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Cursos intensivos de programação em alta na Suíça

Estudantes trabalhando com computadores
A Propulsion Academy, com sede em Zurique, é a primeira escola de programação no estilo "boot-camp" na Suíça. swissinfo.ch

Elas são chamadas "coding academies" e estão proliferando na Suíça. Trata-se de cursos intensivos de programação de computadores organizados por firmas privadas que preparam participantes das mais variadas formações para a inserção rápida no mercado de trabalho. De refugiados àqueles que querem reorientar suas carreiras, todos buscam aqui o caminho das pedras para o mercado de trabalho suíço.

O americano Jeremy Savor queria aprender a programar e encontrar uma forma de viver na Suíça com sua namorada suíça. O engenheiro mecânico já tinha ouvido falar de cursos intensivos de iniciação (boot camps) à programação nos EUA. Os primeiros cursos surgiram no Vale do Silicone californiano há vários anos, e visavam treinar funcionários do Facebook.

Um dia, Savor viu um anúncio da Propulsion Academy, o primeiro boot camp da Suíça. Ele passou por duas rodadas de entrevistas e, ao ser admitido para o programa de três meses, marcou seu voo para a Suíça.

Atualmente ele vai diariamente para uma sala em complexo de escritórios de Zurique, e passa pelo menos oito horas ouvindo um instrutor e praticando a programação em diversas línguas; do JavaScript ao CSS e HTML5. Seus colegas de classe vivem todos em Zurique, mas isso não é seu único fator em comum: alguns têm diplomas universitários de pós-graduação, outros estão no meio de uma mudança de carreira, enquanto outros ainda estão tentando encontrar seu lugar no mercado de trabalho suíço.

Estudantes em uma sala com computadores
Os estudantes trabalham o dia inteiro, por vários meses, com o objetivo de poder fazer um estágio no final do curso. swissinfo.ch

Laurent Meyer, um dos fundadores da Propulsion Academy, ressalta a intensidade do treinamento e o quão é importante para os alunos a possibilidade de se concentrar sem interrupção. Aprender essas línguas de programação bem o suficiente para poder, em três meses, trabalhar nesse setor não é para qualquer um.

Propulsion Academy

Fundada em 2017, a start-up baseada em Zurique oferece módulos sobre todos os estágios de desenvolvimento de aplicativos para a web, além de ciência da informação em um programa intensivo de três meses.

A taxa de ensino para o programa de três meses é de CHF9.000 (US$ 9.070). A Propulsion Academy procura oferecer descontos e bolsas de estudos sempre que possível. Candidatos não necessitam ter experiência prévia de programação ou tecnologia da informação para serem aceitos no programa. Eles são admitidos com base na candidatura e em duas rodadas de entrevistas para a avaliação da motivação e da capacidade para resolver problemas.

E também por isso, ser aceito no programa de treinamento não é para qualquer um. Como o americano Savor, os candidatos devem passar por várias rodadas de entrevistas para garantir que têm o perfil adequado. Uma entrevista pessoal garante que eles estão motivados, enquanto a entrevista técnica permite aos potenciais alunos demonstrar sua capacidade de pensar criticamente, de aprender novos conceitos e de aplica-los na prática. Os 12 estudantes sentados na sala de aula hoje foram escolhidos entre um conjunto de 40 candidatos. Meyer nota que ter poucos alunos em uma classe é importante para garantir a qualidade do ensino, e para tanto, cada aluno também deve der o perfil adequado.

Integração no mercado de trabalho

Do outro lado da cidade, em uma garagem reformada, outro grupo de estudantes se debruça sobre seus computadores e faz exercícios de programação. Eles também vieram para a Suíça de outros países, mas em outras circunstâncias: como refugiados.

Docente e aluno frente ao computador
O docente Matthias Hüni ajuda uma estudante a resolver um problema. swissinfo.ch

Ranny Khaddoura veio para a Suíça da Síria quatro anos atrás. Ele passou a maior parte desses anos frustrado por não poder usar suas qualificações e experiência administrando pessoal em uma firma de engenharia de redes em Damasco. Isso se deu por ele não ter a permissão de trabalhar até receber a aprovação de seu pedido de asilo. Ele soube da oferta da firma Powercoders, uma “coding academy” especialmente dedicada a refugiados, e decidiu se candidatar. Ele espera conseguir um estágio que, acredita, lhe abrirá as portas do mercado de trabalho.

Assim como Khaddoura, a maioria dos refugiados da Powercoders sabe agora que poderão permanecer na Suíça, pelo menos no curto prazo. Isso é importante, diz o instrutor Matthias Hüni, porque a ideia é que eles possam fazer estágios depois dos três meses de curso e, com sorte, consigam depois um emprego, ou continuem com estudos de aprofundamento. 

“O objetivo de longo prazo desse projeto é a integração no mercado de trabalho suíço,” diz ele. “Nós pedimos a empresas que abram as atuais ofertas de estágios para a Powercoders, ou perguntamos se eles estariam dispostos a criar ofertas específicas para um estagiário da Powercoders.”

A maioria das firmas está aberta para essa ideia, ele continua, embora pequenas companhias tendam a ser as mais ágeis e aptas a reagir com presteza. Ao fim do primeiro curso da Powercoders em Berna, no início desse ano, todos os graduandos encontraram um estágio ou continuaram seus estudos em uma universidade ou instituto de ciências aplicadas.

