Previdência é tema de plebiscitos há 70 anos
Em 25 de setembro, o povo suíço será chamado às urnas para se manifestar sobre mais uma revisão do seguro de velhice e sobrevivência (AHV-AVS). A previdência social tem sido objeto de votações populares desde a sua criação em 1948, pois mobiliza questões fundamentais como solidariedade, igualdade de gênero, precariedade e o financiamento de todo o sistema..
Em 25 de setembro, a população suíça votará uma nova reforma do seguro de velhice e de sobrevivênciaLink externo (AHV, na sigla em alemão; AVS, em francês e italiano). O que está em jogo é um aumento da idade de aposentadoria para mulheres de 64 para 65 anos, a mesma dos homens. Essa será a 24ª votação federalLink externo relacionada ao seguro desde que ele entrou em vigor há mais de 70 anos.
Histórico das votações sobre o AHV-AVS desde a sua criação em 1948
1952: proposta do governo de reduzir os impostos sobre a indústria do tabaco para beneficiar o AHV-AVS, aceita por 68% dos votos.
1972: o governo e o Parlamento propõem o princípio dos três pilares (AHV-AVS, previdência profissional, previdência privada), que é aceito pela população com 74% dos votos e incorporado na Constituição.
1972: a iniciativa do Partido Suíço do Trabalho “Por uma verdadeira pensão popular”, que propunha estender e fortalecer o seguro de velhice, é rejeitada por 78% dos votos.
1978: a 9ª revisão do AHV-AVS, que prevê o ajuste automático das pensões de acordo com a evolução dos salários e dos preços, é aceita com 65% dos votos.
1978: a iniciativa das Organizações Progressistas da Suíça (esquerda estudantil) para diminuir a idade da aposentadoria para 60 anos para os homens e 58 anos para as mulheres é rejeitada por 79% dos votos.
1988: a nova iniciativa das Organizações Progressistas da Suíça de baixar a idade de aposentadoria para 62 anos para os homens e 60 anos para as mulheres é rejeitada por 64% dos votos.
1995: a 10ª revisão do AHV-AVS, que prevê um aumento da idade de aposentadoria das mulheres de 62 para 64 anos e a possibilidade de se aposentar antecipadamente, é aprovada com 60% dos votos.
1995: a iniciativa proposta pela União Sindical Suíça para fortalecer o AHV-AVS e fixar a idade de aposentadoria em 62 anos para todos é rejeitada por 72% dos votos.
1998: a iniciativa da União Sindical Suíça que pedia a anulação do aumento da idade de aposentadoria das mulheres para 64 anos, previsto na 10ª revisão do AHV-AVS, é rejeitada por 58% dos votos.
2000: a iniciativa lançada pela Associação Suíça dos Empregados Comerciais contra o aumento da idade de aposentadoria das mulheres é rejeitada por 60% dos votos.
2000: a iniciativa lançada pelo Partido Verde a favor da aposentadoria flexível para todas e todos a partir dos 62 anos é rejeitada por 54% dos votos.
2001: a iniciativa do Partido Verde suíço para financiar o AHV-AVS e outras seguridades sociais através da cobrança de um imposto sobre fontes de energia não renováveis e sobre a energia hidrelétrica é rejeitada por 77% dos votos.
2002: a iniciativa do Partido do Povo Suíço (UDC/SVP, direita conservadora) para transferir as reservas de ouro excedentes do Banco Nacional Suíço para o fundo do AHV-AVS é rejeitada por 51% dos votos.
2002: a contraproposta à iniciativa sobre o ouro do UDC/SVP também é rejeitada pela maioria dos cantões.
2004: a 11ª revisão do AHV-AVS, que visa aumentar a idade de aposentadoria das mulheres para 65 anos, é rejeitada por 67% dos votos.
2004: um aumento do imposto sobre o valor agregado (IVA) para beneficiar o AHV-AVS é rejeitado por 68% dos votos.
