Suíça se torna epicentro da aviação de luxo e poluição
![Vista interna de um avião](https://www.swissinfo.ch/content/wp-content/uploads/sites/13/2025/01/dreamstime_m_155496886.jpg?ver=723a201d)
Os voos de jatos particulares, bem como suas emissões, dispararam nos últimos anos, sendo a Suíça um dos principais destinos desses aviões altamente poluentes. O pequeno país no Alpes é um ímã para viajantes abastados em seus jatos – especialmente no inverno, quando há mais voos para resorts de luxo.
Em uma manhã clara do final de janeiro, um fluxo constante de jatos particulares desce pelo estreito vale coberto de neve até o aeroporto da EngadinaLink externo, um dos mais altos da Europa (1.707 metros), que atende à demanda dos resorts próximos de St MoritzLink externo e DavosLink externo.
Um jato Gulfstream de Milão aterrissa. O motorista de uma van preta, da Mercedes, recebe discretamente os passageiros que desembarcam da aeronave antes de conduzi-los para fora do local. A seguir, aterrissa outro jato, desta vez vindo de Bruxelas, que a equipe de terra estaciona ao lado de meia dúzia de outros aviões de luxo que aguardam a decolagem.
Janeiro e fevereiro são meses intensos no pequeno aeroporto, com 30 a 100 jatos indo e vindo durante alguns dias. Nos últimos anos, esse aeroporto tem recebido um número crescente de aeronaves de pequeno porte da Europa, dos Estados Unidos, do Brasil e do Oriente Médio. As instalações consideravelmente básicas registraram quase 17.300 voos em 2023.
O último fim de semana foi particularmente agitado: St. Moritz recebeu 25 mil visitantes para a 40ª Copa do MundoLink externo de Polo na Neve. Jogadores profissionais da Argentina, do Reino Unido e da Espanha participaram da competição, assistida por moradores locais, personalidades conhecidas e “pessoas que vieram de avião ou que têm casas de férias ali e amam polo na neve”, observa Katja Grauwiler, assessora de imprensa do evento.
A competição ocorreu dias após a reunião anual do Fórum Econômico Mundial em Davos. Jatos particulares levaram para a Suíça vários dos 3 mil líderes mundiais, empresários e outros envolvidos no evento. Essas pessoas aterrissaram nos aeroportos de Engadine, Zurique e Altenrhein, para, a seguir, pegar helicópteros até Davos. A conferência é uma concentração de jatos particulares em atividade. De acordo com o Greenpeace, mais de mil voos particulares aterrissaram na Suíça para a conferência de uma semana do Fórum Econômico Mundial em 2022.
A Suíça é um conhecido polo concentração de jatinhos durante todo o ano. Um relatórioLink externo encomendado pelo Greenpeace descobriu que o país era responsável por quase 5% das emissões de jatos particulares da Europa, com um aumento de 63% nas partidas desse tipo de aeronave em comparação com 2021.
![Aviões estacionados em um aeroporto](https://www.swissinfo.ch/content/wp-content/uploads/sites/13/2025/01/2022-09-06T140540Z_433846610_RC2LBW9BWL07_RTRMADP_3_FRANCE-POLITICS-JETS.jpg?ver=d4a3cd3f)
De acordo com um estudo de 2024 do think thank T3 Transportation, Genebra recebeu mais de 40 voos diários de jatos particulares em 2023, tornando-se, depois de Nice, na França, o segundo aeroporto mais usado para esse tipo de transporte na Europa. Paris-Genebra e Farnborough (Londres)-Genebra estavam entre as dez rotas mais movimentadasLink externo do continente em 2023. Os aeroportos de Zurique, Sion, Gstaad e St Moritz também permanecem movimentados durante todo o ano.
Embora sejam usados por apenas 0,003% da população mundial, os jatos particulares são o meio de transporte mais poluente. A forma como são usados e o impacto ambiental que geram estão se tornando evidentes só agora, graças a uma pesquisa detalhada e independente.
