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Empresa suíça é investigada por suposta fraude de compensação de carbono

Kariba forest protection project in northern Zimbabwe.
Área de reflorestamento anteriormente usado como terra agrícola em Binga, Zimbábue, 10 de junho de 2023. O projeto de conservação florestal Kariba REDD+ no norte do Zimbábue é um dos maiores projetos de proteção climática do Polo Sul. Zinyange Auntony / Keystone

A empresa South Pole, líder mundial na venda de créditos de carbono certificados, foi forçada a suspender um projeto emblemático de proteção florestal no Zimbábue, em meio a acusações recentes de afirmações exageradas. Segundo relatos divulgados pela mídia, aproximadamente 20% dos funcionários da empresa suíça podem perder seus empregos.

As compensações de carbono permitem que empresas e indivíduos compensem as emissões de carbono que geram (por causa, por exemplo, de um voo de avião ou de um projeto de construção), pagando para retirar o carbono da atmosfera ar em outro lugar. As compensações voluntárias se tornaram um mercado global de bilhões de dólares.

Na última semana, a certificadora Verra, com sede em Washington, D.C., líder mundial na definição de padrões de carbono para o mercado de compensações, anunciou que havia iniciado uma investigação sobre o projeto de conservação florestal Kariba REDD+, no norte do Zimbábue, um dos maiores projetos de proteção climática da South Pole. REDD é a sigla para “redução de emissões por desmatamento e degradação florestal em países em desenvolvimento”.

Isso ocorreu depois de um relatório crítico, publicado em 16 de outubro pela revista New Yorker, intitulado “The Great Cash-for-Carbon Hustle” (O grande golpe do dinheiro pelo carbono), no qual se afirma que a South Pole vendeu milhões de créditos para reduções de carbono que não eram reais.

Em um comunicadoLink externo do dia 17 de outubro, a Verra revelou seu “profundo incômodo” com as acusações da revista, que “levantaram sérias questões sobre a empresa de compensação de carbono South Pole e o projeto Kariba no Zimbábue”. A organização de certificação sem fins lucrativos disse que havia iniciado uma investigação sobre o projeto e que “quaisquer outras emissões de crédito” permaneceriam suspensas até que a investigação seja concluída.

A South Pole, que negou veementemente que tenha vendido conscientemente certificados de CO2 sem valor, disse à rádio pública suíça SRF que daria total apoio à investigação da Verra e que o papel da empresa no projeto Kariba seria “revisado ativamente” à luz das revelações.

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O Kariba REDD+, iniciado em 2011, foi um dos primeiros projetos de proteção florestal em grande escala do mundo, planejado para conservar 785 mil hectares de florestas no norte do Zimbábue. O carro-chefe da South Pole tem sido um dos principais beneficiários dos créditos de carbono, já que grandes empresas financiam projetos que supostamente removem carbono da atmosfera, a fim de compensar suas próprias emissões. De acordo com a televisão pública suíça SRF, multinacionais como a Gucci, a Nestlé e a Volkswagen compensaram voluntariamente suas emissões investindo no projeto.

Críticas e dificuldades

O projeto Kariba levou a um crescimento espetacular da South Pole, mas o projeto Zimbábue e os esquemas de compensação de carbono em geral têm enfrentado críticas e dificuldades crescentes nos últimos meses.

EstudosLink externo publicados por diversas organizações em janeiroLink externo e março deste ano demonstram que a South Pole, em cooperação com a Verra, estava vinculada a créditos de proteção florestal que não proporcionaram a economia de carbono prometida.

A pesquisa de acompanhamento do projeto Kariba, realizada pela SRF, em colaboração com o semanário alemão Die Zeit e com o coletivo de pesquisa holandês Follow the MoneyLink externo, publicada em julho de 2023, revelou que apenas uma fração dos investimentos prometidos no Zimbábue pôde ser de fato verificada in loco.

