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Como proteger os vilarejos dos deslizamentos de terra

Fluxo de detritos
Deslizamento de terra em Lostallo, cantão dos Grisões, em 25 de junho de 2024. Keystone / Ti-Press / Alessandro Crinari

Os recentes deslizamentos de terra causaram mortes e grandes danos em diversos vilarejos suíços. Sistemas de alerta e barreiras de proteção podem prevenir tragédias maiores, mas alguns propõem soluções drásticas para enfrentar o crescente risco de desastres naturais.

Casas e estradas danificadas, comunidades alpinas isoladas e pelo menos doze pessoas mortas ou desaparecidas: esse é o número de vítimas do mau tempo que atingiu os cantões dos Grisões, Ticino e Valais entre meados de junho e início de julho.

As fortes chuvas não só fizeram os rios transbordarem e causaram enchentes, mas também colocaram em movimento o material rochoso acumulado nas encostas das montanhas, provocando avalanches de lama e rocha, um fenômeno altamente destrutivo e difícil de prever.

“Os deslizamentos de terra são muito perigosos porque podem transportar grandes blocos de sedimentos a velocidades relativamente altas”, disse Brian McArdell, especialista em hidrologia de montanhas e movimentos de massa no Instituto Federal Suíço de Pesquisa de Florestas, Neve e Paisagem (WSL).

O vídeo a seguir mostra os danos causados pelos deslizamentos de terra na Suíça no verão:

Os deslizamentos geralmente se formam em leitos de riachos ou ravinas com uma inclinação superior a 25%. No entanto, é quase impossível prever com precisão onde eles ocorrerão. “Em geral, não sabemos a quantidade de detritos presentes em um riacho nem o volume de material que pode se deslocar em caso de chuvas intensas”, explica McArdell.

Os deslizamentos afetam cerca de 70 países em todo o mundoLink externo. Na Suíça, eles podem ocorrer potencialmente em uma grande parte do território, de acordo com o mapaLink externo do ministério suíço do Meio Ambiente. Nos Alpes, eles podem arrastar até meio milhão de metros cúbicos de materialLink externo para o vale e causar uma média de 100 milhões de francos em danos a cada ano.

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Espera-se que o aquecimento global leve a um aumento nos eventos extremos de precipitação e, com isso, a um maior risco de fluxos de detritos, de acordo com a WSLLink externo. “Entretanto, evitá-los é extremamente difícil”, diz McArdell.

Portanto, medidas para proteger as pessoas e a infraestrutura são indispensáveis, especialmente em áreas já afetadas ou consideradas de risco. Existem basicamente duas soluções: sistemas de alerta e obras arquitetônicas de defesa.

Antecipação com inteligência artificial

Os sistemas de alertaLink externo podem antecipar a possibilidade de ocorrência de um fluxo de detritos ou detectar o movimento do material quando ele já estiver em andamento.

No primeiro caso, as previsões são essencialmente baseadas na quantidade de chuva. Essa abordagem tem a vantagem de alertar as forças de intervenção, como bombeiros e polícia, explica Alexandre Badoux, também especialista do WSL. “No entanto, nem sempre é a melhor solução para a população”, diz.

“Os alarmes falsos são o problema: sabemos que a população tem dificuldade com eles”

Alexandre Badoux, especialista

As torrentes e ravinas que produzem deslizamentos de terra não reagem todas da mesma forma durante chuvas fortes. Portanto, é difícil definir um limite de precipitação que seja aplicável a toda uma região. “O problema são os alarmes falsos: sabemos que a população tem dificuldade de lidar com eles”, declara Badoux.

O outro sistema reconhece um deslizamento em andamento por meio de instrumentos instalados no leito do córrego ou nas margens. Cordas metálicas se rompem com a passagem do material, enquanto dispositivos mais sofisticados (sensores) captam as ondas que se propagam pelo solo.

Aqui também há uma desvantagem: quando o fluxo de detritos começa a fluir rio abaixo, geralmente resta pouco tempo para dar o alarme. Para ganhar minutos preciosos, pesquisadores da Escola Politécnica Federal de Zurique (ETH) e do WSL desenvolveram um sistema de alerta baseado em inteligência artificial.

