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A conexão suíça da “guerra do gás”

Briga do gás não afeta abastecimento suíço, garante a Swissgas. Reuters

A "guerra do gás" entre a Rússia e a Ucrânia, que deixou parte da Europa sem combustível e calefação em pleno inverno, tem ramificações na Suíça.

O país alpino não tem contrato direto com a Gazprom, mas serve de base para a gigante russa realizar negócios com a matéria-prima e desenvolver seus projetos estratégicos.

O gás natural é a terceira principal fonte de energia da Suíça (cobre 12% do consumo), depois do petróleo (57%) e da energia elétrica (23% – somando nuclear e hidrelétrica). Em 1973, quando ocorreu a crise do petróleo, a participação do gás na matriz energética helvética era de apenas 1,6%.

Apesar de importar todo o gás consumido, inclusive uma parte da Rússia, o país não tem contratos diretos com a Gazprom, garante Ruedi Rohrbach, da Swissgas, empresa responsável por três quartos das importações.

A maior parte do abastecimento é garantida por acordos de longo prazo com países da União Europeia, como Alemanha, Holanda, França e Itália. Segundo a Secretaria Federal de Energia, estes países cobrem sua demanda com fornecedores da Rússia, Noruega e Argélia.

Rohrbach nega que a Suíça sentirá as consequências de sua dependência externa no setor, caso os países fornecedores resolvam priorizar o mercado interno em detrimento das exportações.

“Não há riscos. Não só para nós, como também não para clientes de outros países, que têm contratos de longo prazo com esses fornecedores. Trata-se de grandes e renomadas empresas da Europa Ocidental, que atuam em todo o continente e até mundialmente”, disse Rohrbach à swissinfo.

“Estas corporações não têm prioridades contratuais ou de outro tipo quanto ao abastecimento. Todos os clientes recebem o mesmo tratamento, não importa o país em que estejam localizados. Isso nos foi confirmado explicitamente.” Talvez a Suíça esteja mesmo em uma posição privilegiada.

Conexão suíça da Gazprom



A briga entre Moscou e Kiev sobre dívidas e preços do gás interrompeu, no início do ano, parte do fornecimento da Rússia à União Europeia, que importa um quarto do total de gás russo – 80% através dos gasodutos da Ucrânia. Pelo menos 15 países foram afetados.

Durante o conflito, tornou-se público que a Gazprom vende grande parte de seu gás a partir da Suíça, através de sua subsidiária Rosukrenergo, sediada no paraíso fiscal de Zug (centro da Suíça). Através dessa intermediária, a Gazprom administra o fornecimento à Ucrânia e à Europa – um negócio bilionário, atingido pela nova briga. Em 2008, ela vendeu o gás centroasiático por 179,5 dólares por 1000 m3 na fronteira russo-ucraniana.

Rosukrenergo não é a única subsidiária da Gazprom na Suíça. “Negociantes de matérias-primas amam a Suíça. A Gazprom também”, escreve o jornal econômico suíço Cash. Segundo o diário, em Zurique está sediada também a ZMB, que em 2008 conseguiu duplicar o lucro, atingindo a marca de 250 milhões de francos.

“A Suíça é atraente porque não pertence à UE ou a outro bloco, portanto tem uma posição neutra”, explica Ivo Bechtiger, presidente do conselho fiscal da ZMB. O consultor financeiro zuriquense é um homem de frente da Gazprom: ele preside também os projetos do gasoduto South Stream (no Mar Báltico) e de exploração da jazida de gás de Shtokman, a maior no mar de Barents – ambos com sede em Zug.

Lars Haussmann, da Rosukrenergo, também é consultor em Zurique e representante outras firmas russas sediadas em Zug. Mesmo que algumas dessas firmas tenham apenas um endereço suíço, elas não vêm só por causa das vantagens fiscais.

“South Stream e Shtokman são sociedades que durante anos não terão lucros. Elas podem amortizar seus investimentos e, portanto, o motivo não é a economia de impostos”, disse Bechtiger ao Casch. Mas, quando tiveram lucro, a sede na Suíça se tornará ainda mais útil.

Triângulo do gás



Segundo o jornal alemão Welt Online, além de interesses de política externa, também há muito dinheiro e alguns poucos beneficiários em jogo na “guerra do gás” entre Moscou e Kiev, que deixou parte da Europa tremendo de frio.

“Um acordo entre a Gazprom e Kiev no final do ano passado seria um golpe contra a intermediária Rosukrenergo, que pertence metade à Gazprom e metade a empresários ucranianos. Ela entrou no negócio após a primeira briga do gás em 2006 e se estabeleceu como intermediária no triângulo do gás Rússia-Ásia Central-Ucrânia. Nos últimos dias, não se fala mais em excluí-la do negócio. Especula-se que o fracasso das negociações russo-ucranianas no réveillon pode ter sido do interesse dessa firma”, escreve o jornal alemão.

Na última terça-feira, a Rosukrenergo pediu ao governo suíço que interviesse “na medida de suas possibilidades” para garantir a passagem do gás da empresa através da Ucrânia rumo à Europa. Berna não se pronunciou sobre o pedido.

Nesta sexta-feira (9/1), o primeiro-ministro russo, Vladimir Putin, sinalizou que quer tirar a Rosukrenergo do jogo. Ele disse que a Gazprom estaria disposta a assinar um contrato diretamente com a Naftogas ucraniana. O governo da Ucrânia também já tentou, sem sucesso, se livrar da Rosukrenergo.

swissinfo, Geraldo Hoffmann (com agências)

Moscou começou a reduzir a abastecimento de gás à Ucrânia em 1° janeiro, devido a um impasse comercial.

Na quarta-feira, o fornecimento para pelo menos 15 países europeus foi completamento interrompido – os mais atingidos foram os países do Leste europeu.

Desta vez, porém, muitos países tinham mais reservas do que no começo de 2006, quando uma briga semelhante entre a Rússia e a Ucrânia reduziu em 40% o fornecimento de gás à Europa.

Na quinta (8/1), depois de intensas negociações, União Europeia e Rússia chegaram a um acordo. Monitores enviados pelo bloco assumiriam ainda nesta sexta-feira o controle do fluxo de gás nos dutos ucranianos. Com a presença dos observadores, Moscou promete liberar o abastecimento para a Europa, mas ainda pode demorar alguns dias até o abastecimento se normalizar.

O gás natural na Suíça é importado por quatro empresas regionais controladas pela Swissgas.

Cerca de cem empresas, a maioria públicas, fazem a distribuição aos usuários finais, através de uma rede de canalização de 16 mil km.

Aproximadamente 1.700 pessoas trabalham na indústria do gás, que tem um faturamento anual de 1,7 bilhão de francos.

Em 2007, a Suíça consumiu 34 milhões de kilowatt/hora de gás natural.

O país tem pequenas reservas próprias dessa fonte de energia. Entre 1985 e 1994, foram explorados 73 milhões de metros cúbicos de gás natural em Finsterwald (estado de Lucerna, centro), o que corresponde a 3% do consumo anual da Suíça. Há vários projetos de prospecção em planejamento.

swissinfo.ch

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