Aviões e voos particulares em alta
Nas últimas duas décadas, a frota global de jatos aumentou de cerca de 10 mil em 2000 para 23.100 em meados de 2022, segundo um relatórioLink externo de 2023 do Instituto para Estudos Políticos (IPS, na sigla em inglês). Desde então, o setor de aviação executiva continuou a registrar crescimento, com a previsão de entrada em serviço de mais 8.100 jatos até 2033.
Os voos em jatos particulares aumentaram sensivelmente no período pós-pandemia, sobretudo nos EUA e na EuropaLink externo. Uma pesquisa recenteLink externo publicada pela revista Nature sobre 19 milhões de voos entre 2019 e 2023 revela um aumento impressionante de 50% nas emissões de CO2. Pesquisas calculam que os voos produziram 15,6 milhões de toneladas de CO2 em emissões diretas em 2023 (o que corresponde a cerca de 3,6 toneladas de CO2 por voo), em comparação com 10,7 milhões de toneladas em 2019.
Em todo o mundo, os voos de jatos executivos atingiram 3,6 milhões em 2024, o que significa 30% a mais do que em 2019, de acordo com dadosLink externo da empresa WingX de consultoria sobre aviação.
“Observamos um aumento constante, sugerindo que o crescimento da riqueza tenha sido o principal fator impulsionador”, declarou à SWI swissinfo.ch Stefan Gössling, pesquisador da Universidade Linnaeus, na Suécia, e coautor do recente estudoLink externo da Nature.
Estimativas do setor de jatos apontam aproximadamente 256 mil viajantesLink externo de jatos em 2018, com patrimônio médio de 123 milhões de dólares para cima.
Os EUA têm mais de dois terços (18.163) dos jatos particulares do mundo, muito à frente do Brasil (927) e do Canadá (770). Malta detém o recorde de jatos registrados por residente (46,5 por 100 mil); a Suíça ocupa o terceiro lugar (3,76 por 100 mil).
Fora dos Estados Unidos e da Europa, o Brasil, o Oriente Médio e o Caribe são locais de concentração de jatos particulares.
Viagens curtas para fins de lazer
O estudoLink externo da Nature acima mencionado rastreou mais de 25 mil aeronaves particulares do tipo jato registradas e quase 19 milhões de voos particulares entre 2019 e 2023. A análise de padrão de voo confirmou que grande parte tinha fins de lazer. O estudo também destacou o impacto dos voos no contexto de reuniões internacionais de alto escalão, incluindo a Copa do Mundo de 2022 no Catar (1.846 voos) e a Cúpula do Clima da ONU (COP28) nos Emirados Árabes Unidos (291 voos).
As pesquisas constataram também que metade dos jatos percorreu menos de 500 km, e 900 mil aeronaves desse tipo foram usadas como táxis para percursos de menos de 50 km. Nos EUA, celebridades como Taylor SwiftLink externo e Kylie Jenner foram criticadas em função do uso intenso de jatos particulares e viagens ultracurtasLink externo. O think tank T3 Transportation identificou vários exemplos de viagens curtas na Suíça, incluindo 152 de Sion a Genebra (90 km) e 84 de Lausanne a Genebra (60 km).
“Há apenas uma razão plausível para isso: ‘pernas vazias'”, explica Frederic Rudolph, pesquisador do think tank alemão. “Pernas vazias” são voos privados fretados, que acontecem sem passageiros em seu caminho para se reposicionar de um aeroporto a outro.
![Airplane in sky.](https://www.swissinfo.ch/content/wp-content/uploads/sites/13/2022/06/b2d2ffbb8e5b4cc97681c8a29d526a9e-103791745_highres-data.jpg?ver=1bb01bfd)
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Apertem os cintos: as emissões da aviação estão prestes a decolar novamente
A principal conclusãoLink externo do estudo da Nature é clara: a aviação privada está “contribuindo cada vez mais para a mudança climática”.