2006: a iniciativa da esquerda para transferir os lucros do Banco Nacional Suíço para o AHV-AVS é rejeitada por 58% dos votos
2008: a iniciativa lançada pela União Sindical Suíça para introduzir uma aposentadoria opcional para todos e todas a partir da idade de 62 anos é rejeitada por 58% dos votos.
2015: a iniciativa da esquerda que visava introduzir um novo imposto sobre heranças para financiar o AHV-AVS é rejeitada por 71% dos votos.
2016: a iniciativa da União Sindical Suíça para aumentar as pensões do AHV-AVS é rejeitada por 59% dos votos.
2017: o projeto “Previdência 2020”, que previa a reforma tanto do AHV-AVS quanto do segundo pilar (previdência profissional) com um aumento da idade de aposentadoria das mulheres para 65 anos, é rejeitado por 52% dos votos.
2017: um aumento do IVA para beneficiar o AHV-AVS é rejeitado pela maioria dos cantões.
2019: a reforma tributária das empresas (RFFA), que também prevê um aumento das contribuições ao AHV-AVS e uma maior participação da Confederação, é aceita por 66% dos votos.
Durante a II Guerra Mundial, o governo usou seus poderes extraordinários para desenvolver as seguridades sociais. Ele introduziu particularmente subsídios por perda de salário e renda para os militares. A organização e o financiamento desses benefícios serviram de modelo para o novo projeto de seguro de velhice, que foi aprovado pelo povo suíço com 80% dos votos em 1947.
A primeira lei sobre o AHV-AVS já previa um sistema de financiamento por repartição: as contribuições, pagas igualmente por empregadores e empregados, são alocadas diretamente aos pensionistas. Os trabalhadores ativos, portanto, financiam os aposentados. Trata-se de uma previdência solidária, em que as pessoas com altos rendimentos pagam contribuições elevadas e recebem pensões limitadas.
A idade de aposentadoria era de 65 anos para todos e todas. No entanto, a pensão de um casal era fornecida a partir do momento em que o homem fazia 65 anos e sua esposa 60. Com as diversas reformas do AHV-AVS, que visaram principalmente ajustar as pensões e contribuições aos níveis dos salários e ao custo de vida, a idade de aposentadoria das mulheres foi gradualmente reduzida: passou a ser 63 anos em 1957 e 62 anos em 1964. Foram decisões tomadas por homens, pois as mulheres só ganharam o direito de votar e serem eleitas em 1971.
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A longa luta pelo sufrágio feminino
Aposentadorias muito baixas
Nos anos 60, as autoridades estavam preocupadas com a precariedade da vida dos idosos: o AHV-AVS não estava cumprindo seu dever constitucional de cobrir as necessidades básicas e uma grande proporção dos pensionistas vivia abaixo da linha da pobreza. Em 1966, o Parlamento decidiu introduzir benefícios complementares para amparar os pensionistas mais pobres. Na época, essa solução foi considerada temporária, válida até que o AHV-AVS se desenvolvesse e a previdência profissional pudesse proporcionar um padrão mínimo de vida para todos. Mas esse objetivo nunca foi alcançado e os benefícios complementares agora fazem parte do sistema de seguridade social.
O ano de 1972 marcou uma importante mudança no sistema previdenciário suíço: o princípio dos três pilares foi aceito em votação popular e incorporado na Constituição. O AHV-AVS ainda deveria proporcionar um padrão mínimo de vida, mas foi complementado por previdências profissionais, obrigatórias para todos os assalariados, e por previdências privadas opcionais. O Partido Suíço do Trabalho e a ala mais à esquerda do Partido Socialista, por sua vez, queriam fortalecer e expandir o AHV-AVS, mas o povo não se convenceu: rejeitou sua iniciativa “Por uma verdadeira pensão popular” e preferiu a contraproposta do governo, que deu mais peso à previdência privada.
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O desafio da aposentadoria no futuro
Era da discórdia
Em 1978, a rejeição de uma iniciativa da esquerda estudantil que visava reduzir a idade da aposentadoria começou uma longa batalha nas urnas sobre a idade de referência para ter direito aos benefícios do seguro de velhice. Os estudantes voltaram à luta com uma proposta semelhante em 1988, que também foi rejeitada pelo povo.
