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Porque a Suíça continua sem aeronaves para missões de resgate

Essa não foi a primeira vez que a necessidade de uma aeronave multiuso foi levantada. Uk Mod © Crown Copyright 2023

A Suíça é considerada uma nação bem organizada e capaz. No entanto, os últimos episódios da crise humanitária no Sudão mostraram que o país alpino, ainda que queira agir no exterior, depende profundamente  de seus aliados europeus para evacuar seus cidadãos. O analista de política federal, Balz Rigendinger, reflete por que a Suíça não possui um avião de carga militar.

Em teoria, a Suíça está altamente preparada para responder a uma crise no exterior. O país mantém tropas de elite especializadas, possui forças de resgate altamente qualificadas e um completo centro de gerenciamento de crises. Mas equipes e materiais precisam ser transportados para áreas de crise. É neste ponto que os programas de emergência do país alpino ficam defasados.

A Suíça não possui uma aeronave de transporte multifuncional. Esta decisão foi uma escolha deliberada, determinada a partir de votações em que partidos de ambos os lados do espectro político se opuseram à aquisição de uma aeronave do tipo – com a votação mais recente sobre a matéria tendo ocorrido em março de 2022.

A falta desta aeronave reflete a dicotomia da imagem suíça nos assuntos internacionais. Por um lado, está internacionalmente conectada e envolvida em uma ampla gama de atividades humanitárias. Por outro lado, é um país que prefere operar de forma autônoma e cuidar de si mesmo. Mas, frequentemente, a Suíça se depara com uma realidade: a capacidade de suas ações é limitada devido ao seu tamanho.

Parceiros bem equipados

Responder a grandes crises, no entanto, não é algo que pode ser feito de maneira isolada. Operações como a recente na capital do Sudão, Cartum, durante a qual os países lutaram para evacuar seus cidadãos, são sempre realizadas em estreita cooperação internacional. No caso do Sudão, a operação de resgate europeia foi coordenada pela UE.

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an aerial map of the capital Khartoum, with the swiss embassy circled in yellow

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Evacuações em áreas de crise: o que você precisa saber

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A Suíça faz parte do sistema europeu de gerenciamento de crises, que mobiliza recursos conjuntos da UE em caso de crises, e está construindo parcerias com operações conjuntas na prevenção e treinamento de emergências. “Os contatos estão aí. Quanto melhores os contatos, melhor ocorre o gerenciamento da crise real”, disse à rádio pública suíça RTS o embaixador Serge Bavaud, que chefia o Centro de Gerenciamento de Crise do Ministério das Relações Exteriores.

Até agora, são esses contatos que permitiram à Suíça se beneficiar das capacidades de voo de seus parceiros europeus. Após a evacuação dos funcionários da embaixada suíça de Cartum, o embaixador da Suíça no Sudão, Christian Winter, falou à imprensa no aeroporto de Berna-Belp, e disse estar ciente de que teria que solicitar ajuda externa: “sempre foi claro: não podemos lidar com isso sozinhos. Teríamos que nos envolver em outra operação de evacuação”.

Aliança antiaérea

Esta não é a primeira vez que a necessidade de uma aeronave polivalente é levantada. Mais recentemente, a questão reapareceu em março de 2022. No entanto, propostas anteriores feitas no parlamento para aquisição de uma aeronave foram impedidas por uma aliança de partidos de esquerda e direita.

Os partidos de direita estão abertos à possibilidade de comprar armamento, mas se opõem estritamente a ideia de que o exército suíço se torne ativo em outros países. A esquerda, por outro lado, aceitaria de bom grado iniciativas relacionadas à ajuda e assistência humanitária, mas é fundamentalmente crítica ao armamento.

‘Traição aos suíços no exterior’

Após a operação de evacuação no Sudão, a questão foi levada de volta à mesa. O analista de segurança suíço Oliver Hegglin, um oficial do exército que trabalha em operações de construção da paz, faz lobby para a aquisição de tal aeronave há anos. Em um texto publicado em 2021, ele classifica a falta de aeronaves militares na Suíça como “uma mancha na tradição humanitária do país e uma traição aos cidadãos suíços no exterior que ficarão à mercê de outros Estados em momentos de necessidade”.