Os jatos particulares são bem conhecidos por serem poluidores excessivamente pesados. Embora as viagens com esse tipo de aeronave representem apenas 4%Link externo do mercado global de aviação, elas produzem cerca de 10 vezes mais gases de efeito estufa por passageiro.
O T3 Transportation estima que um voo típico de jato particular gera 4,46 toneladas de CO2 – mais do queLink externo as emissões anuais de CO2 de um residente suíço (sem levar em conta as emissões geradas no exterior).
Conscientes de seu impacto ambiental, algumas empresas do setor de jatos tentam oferecer a clientes opções ecologicamente corretas, como “combustíveis sustentáveis de aviação” nos voos ou compensações de carbono.
![scritta co2 in fiamme](https://www.swissinfo.ch/content/wp-content/uploads/sites/13/2023/04/1f1c4bd27ede588b27d3eff5ec8d6224-329870385_highres-data.jpg?ver=ac8c872c)
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“CO2 é um resíduo sem valor, mas isso precisa mudar”
Novos modelos de negócios
Relatórios científicos recentes sublinham o crescimento contínuo do setor depois que passageiros abastados passaram a usarLink externo a aviação privada, quando a Covid forçou o confinamento no mundo. A demanda crescente tem sido impulsionada por preocupações com saúde e segurança, bem como pelo desejo de privacidade, flexibilidade e serviço personalizado.
Novos modelos de negócios também estão tornando as viagens em jatos particulares de luxo mais acessíveis. Possuir e operar uma aeronave particular, que custa dezenas de milhões de francos suíços, pode estar ao alcance apenas dos ultra-ricos. No entanto, é cada vez mais viável alugar um jato por meio de empresas que oferecem fretamento sob demanda, programas de associação ou esquemas de propriedade compartilhada.
“Acho que usar jatos particulares ainda é uma atividade de elite, embora, pelo que tenho ouvido, as taxas de fretamento sejam quase razoáveis para algumas distâncias”, observa Gössling.
As ofertas de preços reduzidos em voos de jatos “empty leg”, que foram reposicionados, também tornaram o setor mais acessívelLink externo. Por exemplo, uma “perna vazia” só de ida de Munique para Genebra no verão passado estava à venda por 1190 euros após uma redução de 80%, informou a RTS, rede pública de televisão suíça.
Taxas elevadas e regulamentação
Em última análise, a aviação, e os jatos particulares em particular, parecem destinados a permanecer firmemente na mira dos ativistas ambientais, que querem ver uma tributação e regulamentação mais rígidas, a fim de incentivar um uso menor desse tipo de transporte, equilibrando a concorrência.
![Pessoas protestando frente a um avião](https://www.swissinfo.ch/content/wp-content/uploads/sites/13/2025/01/643615745_highres.jpg?ver=d868b653)
Críticos lamentam constantemente o fato de que as companhias aéreas, ao contrário dos motoristas de toda a Europa, pagam imposto zero sobre o combustível. As passagens de avião também são, em sua maioria, isentas do Imposto sobre Valor Agregado.
O IPS sugere um imposto de 10% sobre jatos particulares usados e de 5% sobre jatos novos, bem como a duplicação do imposto sobre combustíveis, um imposto sobre viagens curtas e uma contribuição para o financiamento da infraestrutura aeroportuária.
Há quem prefira formas de protesto mais espetaculares e que ocupem as manchetes. Durante o Fórum Econômico Mundial deste ano, quase 30 ativistas do Greenpeace invadiram o Aeroporto de Engadine para “confiscar” simbolicamente jatos particulares ao lado da pista de decolagem, prendendo bolas e correntes infláveis às aeronaves estacionadas para uma sessão de fotos, com o objetivo de destacar o uso crescente desse tipo de transporte pelos super-ricos.
Edição: Veronica De Vore/Gabe Bullard
Adaptação: Soraia Vilela
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