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Como transformar lixo em ouro

Model der KEZO Hinwil
Um modelo da usina de beneficiamento de lixo da KEZO Hinwil. Ela não só incinerará resíduos, mas também recuperará os metais. Thomas Kern/swissinfo.ch

A Suíça é líder mundial na recuperação de metais, uma atividade que vale muito a pena e atrai interesse internacional. Uma visita a uma instalação pioneira juntamente com uma delegação do Japão.

Daniel Böni enfia a mão no contêiner. “Sempre se acha algo”, diz ele, estendendo a mão. Uma estaria demasiado enferrujada, com a outra ainda se poderia arriscar um jogo, no total ele encontra três bolas de bocha. Na Suíça, as bolas de bocha acabam entre detritos simplesmente porque as pessoas as jogam no lixo. Isso é um golpe para um país que se orgulha de suas taxas de reciclagem em muitas áreas.

Porträt eines Manns im blauen Hemd
Daniel Böni, diretor-executivo da KEZO Hinwil. Thomas Kern/swissinfo.ch

Böni é o diretor-administrativo desta usina de descarte e reciclagem de resíduos. Hoje ele conduz uma delegação do Japão pelo local. A KEZO Hinwil é uma pioneira na recuperação de metais. Filtra os resíduos de residências e empresas suíças. Os resíduos domésticos suíços são incinerados – mas o que realmente interessa nas cinzas não são bolas de bocha, mas sim metais como o alumínio, platina e ouro.
 
“Às vezes encontramos uma corrente de ouro ou uma barra muito pequena”, diz Böni. “Talvez elas escapem quando a avó escondeu algo demasiado bem. Depois acaba no lixo quando a casa é limpa”. A verdadeira razão pela qual a recuperação de metais vale a pena é o lixo eletrônico: nele podem ser encontradas partículas de metais valiosos.

Negócio lucrativo

“Com o preço do ouro agora, a coisa vai muito bem”, diz Böni alegremente. E no fim de contas gera um bom dinheiro: “Se eu tivesse tirado apenas os lucros das vendas de metais em vez de um salário, teria me saído muito melhor”.

Mas, segundo o diretor-administrativo, a recuperação de metais não é só economicamente interessante, mas também ecologicamente significativa. É pelo menos tão importante quanto o uso da energia gerada pelo processo de incineração.

Eisen nach der Verbrennung
O primeiro passo após a incineração é remover metais das cinzas residuais com um ímã. ©2022 Thomas Kern/swissinfo.ch

Quando a KEZO começou há 15 anos, não era certo que o princípio funcionaria. Atualmente existem cinco instalações na Suíça com esse sistema, e está previsto o funcionamento de outras duas. Em breve o ouro será filtrado de todos os resíduos suíços. A nível internacional, isso constitui uma exceção. “Não fazem isso em nenhum outro lugar do jeito que fazemos”, diz Böni, deixando poucas dúvidas de que acredita nesse princípio.
 
A principal tarefa da KEZO Hinwil é a incineração de todos os resíduos que não sejam reciclados. A “incineração de resíduos” é normal na Suíça – mas, numa comparação global, é um caso especial. De acordo com o Banco Mundial, apenas cerca de 11% dos resíduos urbanos são incinerados a nível global. Na América do Norte, por exemplo, esse número dificilmente é maior. No continente norte-americano mais de metade dos resíduos acaba em aterros sanitários. O Japão está mais próximo da Suíça a esse respeito: apenas 1% do lixo urbano é enviado para aterros sanitários, 80% é incinerado. O Banco Mundial decompôs esses números no livro “What a Waste 2.0”. Os visitantes da empresa Hitachi Zosen, no entanto, já estão familiarizados com o princípio.

Böni, porém, cita as vantagens da incineração em relação à recuperação de metais: “O metal encolhe no processo e os metais individuais são mais fáceis de separar”. Pedaços de folha de alumínio esticam juntos e formam pequenos aglomerados.
 
Ele sublinha com mais ênfase para os visitantes o processamento a seco das cinzas dos resíduos. As máquinas de filtragem entopem se as matérias-primas estiverem mesmo ligeiramente úmidas.