Há relatos de que várias empresas estão abandonando o esquema do Kariba. Em maio, o diário britânico The Guardian noticiou que a GucciLink externo havia encerrado sua colaboração com a South Pole e a floresta no Zimbábue.

De forma mais abrangente, uma equipe internacional de cientistas e economistas, liderada pela Universidade de Cambridge e pela Universidade Livre de Amsterdã, detectou que milhões de créditos de carbono são baseados em cálculos toscos, que exageram o sucesso de conservação dos projetos voluntários de REDD+. De acordo com um estudo publicado pela revista ScienceLink externo em agosto último, a maioria dos esquemas de compensação de carbono superestima significativamente os níveis de desmatamento que evitam.

Metodologia “não é perfeita”

Em defesa de sua empresa, Renat Heuberger, diretor-executivo da South Pole, afirmou à Reuters que a empresa sempre seguiu a metodologia aprovada para o projeto Kariba.

“Não há outra maneira de fazer projetos de desmatamento. Você não tem como saber, com dez anos de antecedência, quais serão as taxas de desmatamento”, afirmou Heuberger em setembro último.

A certificadora de créditos de carbono Verra, que controla aproximadamente 75% de todos os créditos voluntários em todo o mundo, disse que apreciou o exame minucioso do mercado voluntário de carbono por jornalistas, cientistas e grupos ambientais, e salientou ao mesmo tempo sua importância.

“Não será possível atingir as metas climáticas globais sem o financiamento alavancado pelos mercados de carbono, portanto, precisamos incentivar a transparência nos mercados e nos comprometer com a melhoria contínua”, afirmaram representantes da certificadora. 

Os projetos REDD atingiram resultados enormes até agora, mas o sistema não é perfeito, admite a Verra.

“O cálculo das reduções de emissões resultantes desse trabalho é inevitavelmente menos evidente que em outros casos. É por isso que estamos nos esforçando continuamente para atualizar nosso REDD e todas as outras metodologias do programa Verified Carbon Standard (VCS), para garantir que reflitam as melhores práticas, a ciência mais recente e nossos aprendizados da última década”, afirmam. 

Investidores abandonam a compensação

Até este ano, o mercado voluntário de carbono vinha crescendo, pois cada vez mais empresas passaram a sofrer pressão de acionistas para adotar políticas de emissões líquidas zero. O valor desse mercado era estimado em 2 bilhões de dólares em 2021. Em janeiro de 2023, a Shell e o Boston Consulting Group avaliaram, em um prognóstico conjunto, que esse mercado poderia atingir entre 10 e 40 bilhões de dólares até 2030.

Porém, em setembro, a Reuters informou que os mercados voluntários de carbono haviam encolhido pela primeira vez em pelo menos sete anos, visto que as empresas reduziram as compras.

A demanda por créditos de carbono tende a cair em 2023, de acordo com dois dos principais provedores de dados. O número de créditos utilizados pelas empresas caiu 6% no primeiro semestre do ano, segundo dados da BloombergNEF. Os dados da empresa de consultoria Ecosystem Marketplace apontaram uma queda ainda mais acentuada de 8% neste mesmo período.

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“Estamos deixando de investir em compensações de carbono para nossas marcas e passando a investir em programas e práticas que ajudem a reduzir as emissões de gases efeito estufa em nossa própria cadeia de suprimentos e operações, onde isso faz uma diferença maior para atingirmos nossa ambição zero líquido”, consta de um comunicado da Nestlé à Reuters.

Os acontecimentos recentes parecem ter tido consequências para a equipe da South Pole. A SRF relatou que a empresa anunciou internamente, há duas semanas, que vai ser obrigada a demitir 20% dos funcionários devido a “uma ampla reestruturação”.

A South Pole se recusou a comentar, dizendo à SRF: “Como toda empresa, avaliamos regularmente se nossa equipe global está estruturada de forma sustentável e com pessoal baseado nas dinâmicas e nas demandas do mercado”. A South Pole tem cerca de 1200 funcionários em mais de 30 países.

Adaptação: Soraia Vilela

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