Como a Suíça está aumentando as doações de órgãos para transplantes
Aos poucos, cresce na Suíça a aceitação em doar órgãos após a morte para beneficiar outras pessoas. Mas a lei que facilita a transferência ainda não está em vigor.
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Em 2022, a população suíça votou a favor de um novo sistema que presume que as pessoas consentem que seus órgãos sejam doados, a menos que digam o contrário. Apesar dos atrasos na implementação da nova lei, o número de doadores de órgãos aumentou 22%, entre 2022 e 2023.
“Pela primeira vez, a Suíça está entre os países europeus líderes em doações de órgãos”, diz Franz Immer, diretor da organização Swisstransplant e responsável pela alocação de órgãos doados. Em entrevista ao SWI swissinfo.ch, Immer explica o aumento nos índices e alerta para os obstáculos que ainda podem surgir no futuro.
Por que mais suíços estão doando seus órgãos?
O aumento de 164 doadores para 200, de um ano para o outro, se deve mais a mudanças no sistema de transplantes do que a uma transformação no sentimento da população.
+ Doação de órgãos: a difícil busca por compromisso
Desde 2011, a Swisstransplant tem concentrado seus esforços em aumentar o número de doações de pessoas que morrem de insuficiência cardíaca em vez de morte cerebral.
A taxa de “Doação após morte cardíaca” mais do que dobrou, passando de 50 doadores em 2020 para 96 no ano passado. No mesmo período, os números da “Doação após morte encefálica” seguiram consistentes – foram 96 em 2020 e 104 em 2023.
“O número de hospitais no programa de doação após morte cardíaca já atingiu uma massa crítica suficiente para fazer a diferença”, aponta Immer.
Outro fator que pesou no crescimento das doações foi a introdução de um novo sistema digital que conecta as unidades de terapia intensiva dos hospitais com os dados da Swisstransplant, facilitando o acesso aos critérios de inclusão de pacientes e às listas de espera.
Durante a pandemia de Covid ficou evidente a necessidade de um maior compartilhamento de dados, enquanto a Swisstransplant lutava para manter as operações cirúrgicas em hospitais sobrecarregados.
Agora, olhando a longo prazo, Immer espera que o número de pacientes que precisam de transplantes aumente à medida que a população suíça cresce e envelhece. “Precisamos melhorar nossos processos para atingir a meta de 300 a 350 doadores por ano”, diz.
Índices em comparação com outros países
“Pela primeira vez, a Suíça está entre os países europeus líderes em doações de órgãos”, disse Immer, em referência aos números de 2023.
Isso é apoiado por estatísticas do Registro Internacional de Doação e Transplante de Órgãos (IRODaT). Trata-se de um banco de dados de código aberto administrado pelo Donation & Transplantation Institute (DTI), uma organização sem fins lucrativos com sede em Barcelona.
No ano passado, o número de doadores de órgãos na Suíça foi de 22,73 por milhão de habitantes (PmP). No mesmo período, a França teve 25,9 PmP, a Alemanha 11,58 PmP, a Itália 25,5 PmP, o Reino Unido 21,08 PmP e a Holanda 17,29 PmP.
Nos anos anteriores, a Suíça tinha ficado mais atrás de seus vizinhos europeus.
A votação de 2022 sobre o consentimento de doação de órgãos ajudou a aumentar o número de doadores?
“De forma alguma”, diz Immer. “Observamos até mesmo uma redução no número de doadores em 2022 porque alguns setores da mídia publicaram histórias assustadoras que não eram realistas e que preocuparam muitas pessoas”.
“A confiança no sistema é fundamental para o sucesso em um assunto tão delicado”, acrescenta.
Em 2021, 55% dos parentes rejeitaram pedidos de doação de órgãos de seus familiares falecidos. No ano passado, a taxa de rejeição havia subido para 58%, de acordo com a Swisstransplant.
Qual o impacto que as novas leis de consentimento têm sobre o número de doadores no futuro?
A Holanda, que introduziu o sistema de consentimento presumido em 2020, poderia ser usada como um estudo de caso para a Suíça.
Três anos após a implementação da lei revisada, a Holanda viu o consentimento do doador aumentar de 42% da população para 55%, diz Immer.
Mas a implementação da legislação na Suíça não foi tão rápida quanto se pensava. As expectativas iniciais de que a lei entraria em vigor até o final deste ano não se concretizaram.
O governo decidiu centralizar um banco de dados digital, que registraria os desejos de doação de órgãos das pessoas, com a introdução de um novo sistema de identidade eletrônica. A expectativa é que o sistema entre em operação em 2026, caso a medida não seja adiada por nenhuma contestação em votações.
Os hospitais suíços conseguem lidar com o aumento da demanda de doações para transplantes?
A Swisstransplant está convencida de que o número de doadores de órgãos aumentará quando a mudança na lei de consentimento entrar em vigor.
Immer acredita que o aumento da oferta de órgãos forçará os hospitais a adicionar mais pacientes à lista de espera. Porém, em consequência, as equipes de cirurgia e transplante podem ficar sobrecarregadas.
“A disponibilidade de uma equipe hospitalar especializada em transplantes é a minha maior preocupação para o futuro”, disse Immer. “O cenário é de sobrecarga nos hospitais, não apenas dentre os cirurgiões, mas também entre outras equipes da sala de cirurgia”.
“Mais de 90% das operações de transplante são realizadas fora do horário comercial, durante a noite e nos finais de semana. A nova geração de equipes médicas parece menos disposta a aceitar esses horários”, acrescentou.
“Os hospitais precisam começar a se movimentar para atender ao aumento esperado de doadores dentro de dois ou três anos.”
Edição: Mark Livingston/fh
(Adaptação: Clarissa Levy)
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