior partido da Suíça, perdesse sete assentos, segundo uma análiseLink externo do jornal Tages-Anzeiger. Foi por isso que o presidente do partido defendeu uma aliança com o PLR “para impedir o avanço da esquerda”. Seus desejos foram parcialmente atendidos, com alianças sendo formadas em vários cantões.
A aliança PLR-SVP enfrenta dificuldades
Entre os liberais-radicais, no entanto, a proposta de aliança provocou tensões. No cantão de Zurique, por apenas um voto e após intenso debate, os delegados e delegadas do PLR acabaram concordando em unir forças com o SVP. Alguns deles acreditavam que o PLR teria mais a ganhar agindo sozinho, dado que ambos os partidos eram “fundamentalmente diferente”.
Realmente, não há certeza de que uma aliança com a direita conservadora seja vantajosa para o PLR. Ainda segundo a análise do Tages-Anzeiger, se o PLR tivesse se aliado ao SVP em todos os cantões em 2019, ele não teria obtido nenhum assento a mais no Conselho Nacional. Para Sean Müller, a aliança pode ser prejudicial para os liberais-radicais nas eleições legislativas deste segundo semestre, especialmente nos cantões onde o SVP é forte, como Berna e Zurique.
Além disso, a união de listas não é apenas uma questão de aritmética. “As posições muito diferentes do SVP e do PLR sobre certas questões sociais ou de abertura para a Europa fazem com que essa aliança seja difícil de explicar”, observa Müller. Em uma coletiva de imprensa realizada recentemente, o PLR foi particularmente crítico da posição do SVP no que diz respeito à migração, descrevendo-a como irresponsável.
As principais figuras do partido argumentam, contudo, que uma aliança pode ser feita apesar das divergências sobre determinadas questões. “No nosso sistema, precisamos colaborar com outros partidos para promover nossos ideais”, defendeu o presidente do PLR, Thierry Burkart, diante da mídia. “A esquerda nunca abriu mão de forjar alianças úteis”, justificou a deputada do PLR Jacqueline de Quattro, durante a mesma conferência de imprensa.
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A estratégia no centro político
A fim de “reagrupar as forças do centro político”, o Centro, os Verdes Liberais (PVL/GLP) e o Partido Evangélico (PEV) adotaram uma estratégia comum para as eleições federais. Os três partidos encorajaram suas seções cantonais a formarem listas conjuntas, o que foi feito em seis cantões.
No entanto, a palavra de ordem não parece ter sido aceita em todos os lugares. Em vez disso, em alguns cantões, os Verdes Liberais optaram por estabelecer uma aliança com a esquerda, enquanto o Centro preferiu se unir ao PLR. No Ticino, no Jura e no Valais, o Centro e os Verdes Liberais não se aliaram a ninguém.
“O fato de os Verdes Liberais se aliarem tanto ao Centro quanto à esquerda é mais fácil de entender do que a aliança do PLR com o SVP. Trata-se de um partido pequeno, que, por isso, precisa se aliar a uns ou outros em função de constelações ou preferências políticas”, comenta Müller. Também se trata do partido que mais se beneficia das uniões de listas, que lhe renderam cinco assentos em 2019.
Há quatro anos, o Centro também obteve dois assentos a mais graças às alianças feitas. Apesar disso, o cientista político Daniel Bochsler, entrevistado pela radiotelevisão de língua alemã SRFLink externo, avalia que a sua união de forças com o PLR em certos cantões é arriscada. Ele explica que é preferível se aliar a partidos de tamanho semelhante, pois quem se alia a partidos muito maiores frequentemente sai perdendo.
Rachaduras na aliança de esquerda
Os Verdes e o Partido Socialista conseguiram unir suas listas para as eleições do Conselho Nacional em todos os cantões. Mas essa união não é perfeita: sinais de discórdia surgiram na corrida para o Conselho de Estados (câmara alta). Em Neuchâtel e no Jura, os únicos cantões que elegem senadores e senadoras pelo sistema proporcional, os dois partidos não conseguiram entrar em acordo. Em Berna, a candidata socialista e o candidato do Partido Verde decidiram concorrer separadamente.
No entanto, segundo Sean Müller, não há risco de cisão na esquerda. O cientista político avalia que esses atritos não impedem a esquerda de formar um bloco unido no Parlamento e em suas recomendações de voto. “Os dois partidos são minoritários e muito parecidos. Se há fissuras, elas são mais temporárias ou pessoais. É do interesse deles continuar se aliando, e eles sabem disso”, conclui.
Sublistas limitadas
Dentro de uma aliança, duas ou mais listas também podem se reagrupar em uma sublista. Além de apresentar uma lista principal, na qual frequentemente estão os principais candidatos e candidatas, um partido também pode apresentar uma ou mais sublistas, cujos votos contribuem para aumentar os números do partido.
Este ano, essa possibilidade foi limitada graças a uma modificação nas diretrizes federais para a eleição do Conselho Nacional. Embora dois ou mais partidos possam unir suas listas, as sublistas não são mais permitidas, sendo possíveis apenas entre listas de um mesmo partido que se diferenciem por idade, sexo ou região.
Por exemplo, no cantão de Neuchâtel, os socialistas, os Verdes, o POP (Partido Operário Popular) e o SolidaritéS tinham o costume de formar uma ampla aliança. Ela era complementada por uma sublista composta pelos três últimos partidos. Agora, isso não é mais possível. Por outro lado, os Verdes poderão criar uma sublista com sua nova lista, a dos Jovens Verdes de Neuchâtel.
(Adaptação: Clarice Dominguez)
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