Cinzas secas sem pó

Existem reservas quanto ao manuseio a seco de cinzas na indústria de eliminação de resíduos. Cinzas de base seca, daí o preconceito, produz e espalha pó em todos os lugares – um risco para a saúde dos operários e operárias. Em Hinwil, nenhuma partícula parece penetrar através dos postigos da usina. A instalação é, como confirmam os visitantes com um aceno de cabeça à insistência de Böni, limpa. Que as cinzas sejam processadas a seco é a exceção. Até agora, existem cinco dessas instalações na Suíça, com mais duas em planejamento. A Suécia tem uma e na Itália há seis. “A Itália utiliza o mesmo método para poupar água”, explica Böni.

O primeiro passo é a remoção com um íman de todo o metal ferroso das cinzas residuais. Em uma segunda etapa, operários e operárias pescam à mão das cinzas bolas de bocha e motores de aspirador. A partir daí, o material segue para um sistema automático. O sistema de correias transportadoras e máquinas com telas filtrantes cada vez mais finas percorre vários edifícios e andares. O barulho é alto durante todas essas etapas de processamento, e motores rugem ao mesmo tempo de todos os lados. Mas o som das partículas à medida que voam contra tubulações e painéis transforma-se gradualmente em um murmúrio – quanto mais finas as partículas se tornam.

Não é um pote de ouro

“É um processo de produção”, diz Böni. Produzimos metais. Num dia, é produzido um saco de 1,2 toneladas de granulado puro de alumínio. Como o alumínio é mais leve do que outros metais, as máquinas podem separar as peças por peso. O rendimento do metal precioso é de cerca de 540 toneladas por ano. Brilha no recipiente aberto com os metais preciosos – os visitantes estendem o braço, com cuidado, e tentam colher em suas mãos em caráter experimental parte do material angular. Alguns reluzem. É realmente ouro?

Gelblicher Metallbarren
Não é ouro, mesmo que seja amarelo e brilhante. Mas há muitos outros metais valiosos além do ouro para os quais o processo de recuperação vale a pena. ©2022 Thomas Kern/swissinfo.ch

Não há pote de ouro em Hinwil. A KEZO vende os metais preciosos como uma mistura. Nesta mistura são valiosos o cobre, o paládio e o ouro. Os preços de mercado dessa amálgama de metais e de alumínio são também decisivos para o negócio. “Às vezes estamos no meio do paraíso, outras vezes cercados de problemas”, diz Böni.

Os preços dos metais são importantes para o lado econômico. Ecologicamente, diz o diretor-administrativo, esse tipo de processamento de metais também poupa equivalentes de CO2. Uma vez que a recuperação consome menos energia do que a extração dos metais.

No entanto, os resíduos de cinzas que permanecem no final são também enterrados em aterros sanitários na Suíça. Simon Retailleau, que trabalha nos escritórios de Zurique da Hitachi Zosen, considera isso digno de crítica: “Os restos poderiam ser utilizados no processamento de cimento ou na construção de estradas, por exemplo, como é feito em outros países”.

Retailleau tem dificuldade em compreender por que isso não acontece. Quando questionado a esse respeito, a Agência Federal Suíça para o Meio Ambiente (Bafu, na sigla alemã) diz que os resíduos das usinas de incineração excedem os valores-limite para uso na produção de cimento. Também não devem ser diluídos. Assim, os aterros sanitários são inevitáveis na Suíça para impedir a entrada de materiais contaminados (…) no meio ambiente, segundo a Agência Federal em resposta a uma pergunta.

Contudo, a Bafu explica também que na Suíça todos os anos seis milhões de toneladas de “resíduos de demolição” e 12 milhões de toneladas de “material de escavação” acabam em aterros, que não excedem os valores-limite e poderiam ser utilizados na indústria da construção.

Durante o passeio pelas instalações, os visitantes da Hitachi Zosen dizem frequentemente como tudo isso é interessante. Em várias formas comparativas – de “interesting” a “very, very interesting”.

Vier Menschen stehen vor einem Container.
Sachiko Oochi (terceira à partir da esquerda) Thomas Kern/swissinfo.ch

Sachiko Oochi lidera a delegação do Japão. Ela dirige o departamento de pesquisa da empresa no Japão. Após a visita, Oochi diz não ter esperado essas dimensões: “O tamanho da planta me surpreendeu”. Ela aprendeu algumas coisas. O conteúdo das cinzas residuais é diferente no Japão e na Suíça. “É necessário um estudo cuidadoso para ver se o mesmo caminho pode ser seguido no Japão. Mas, na minha opinião, vale a pena considerar”. Resta saber se o Japão logo estará cavando ouro em seu próprio lixo.

Edição: Marc Leutenegger

Adaptação: Karleno Bocarro

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