Ex-CEO do terceiro maior banco suíço é acusado de fraude
Um dos maiores julgamentos de fraude financeira na Suíça está tomando conta das manchetes nacionais. Em Zurique, Pierin Vincenz, ex-CEO do banco suíço Raiffeisen, está sendo julgado junto com supostos cúmplices - como Beat Stocker, ex-diretor da empresa de pagamentos digitais Aduno.
Vincenz e Stocker são acusados de desviarem milhões de francos para seus próprios bolsos, enquanto lideravam aquisições de uma série de empresas.
Embora o Raiffeisen não esteja sendo julgado, a reputação do banco foi arrastada na lama por autorizar luxuosas viagens ao exterior e saídas para clubes de striptease como “despesas da empresa”. Também pesou para a imagem do banco a aparente incapacidade de identificar os negócios suspeitos.
O Raiffeisen se apresenta como “o terceiro maior grupo bancário da Suíça”, mas é pouco conhecido fora do país alpino. Isso porque é, na verdade, um conglomerado que une mais de 200 bancos locais que fazem empréstimos e outros serviços às suas comunidades.
Por isso, é improvável que o julgamento de seu ex-CEO tenha a mesma ressonância global que os últimos escândalos envolvendo o Credit Suisse ou os problemas de evasão fiscal do UBS. A Autoridade Supervisora do Mercado Financeiro Suíço (FINMA) reconhece a importância de Raiffeisen para a economia e rotulou oficialmente o banco como “grande demais para falir” – ou “sistemicamente importanteLink externo”. Essa posição vem acompanhada de maior supervisão regulatória e exigências de fundos de reserva extras para cobrir perdas.
Atualmente acusado, Vincenz ocupou o cargo de CEO do Raiffeisen entre 1999 e 2015. No período, buscou elevar o perfil do banco através de sua personalidade ousada e de uma série de negócios estratégicos. Extravagante, interessado nos holofotes da mídia e conhecido por apostas ousadas, Vincenz era o oposto da imagem conhecida de um banqueiro suíço discreto.
No cargo, ele supervisionou a compra de dois bancos privados com presença internacional, Notenstein e La Roche (que já foram vendidos pela Raiffeisen). Durante sua gestão, Vincenz também buscou integrar as filiais locais de Raiffeisen à velocidade do mundo digital, assumindo participações em empresas de tecnologia financeira. Junto com Stocker na posição de CEO, Vincenz presidiu a Aduno, empresa de pagamentos digitais que nasceu do banco Raiffeisen.
Falhas na supervisão
Mas a montanha-russa de crescimento e ambição chegou à sua queda brusca no início de 2018, quando Vincenz e Stocker foram acusados de fraude, peculato e suborno – crimes que eles negam ter cometido.
Eles são acusados de acumular secretamente participações de empresas que estavam prestes a ser adquiridas por Raiffeisen ou Aduno, lucrando quando as companhias subiam de valor após serem compradas pelo banco. A acusação também cita a tomada de “despesas não autorizadas” e o suposto suborno de co-conspiradores.
Os promotores exigem que os dois principais réus sejam presos por seis anos e devolvam os milhões de francos em ganhos ilícitos, caso fique comprovado que são culpados.
Sete outras pessoas também foram acusadas de crimes relacionados às supostas fraudes, como o recebimento de subornos.
A ex-mulher de Vincenz, que já atuou como diretora jurídica de Raiffeisen, foi condenada em novembro por violar as leis de sigilo bancário ao repassar documentos confidenciais ao ex-marido.
Raiffeisen já emergiu do caso sob uma luz ruim. Uma investigação da FINMA de 2018 encontrou uma “grave violação da lei de supervisão ”, que aponta que “o conselho de administração da Raiffeisen falhou em supervisionar adequadamente seu ex-CEO, permitindo-lhe, pelo menos potencialmente, gerar ganho financeiro pessoal às custas do banco”.
O presidente do conselho do grupo bancário, Johannes Rüegg-Stürm, foi forçado a renunciar, sendo seguido pelo sucessor de Vincenz como CEO, Patrik Gisel, que apesar de nunca ter sido implicado no escândalo, não conseguiu se livrar de seus vínculos com seu ex-chefe e considerou sua posição insustentável.
O julgamento, que começou em 25 de janeiro, foi transferido do tribunal normal para um grande prédio público em Zurique, que geralmente recebe shows.
Lista de escândalos
A Suíça não está acostumada a casos de fraude corporativa de alto perfil. O último evento comparável foi o julgamento de executivos da Swissair em 2007, que foram inocentados de negligência criminal depois que a companhia aérea faliu.
Se Vincenz e Stocker forem considerados culpados, seus problemas podem não acabar só com o cumprimento da sentença estipulada pelo promotor. Há ainda a chance deles serem processados por danos civis no valor de muitos milhões de francos.
Além disso, os promotores da Suíça e do Liechtenstein estão prontos para iniciar uma bateria de investigações de lavagem de dinheiro mirando a dupla e um advogado suíço que autorizou os pagamentos em seu nome. Uma condenação no julgamento de Zurique pode resultar em novas acusações se as transações forem comprovadamente fraudulentas.
Para o discreto setor bancário suíço, o fluxo constante de manchetes lúgubres é um pesadelo, somando-se a uma lista crescente de escândalos envolvendo o setor.
Em 2020, o CEO do Credit Suisse, Tidjane Thiam, foi forçado a renunciar depois que surgiu a notícia de que o banco havia contratado detetives para espionar ex-funcionários. O Credit Suisse também estava envolvido em um caso de peculato de alto perfil em Moçambique e sofreu enormes perdas nos projetos de investimento Greensill e Archegos em 2021.
Além disso, semanas atrás António Horta-Osório, ex-presidente do conselho, teve que renunciar ao cargo depois de desrespeitar as restrições do Covid-19 e usar um jato particular da empresa de maneira questionável.
O UBS também sofreu um revés de reputação em dezembro último, quando um tribunal de apelação de Paris confirmou a condenação criminal do banco por ajudar cidadãos franceses a evadir impostos por vários anos.
Adaptação: Clarissa Levy
(Edição: Fernando Hirschy)
Adaptação: Clarissa Levy
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