Hüni diz que o fundador da Powercoders considerou quais campos de trabalho seriam ideais para o treinamento de refugiados antes do lançamento do programa. Ele aponta que empregos no comércio ou similares são difíceis, dada a necessidade de fluência na língua, ainda mais quando se leva em consideração o desafio de se falar o dialeto Suíço.

Pessoas trabalhando com o computador
Lazarus Bohale (centro) está no meio de uma mudança de carreira dentro da indústria de tecnologia. swissinfo.ch

É óbvio que você tem que encontrar algo que não dependa da língua, e a programação é um dessas atividades.”

“E onde você pode ter o maior impacto? Na indústria de tecnologia de informação (TI).”

Setores de alta demanda

Na Propulsion Academy, muitos estudantes têm objetivos similares aos de seus colegas refugiados: encontrar um estágio e trabalhar em uma indústria em expansão.

Um estudo recente sobre a situação do mercado de trabalho nos setores de tecnologia da informação e das comunicações, inclusive programadores e desenvolvedores de software, indicou que a demanda por trabalhadores na Suíça continua a ultrapassar as previsões. A pesquisa do Instituto de Basiléia para Pesquisa Econômica (IWSB) mostra que o setor continua com crescimento acima da média e conclui que “com base nos cenários educacionais de hoje, não é possível cobrir a alta demanda por trabalhadores qualificados” na Suíça.

Lazarus Bohale perdeu seu emprego de engenharia de software para mainframes quando muitas das posições nessa área foram relocadas para países com mão de obra barata. Ele aproveitou a oportunidade para mudar a direção de sua carreira e se concentrar no desenvolvimento de aplicações de usuário para a web por acreditar na forte demanda nesse segmento.

“Aquela área não tinha futuro,” diz ele sobre seu antigo emprego. “A tecnologia da Web hoje é vital, e permanecerá assim no futuro; por que então não reorientar minha carreira?”

Substituindo universidades?

Bohale pensou em voltar à universidade para redirecionar sua carreira, mas ao final das contas viu na Propulsion Academy um caminho mais direto para atingir esse objetivo.

Três homens trabalhando com o computador
Mohammed Khairi (esq.) e Ranny Kaddoura (dir.) discutem sobre um problema de informática. swissinfo.ch

“As pessoas que vão para a universidade e fazem um diploma de bacharel ainda têm que sair depois à procura de estágios e projetos,” diz ele. “Aqui nós aprendemos e fazemos ao mesmo tempo”. Mas Meyer e o co-fundador da Propulsion Academy, Bogdan Vasile, afirmam que seu programa visa complementar os estudos universitários, e não substituí-los.

Vários alunos atuais e já formados vieram para a Propulsion Academy depois de terminar seus estudos universitários. Um exemplo é um antigo aluno que terminou um MBA na Universidade de St. Gallen, mas precisava adquirir experiência de programação para poder liderar e compreender sua equipe em uma firma de software. “Se você é um recém-graduado com um mestrado ou doutorado, essa poderia ser uma chance para adquirir experiência prática no seu campo,” diz Vasile.

Na Powercoders, o estudante Mohammed Khairi sonha em entrar para o Instituto Federal de Tecnologia (ETH) de Zurique, onde ele recentemente concluiu um assim-chamado “semestre de descoberta.” Assim que seu nível de alemão for satisfatório, ele planeja se candidatar formalmente e continuar os estudos que interrompeu ao deixar o Iraque. Até lá, diz ele, a Powercoders é uma forma de ampliar sua capacitação e adquirir experiência de trabalho.

Khaddoura também pensou brevemente em estudar na universidade para expandir suas oportunidades de trabalho, mas essa possibilidade foi por água abaixo, diz ele, quando os eleitores do cantão de Zurique decidiram em setembro que portadores do visto “F” como ele não seriam mais elegíveis para dinheiro do sistema de auxilio social. “Tenho de  encontrar um emprego tão logo quanto possível,” diz ele. “É uma questão financeira.”

O caminho à frente

Dinheiro também é um fator sempre em mente para a Powercoders. Eles são inteiramente dependentes de doações para sua operação, uma vez que não cobram taxas de ensino dos estudantes e custeiam as refeições e lanches gratuitos dos alunos durante as aulas. Se os doadores estiverem à altura, eles esperam levar o programa para mais cidades suíças nos próximos anos.
 
Meyer e Vasile estão em uma posição similar, e seu projeto se encontra ainda na fase inicial. Eles procuram investidores que vejam na Propulsion Academy um contribuinte essencial para a força de trabalho tecnológica suíça e para as start-ups como um todo.

Hoje à noite, os estudantes de ambas as “coding academies” vão voltar para casa exaustos, mas seus instrutores dizem que muitos vão continuar a trabalhar, moto próprio, noite adentro. No caso dos Powercoders, isso se deve também ao acesso à internet, um bem escasso em abrigos de refugiados. “Companhias dizem que se alguém está disposto a trabalhar duro, esse é um bom indicador de seu potencial,” diz Vasile.

Powercoders

A academia de programação para refugiados também está em sua segunda turma de alunos, depois de um projeto piloto conduzido em Berna. Os custos de todos os participantes são cobertos por doações a essa organização sem fins lucrativos. O programa intensivo de três meses atualmente em curso em Zurique vai ser seguido por um estágio de três a seis meses para os participantes. Estudantes recebem também orientações de mentores externos voluntários que os ajudam a melhor lidar com o dia-a-dia da vida na Suíça.

Dependendo da situação de seus fundos, a Powercoders espera poder expandir sua oferta para outras cidades suíças num futuro próximo.

Adaptação: Danilo von Sperling

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