Os sensores normalmente usados em terremotos detectam vibrações causadas por deslizamentos a vários quilômetros de distância. O algoritmo treinado com dados de fluxos de detritos anteriores é capaz de distinguir o movimento do material das vibrações emitidas, por exemplo, por rebanhos de vacas ou tráfego ferroviário.

O dispositivo foi testado com sucessoLink externo em 2020 em Illgraben, no cantão de Valais. A margem de alerta foi ampliada em 20 minutos.

Redes de aço para proteger casas e infraestrutura

“Os sistemas de alerta podem proteger as pessoas e, assim, salvar vidas”, diz Alexandre Badoux. “No entanto, eles não podem evitar danos à infraestrutura.”

Muros de concreto e aterros protegem as casas e a infraestrutura dos deslizamentos de terra, mas são caros e ocupam muito espaço.

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As barreiras de malha de aço, usadas há muito tempo contra deslizamentos e avalanches, são uma alternativa mais barata. Elas podem ser instaladas rapidamente em um córrego ou barranco como uma medida imediata ou como proteção para uma única estrada ou prédio. Desde 2007, mais de 110Link externo foram instaladas na Suíça.

A rede de barreira retém o material sólido dos deslizamentos e a malha permite a passagem de água e lama. “Usamos fio de aço de alta resistência, o mesmo fio usado nos cabos dos teleféricos de esqui”, explica Isacco Toffoletto, engenheiro da Geobrugg, empresa líder em sistemas de proteção contra riscos naturais.

Barreira de conteção
Para a instalação dessa barreira de 22 metros de largura e seis metros de altura, o município de Melide, no Ticino, investiu cerca de 120 mil francos. Geobrugg

Mas, assim como os sistemas de alerta, as redes de aço também têm seus limites. Elas só fazem sentido em locais onde os fluxos de detritos raramente se formam, diz Alexandre Badoux. “Caso contrário, elas teriam que ser continuamente limpas de material, uma operação muito cara.”

Uma proteção adicional contra os deslizamentos são as bacias de contenção. Elas podem coletar grandes quantidades de material, mas exigem uma grande área de superfície.

Abandonar os vales alpinos mais expostos?

Com o aumento do risco de desastres naturais causados pelo aquecimento global, a proteção de todos os assentamentos e da infraestrutura alpina se tornará cada vez mais complicada e cara. Em 2022, o governo federal, os governos cantonais e os municípios investiram cerca de 600 milhões de francosLink externo em proteção contra desastres naturais.

Para Reinhard Steurer, professor de política climática na Universidade de Recursos Naturais e Ciências da Vida em Viena, soluções drásticas serão inevitáveis.

Os danos causados por inundações e deslizamentos de terra, como os que ocorreram na Suíça neste verão, ainda podem ser reparados, “mas se isso acontecesse duas ou três vezes e, além disso, em uma área que já é pouco povoada, a reconstrução não seria mais justificável do ponto de vista socioeconômico”, declarou ao jornal NZZLink externo. Até o final do século, ele argumenta, alguns vales alpinos expostos terão que ser parcialmente abandonados.

De acordo com Carmelia Maissen, essa é uma “visão cínica e de curto prazo”. Maissen é presidente da Conferência dos Governos Cantonais Alpinos. Embora possa haver casos individuais de reassentamento, vales inteiros não precisarão ser abandonados, disse ela ao mesmo jornal. Agora é necessário analisar o que aconteceu nas áreas afetadas pelo mau tempo e identificar os pontos fracos, levando em conta as mudanças climáticas previstas.

Para o especialista Alexandre Badoux, o próximo passo também é entender as razões para esses deslizamentos destrutivos. Isso servirá para revisar os mapas de riscos naturais e possivelmente redefinir as zonas de risco.

Esse é o único aspecto positivo das tragédias que atingiram os vilarejos suíços nas últimas semanas: talvez elas evitem mais mortes e danos no futuro.

Edição: Sabrina Weiss

Adaptação: Alexander Thoele

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