Medo e insegurança são portas de entrada para doenças nos imigrantes
Aumento de peso, problemas hormonais e no aparelho locomotor são muito comuns em quem deixou o país de origem e sofre com a adaptação. Tomar rédeas da sua vida e enfrentar o mundo podem ser uma ótima resolução para 2017.
A médica natural Patricia Quito OliveiraLink externo acredita que migrantes são muitas vezes acometidos por doenças devido ao alto grau de estresse que vivem por deixarem seu país.
A experiência de oito anos de consultório em Zurique dá autoridade à médica da cidade de Santos. Sua clientela é formada, na maioria, de pacientes da América Latina, Brasil e Portugal; muitos que chegam com uma dor generalizada, mas que após uma conversa mais profunda revelam problemas de adaptação na Suíça transformados em enfermidades. Formada pela Paracelsus Schule, em Zurique, a médica defende a importância de se prestar atenção na integração cultural dos estrangeiros.
* Artigo do blog “Suíça de portas abertas” da jornalista Liliana Tinoco Baeckert.
swissinfo.ch: Você acha que problemas com a integração podem influenciar a saúde dos imigrantes, principalmente da mulher?
Patrícia Quito Oliveira: Com certeza, e não somente da mulher latina. Qualquer estrangeira que venha morar na Suíça ou em qualquer lugar e não tenha conseguido driblar os problemas da imigração corre esse risco. Uma das primeiras barreiras pode ser a língua. O alemão não é fácil e o suíço alemão dificulta ainda mais. A pessoa, que ainda não está totalmente integrada, tenta praticar o idioma e se frustra, já que ouve uma coisa e aprende outra.
Pela minha experiência de oito anos de consultório em Zurique, mulheres que ainda não se encontraram têm mais problemas com integração. Isso significa que elas já trazem de suas origens conflitos internos não resolvidos e, diante de uma fase mais complexo, como a da imigração, desenvolvem novas fraquezas. Geralmente são pessoas indecisas, que têm problemas para tomar iniciativa. Eu defendo a ideia de que se você está bem consigo mesma, estará em paz em qualquer lugar do mundo.
swissinfo.ch: É como se a mudança de país enfraquecesse ainda mais a pessoa?
P.Q.O.: Sim. É preciso estar sempre em contato com o seu interior, principalmente em momentos mais difíceis como os de mudança de país. É importante lutar para aprender a língua e não deixar que as primeiras barreiras te enfraqueçam. A falta de integração cultural debilita porque a pessoa se sente incapaz. E isso é uma forma de desencontro com seu eu interior. Com o tempo, desencadeia uma série de outros distúrbios, que acabam por se transformar em doença. A cultura influencia muito a vida de todos. Dessa forma, torna-se ainda mais importante não lutar contra a nova cultura, mas absorver os novos aprendizados e inseri-los aos antigos trazidos do país de origem.
O aprendizado da língua, nesse contexto, torna-se essencial. Existe algo que mais enfraqueça uma pessoa do que não poder ou saber se comunicar? Dessa maneira, o não aprendizado do alemão acaba por colocar os imigrantes a parte da sociedade em que vivem. É como se elas não tivessem mais vontade própria, já que não podem se expressar.
Cada pequena dificuldade dá a pessoa a sensação de ter voltado a ser criança novamente, como uma regressão, afastando-a novamente do seu eu.
swissinfo.ch: Quais seriam as doenças mais comuns que acometem esse público?
P.Q.O.: Essa é uma pergunta bem interessante. Atendo pacientes que reclamam de problemas com o fígado, mas basta eu abordar o lado emocional que já puxo o fio da meada. Essa é uma grande vantagem da medicina natural; o médico tradicionalista não tem muito tempo para avaliar questões mais profundas. Muitas pacientes vêm aqui para poderem desabafar. No entanto, muitas das doenças que desenvolvemos têm origem psicossomática. Essa linha da medicina acredita que as patologias se manifestam em primeiro lugar nas dimensões energética, emocional e só depois aparece no corpo. Muitas enfermidades são criadas como defesa própria, como um escudo de proteção.
Há casos de pacientes que, após mudarem de país, começaram a ter rachadura nas mãos, outro exemplo de doença psicossomática. São geralmente pessoas que alimentam medo da língua e de sair de casa para lutar pelo que querem. A rachadura das mãos torna-se a desculpa perfeita. Faço analogia com o fato de colocar a mão na massa e fazer acontecer, ou até mesmo abrir a porta de casa e não poder porque as mãos estão machucadas.
A dor no joelho e outras doenças do aparelho locomotor também são emblemáticas: te impede de buscar o que quer, funciona como a perfeita desculpa para o medo de andar para a frente, de enfrentar seus objetivos. A fibromialgia, por exemplo, é muito comum nessa dinâmica. Nós, seguidores da medicina natural e chinesa, acreditamos que os bloqueios energéticos causados por esses conflitos internos mal resolvidos geram doenças como essa. Infelizmente as pessoas se podam muito psicologicamente. O medo exagerado e incontrolado, inclusive, aumenta os casos de síndrome do pânico ou até mesmo síndromes de ansiedade, depressão ou transtorno bipolar.
Outro problema muito comum são as doenças hormonais. Há uma alta incidência também de hipotireoidismo. Para a medicina natural, o bloqueio no chacra da laringe, justamente pela perda do poder de expressão, bloqueia a energia naquele local e transforma o obstáculo em patologia. A prisão de ventre também é outro inconveniente e tem a ver com o fato de as pessoas se fecharem em situação como a de imigrante. O ganho de peso é um dos sintomas mais comuns. Um corpo maior oferece a falsa sensação de maior proteção. As enfermidades do aparelho gastrointestinal também são muito comuns.
swissinfo.ch: E como o imigrante pode se proteger dessas doenças, principalmente em situações em que é normal estar mais vulnerável?
P.Q.O.: Estando aberto para mudanças, disponível a aceitar que as coisas podem ser diferentes. Algumas pessoas se colocam em uma posição irredutível, são muito radicais em suas opiniões. Adaptar-se não significa se anular, mas simplesmente deixar espaço para o novo, aceitar que o diferente entre na sua vida. O segredo é ter disposição. Há casos de pessoas que não querem que o filho aprenda os costumes do país hospedeiro. Alguns indivíduos não querem abrir mão de suas verdades, mas o que é a verdade? A única que se sabe é a que existem várias e talvez nenhuma, mas somente maneiras diferentes de se fazer as coisas.
Se eu puder aconselhar alguém, vou dizer que procure o caminho do meio, o ponto de equilíbrio. Aceite a nova cultura sem abrir mão da sua, segredo para viver bem em qualquer lugar. É difícil, mas não impossível. Invista nesse reencontro com seu eu, com o seu poder interior. Faça cursos de alemão, estude, se reinvente, aceite o desafio e se cuide. Use as ferramentas que você ache necessárias para lidar com seus medos internos; seja um profissional de psicologia, um curso intensivo de alemão ou qualquer outra ideia. Vá em frente e coragem.
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