“Descobriremos milhares de novas espécies”
Pouco se sabe sobre o plâncton, o conjunto dos organismos que têm pouco poder de locomoção e vivem livremente na coluna de água, apesar da sua importância ao o clima.
Decididos a fazer a ciência evoluir, um grupo de cientistas viaja a bordo do veleiro de exploração oceonográfica Tara desde setembro e por três anos. Entre eles, o biólogo suíço Colomban de Vargas.
Entre 2006 e 2008, a escuna derivou durante mais de 500 dias, cercada pela banquisa ártica. Desta vez, ela vai navegar os oceanos do planeta, fiel à sua missão de pesquisa, sensibilização e educação.
Formado na Universidade de Genebra, mestre de pesquisa no Conselho Nacional de Pesquisa Científica (CNRS), na estação biológica de Roscoff (França) há três anos, Colomban Vargas é, aos 37 anos, uma das cabeças pensantes da expedição. A entrevista foi feita durante uma escala em Portugal.
swissinfo: Darwin navegou durante cinco anos no Beagle e coletou muitos dados que originaram a Evolução das Espécies. O senhor é uma versão de Darwin do século 21 à bordo do Beagle?
Colomban de Vargas: a gente espera (risos). Vamos dar duas voltas ao mundo e nosso modo de funcionamento é muito parecido com o que se fazia no século 19, embarcados num veleiro, com um mecenas que financia a expedição.
O que está em jogo nessa expedição de três anos?
Antes de mais nada, gostaríamos de compreender o ecossistema dos plancto. É o ecossistema que mais reage ao clima e o que mais influencia o clima.
Os organismos do plâncton produzem mais da metade do oxigênio. Mas, sobretudo, quando morrem e caem no fundo da água, eles geram um fluxo de carbono, uma verdadeira bomba a carbono, e portanto de gás carbônico, para o fundo do oceano. Trata-se, portanto, de um ecossistema muito importante para a composição do gás da atmosfera que nós respiramos.
Sabemos pelo estudo dos sedimentos que, quando o plâncto muda, a atmosfera também muda. Com métodos genéticos de ponta (sequência de marcador ADN, microscópio de alta velocidade), vamos conhecer esses organismos em suas versões atuais e a maneira como se organizam.
Vamos explorar 400 estações em pleno mar e coletar água a diferentes profundidades para tentar compreender a totalidade dos organismos vivos na água – de vírus a animais planctônicos (zooplancto). Vamos quem está lá e em que quantidades. O objetivo seria também construir modelos que permitam ver como os planctos variam nos diferentes estratos do oceano e como eles poderão mudar nesse mundo cada vez mais rico em CO2.
São numerosos os barcos de pesquisa oceanográfica. A expedição Tara-oceanos é realmente original?
Não se trata de uma expedição de aventura só pela aventura, nem para fazer filmes ou de comunicação. Mesmo se essa dimensão é importante. É uma expedição reunindo cientistas de primeiro plano.
Eric Karsenti, por exemplo, o pai da expedição, é um grande biólogo celular e um dos criadores da biologia sistêmica celular. Jean Weissenbach é diretor do Genoscope, maior centro de sequência de ADN na Europa.
Para mim, o mais original nessa missão é que vamos transpor para a oceanografia técnicas de sequência de ADN e de biologia celular e molecular desenvolvidas para as ciências biomédicas.
É preciso saber que na oceanografia estamos atrasados em biologia, simplesmente porque é um mundo de acesso difícil. Portanto é uma grande chance reunir pessoas competentes neste pequeno navio.
E qual é sua missão pessoal no navio?
Desde meu doutorado na Universidade de Genebra, trabalho sobre os foraminíferos, organismos planctônicos utilizados pelos cientistas para reconstruir climas passados, através de fósseis.
Esses protistas fazem pequenas conchas de calcário que encontramos nas camadas sedimentares. Eram conhecidos principalmente pelos geólogos, mas comecei a estudar a genética delas e a caracterizá-las geneticamente. No programa Tara, eu coordeno os estudos da biodiversidade do plâncton conduzidos por vários grupos de pesquisa, afim de dar sentido ao todo.
O que o senhor espera dessa expedição?
No plano científico, aposto que descobriremos milhões de espécies novas. Vamos colocá-las em evidência graças à assinatura genética. Será um enorme avanço no conhecimento de nossos irmãos organismos dos oceanos. É muito excitante.
Vamos encontrar sem dúvida nenhuma espécies muito importantes ecologicamente, algumas exploráveis como fontes energéticas ou utilizáveis pela biotecnologia.
Tara é a ocasião de fazer coisas um pouco loucas, audaciosas no plano científico, impossíveis de realizar através dos programas existentes. Em ciência, hoje é difícil de não justificar uma pesquisa por um hipótese muito construída, com um protocolo que vai permitir testar essa hipótese, com resultados quase garantidos. Precisamos praticamente terminar a pesquisa antes de financiá-la. Ou seja, é difícil partir para a aventura. Com Tara, partimos em um ambiente mal conhecido. Vamos seqüenciar em massa e veremos o que vamos encontrar.
Do ponto de vista pessoal, partir três anos é fácil?
Em Roscoff, dirijo uma equipe de dez pessoas, o que me obriga a ficar frequentemente na França. Na verdade, ficarei no Tara pequenos períodos de três semanas, três ou quatro vezes por ano. Com um núcleo de cientistas, vamos nos alternar no navio para garantir a continuidade em nossas pesquisas.
O pai da missão, Eric Karsenti, procurava colaboradores para montar um programa científico. Alguém lhe deu o meu nome e nos encontramos no Tara em julho de 2008. Eu aceitei imediatamente.
Na época, eu pensava em me estabelecer, mas acho que sou um suíço especial, que gosta de movimento. Meu avô suíço emigrou para a Espanha e viveu na China a maior parte da vida. Deve ser uma doença de família essa vontade de partir.
Pierre-François Besson, swissinfo.ch
Antigo navio de exploração de Jean-Louis Etienne e depois de Peter Blake, o dois mastros de alumínio Tara mede 36 m por 10 e pesa 120 toneladas.
Ele partiu da Bretanha (noroeste da França) no início de setembro e terminará a missão Tara-oceanos em novembro de 2012, depois de navegar 150 mil km e 60 escalas em 50 países.
Ele partiu do Atlântico e continua pelo Mediterrâneo, Mar Vermelho, Oceano Índico, Atlântico, Ártico e Pacífico.
A bordo está uma tripulação internacional composta de 14 pessoas, entre elas cinco cientistas que se revezarão a cada mês. No total, estão planejados 20 programas científicos.
As áreas de estudo são a biodiversidade, as relações entre o clima e os oceanos e as origens da vida e da evolução, através do estudo dos planctos e dos corais.
Aproximadamente 50 organizações e laboratórios de 15 países participam (França, Alemanha, Itália, Espanha, USA, Canadá, Austrália, GB, Japão, Quênia, etc). Entre outros, CNRS, o Graig Venter Institute e o MIT.
A expedição Tara-oceanos procura rsponder às seguintes questões: os ecossistemas oceânicos vão sobreviver ao aquecimento climático e à poluição dos oceanos?
Estamos a caminho da desertificação dos oceanos ou de uma transformação da vida oceânica?
Os protistas formam um grupo extremamente diversificado formado por seres vivos constituídos de uma só célula (unicelulares, por oposição às plantas e animais pluricelulares) com núcleo distinto (eucariotos, por oposição às bactérias ou procariotos, cuja célula não tem núcleo).
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