A Romanian disaster relief team flies to the earthquake zone in Turkey in February 2023.
Uma equipe romena de socorro pronta para voar para ajudar a Turquia após o terremoto de fevereiro de 2023. Keystone / Robert Ghement

Custos de longo prazo

A despesa de longo prazo de tal aeronave é a principal razão pela qual o governo suíço não vê a aquisição como uma prioridade. Após a compra de uma aeronave do tipo, a próxima questão a ser abordada é a de sua utilização: quando ela seria usada e seu uso justificaria o custo? O Estado, portanto, prefere contar com a possibilidade de fretar aeronaves civis de um parceiro europeu conforme a necessidade.

Chartered civilian aircraft: Swiss earthquake relief supplies are loaded onto Haiti in 2010.
Suprimentos suíços de ajuda humanitária para o terremoto são carregados em um avião civil fretado para serem enviados ao Haiti em 2010. Keystone/ennio Leanza

Mas não é apenas a evacuação de emergência do Sudão que mais uma vez destacou a necessidade de uma aeronave polivalente. A discussão está decolando novamente devido a várias conjunturas geopolíticas no exterior. A guerra contra a Ucrânia é um exemplo que colocou a neutralidade da Suíça e suas decisões diplomáticas sob um microscópio.

Contribuição suíça

A capacidade suíça de contribuir com o transporte de aeronaves pode ser uma maneira do Estado corrigir sua imagem desgastada de beneficiário ocioso da OTAN.

Esta seria uma contribuição compatível com a neutralidade da Suíça para a aliança ocidental. E também seria uma resposta à questão iminente da utilização. Esta solução pode fornecer um ponto de compromisso para os partidos políticos de esquerda.

Quanto à direita: “Estou aberto à ideia”, disse Mauro Tuena, do conservador Partido Popular Suíço (SVP) e presidente do Comitê de Política de Segurança da Câmara dos Deputados. Mas emendou, ao SWI swissinfo.ch, “não a qualquer preço”.

Necessidades do ministério das relações exteriores

Franz Grüter, também membro do SVP, preside o Comitê de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados. Grüter vê uma oportunidade para o equipamento militar ser utilizado em várias funções, como em casos de incêndios florestais, entrega de ajuda humanitária, operações de resgate, terremotos ou evacuações de áreas de crise.

Deployment of a firefighting aircraft in California, 2020.
Uma aeronave de combate a incêndios na Califórnia, 2020. Keystone / Etienne Laurent

Grüter diz que está “espantado que o Ministério das Relações Exteriores nunca tenha abordado o parlamento com essa necessidade”. Com esta mensagem, ele vê uma chance de fazer um pedido formal ao parlamento.

Após a evacuação de seus cidadãos no Sudão, o ministro das Relações Exteriores Ignazio disse ao SWI swissinfo.ch que “é indiscutível que as capacidades de transporte da força aérea são insuficientes considerando as várias crises que ocorrem ao nosso redor”.

Franz Grüter, Swiss People’s Party.
Franz Grüter, Partido Popular Suíço. Keystone / Peter Schneider

Falta de experiência

Mas será que um avião de transporte seria a solução para evacuações de crise, como a que ocorreu no Sudão? Apenas parcialmente, dizem os especialistas. A logística dessas operações é complexa. Estados como a França e os EUA primeiro tiveram que negociar o uso da base aérea de Wadi Seidna. Alexandre Vautravers, editor-chefe da Revue Militaire Suisse, disse à rádio pública suíça RTS: “Devemos ser realistas. A Suíça não tem nem os acordos nem a experiência para a condução de uma operação do tipo”.

Militares de elite em um avião VIP

O Comando Suíço das Forças Especiais AAD10 certamente se beneficiaria com uma aeronave adquirida para essas situações. Há muitas indicações de que a unidade especial simplesmente não conseguiu chegar à Cartum.

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O embaixador suíço no Sudão, Christian Winter (à esquerda), é recebido pelo ministro das Relações Exteriores, Ignazio Cassis, no aeroporto de Berna-Belp, após ser evacuado de Cartum. © Keystone / Peter Schneider

A unidade especial enviada pelo Conselho Federal ao Sudão em 22 de abril voou com o jato do governo suíço, um Falcon 900 fornecido como avião VIP. Embora seja a maior aeronave da Força Aérea Suíça, tem espaço para apenas 14 pessoas. Os soldados suíços chegaram até Djibuti.

Não havia meios de transporte para completar a viagem ao Sudão? O SWI swissinfo.ch não recebeu uma resposta clara a esta pergunta. O porta-voz consultado declarou que não poderia fornecer uma resposta mais completa por “razões de segurança”.

Adaptação: Clarissa Levy

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