Em 1995, a 10ª revisão do AHV-AVS foi aprovada por 60% dos eleitores. Ela previa um aumento da idade de aposentadoria das mulheres de 62 para 64 anos e introduzia a possibilidade de se aposentar antecipadamente. No mesmo dia, o eleitorado rejeitou a iniciativa da União Sindical Suíça que pretendia fixar a idade de referência em 62 anos para todos e todas. Três anos depois, os sindicatos voltaram a pedir a anulação do aumento da idade de aposentadoria das mulheres previsto na 10ª revisão. A proposta foi rejeitada por 58% dos votos.
Mas quando as autoridades tentaram mais uma vez aumentar a idade de aposentadoria das mulheres de 64 para 65 anos, o povo não apoiou a proposta. A 11ª revisão do AHV-AVS foi rejeitada por 64% dos votos em 2004. Na esteira desses acontecimentos, a União Sindical Suíça relançou uma iniciativa por uma idade de aposentadoria de 62 anos para toda a população. Ela foi derrotada novamente nas urnas em 2008.
O governo e o Parlamento reintroduziram o conceito de aposentadoria aos 65 anos para todos e todas em sua reforma “Previdência 2020”, que dizia respeito tanto ao AHV-AVS quanto aos regimes de previdência profissional. Em 2017, 52% do eleitorado rejeitou o projeto. As revisões do primeiro e segundo pilares foram então separadas, e é mais uma reforma do seguro de velhice que será apresentada ao povo em 25 de setembro. Mais uma vez, as autoridades tentam aumentar a idade de aposentadoria das mulheres de 64 para 65 anos.
Encontrando o dinheiro
Essa insistência do governo e da maioria da direita do Parlamento em tentar aumentar a idade de aposentadoria das mulheres se deve aos problemas financeiros do AHV-AVS: com o envelhecimento da população, não há mais trabalhadores suficientes para pagar as pensões dos aposentados. De acordo com projeções federais, o sistema de seguro de velhice estará em déficit a partir de 2029. As autoridades devem, portanto, encontrar rapidamente uma maneira de reabastecer os fundos para que o AHV-AVS possa continuar desempenhando seu papel. A votação de 25 de setembro será acompanhada por um pedido de aumento do imposto sobre o valor agregado (IVA) a fim de alocar este montante ao fundo do AHV-AVS.
A gestão financeira do seguro de velhice tem sido há muito tempo objeto de uma intensa batalha política: uma infinidade de iniciativas para ampliar as fontes de financiamento foram apresentadas nos últimos 20 anos. Todas foram rejeitadas pelo povo. O Partido Verde (esquerda) queria tributar a energia não renovável, enquanto o Partido do Povo Suíço (UDC/SVP, direita conservadora) queria utilizar as reservas de ouro excedentes do Banco Nacional Suíço. A esquerda também propôs introduzir um novo imposto sobre heranças.
Tendo em vista que as últimas revisões do AHV-AVS e todas as propostas alternativas de financiamento fracassaram nas urnas, as autoridades elaboraram uma solução a curto prazo para manter as contas do seguro de velhice positivas até 2031. Elas esperam convencer a população de que o aumento da idade de aposentadoria das mulheres de 64 para 65 anos e o aumento do IVA, ambos previstos no projeto “AVS21”, são um passo na direção certa.
Mas uma reforma profunda do funcionamento do AHV-AVS e de todo o sistema previdenciário é inevitável para garantir pensões decentes a longo prazo, afirmam a esquerda e os sindicatos, que lançaram um referendo contra o “AVS21”. Eles rejeitam uma solução de muito curto prazo que penaliza mulheres e pessoas de baixa renda e exigem uma revisão de todo o mecanismo dos três pilares, com a introdução de novas fontes de financiamento. O povo decidirá em 25 de setembro.
Adaptação: Clarice Dominguez
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