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Ativistas climáticos suíços continuam protestando, mas mudança ‘não é fácil’

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Salvar o mundo? Uma manifestação do Fridays for Future em Berna, em março de 2023. KEYSTONE/© KEYSTONE / ANTHONY ANEX

No dia 19 de abril, ativistas climáticos se reuniram em cidades suíças para realizar uma “greve climática mundial”. Com o número de participantes diminuindo, o movimento ainda é relevante?

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Em setembro de 2019, o ativismo climático suíço atingiu seu ápice ao reunir 100.000 pessoas em Berna, muitas delas inspiradas pela ativista sueca Greta Thunberg.

Um mês depois, as eleições parlamentares confirmaram essa tendência, com o Partido Verde obtendo vitórias sem precedentes.

Desde então, as coisas mudaram um pouco: após a pandemia, várias guerras, o aumento do custo de vida e o colapso de um dos maiores bancos do país, as emissões de carbono ainda são uma das principais preocupações da população suíça – mas não necessariamente a principal. Embora as pessoas ainda estejam amplamente atentas às questões climáticas, elas nem sempre estão prontas para tomar as devidas providências: os Verdes perderam espaço nas eleições de 2023, o aeroporto de Zurique está a todo vapor, as vendas de SUVs estão crescendo e o número de participantes nos protestos climáticos suíços “derreteu mais rápido do que as geleiras”, como escreveu o jornal Tages-Anzeiger no ano passado.

“Eu nem imaginava que seria necessário continuar fazendo campanha cinco anos depois”, diz a ativista Meret Schefer. “Em 2019, pensávamos que podíamos mudar tudo. Foi um movimento muito poderoso. Com o passar dos anos, a gente aprende que não é tão fácil assim”.

Schefer, que era uma estudante de 15 anos em 2019, agora é porta-voz do Fridays for Future, um movimento conhecido na Suíça como “Greve Climática”. Ela é uma das poucas pessoas que estão no movimento desde o início.

“Perdemos algumas pessoas ao longo do caminho”, diz ela. Algumas passaram a exercer outras funções relacionadas a questões ambientais; outras simplesmente desistiram. Ela não critica ninguém por ter feito isso, diz Schefer. Fazer ativismo climático é um trabalho árduo e “não é a forma como deveríamos passar nossa juventude”.

No dia 19, o movimento organizou sua “greve” em Berna e em outras cidades suíças, com quatro exigências principais: o fim do uso de combustíveis fósseis, o aumento da infraestrutura renovável, a democratização do setor energético e uma redução “socialmente justa” do uso de energia.

“Se 2.000 pessoas comparecerem, ficarei feliz”, afirmou Schefer antes do protesto. Segundo a agência de notícias Keystone-SDA, cerca de 5.000 pessoas compareceram aos protestos realizados nas cidades suíças.

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Diversificação

Embora os números tenham superado suas expectativas, Schefer já havia afirmado que o tamanho dos protestos não era uma das suas principais preocupações. “Nosso ativismo não é mais feito apenas nas ruas”, diz ela. As manifestações são importantes como forma de engajamento e solidariedade, especialmente para os jovens – “me ajudou a me sentir menos sozinha” –, mas o movimento se “diversificou” desde 2019.

Nos últimos cinco anos, o movimento tentou criar estruturas organizacionais mais sólidas que permitam que ele continue atuando. Agora, ele também organiza mais projetos educacionais e de intercâmbio, inclusive com ativistas de outros países. Além disso, alguns de seus membros se candidataram a cargos políticos.

O Fridays for Future também atua na esfera jurídica, na qual obteve uma importante vitória recentemente: em Birr, no cantão de Aargau, a organização auxiliou uma moradora que recorreu ao Tribunal Administrativo Federal contra o plano do governo de instalar uma usina de gás de caráter emergencial.

Essa “vitória”, que cinco anos atrás seria inimaginável para Schefer, encorajou o Fridays for Future a focar nos planos gerais do governo de instalar usinas de energia de reserva. Esse também foi um tópico comemorado e divulgado na manifestação em Berna.

Linha tênue

Resta saber se isso é sinal de um “resgate” do movimento climático, como questionouLink externo a televisão pública suíça, SRF. No centro do questionamento está o fato de que o Fridays for Future não é o único participante do movimento climático. Desde 2019, grupos como o Renovate Switzerland e o Extinction Rebellion têm atraído muita atenção midiática por bloquearem ruas e sujarem edifícios; como resultado, eles também irritaram grande parte da população.

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Na Sexta-feira Santa de 2023 – um dos dias mais movimentados do ano para o tráfego – os ativistas da Renovate Switzerland bloquearam a entrada do túnel do São Gotardo, na Suíça central. KEYSTONE/© KEYSTONE / URS FLUEELER

Isabelle Stadelmann-Steffen, professora de ciência política da Universidade de Berna, diz que os movimentos climáticos, como qualquer pequeno grupo de ativistas, podem ter um grande impacto no sistema suíço de democracia direta – se não diretamente, pelo menos “influenciando a opinião pública e provocando debates”.

Ao mesmo tempo, é uma linha tênue entre “ter visibilidade e provocar uma reação negativa”, diz ela. Pesquisas mostraram que bloquear estradas é algo que incomoda muitas pessoas. E, infelizmente para o Fridays for Future, Stadelmann-Steffen “não acredita que a maioria das pessoas diferencie os diferentes grupos de ativismo climático”.

Uma coisa só

Enquanto ativista climática, Schefer concorda que o público tende a ver todos os movimentos como uma coisa só, mesmo que eles não trabalhem sistematicamente juntos. Ela também diz que seu grupo chegou a ser acusado de ser responsável – devido à natureza radical das táticas do Renovate Switzerland e do Extinction Rebellion – pelas perdas políticas sofridas pelo Partido Verde no ano passado.

Internacionalmente, o Fridays for Future tem sido alvo de críticas devido ao seu posicionamento em relação a questões como o conflito entre Israel e Palestina. E a líder do movimento, Greta Thunberg, que sempre foi alvo de críticas, está agora nas manchetes por ter sido presa.

Schefer não acredita que haja motivos para pedir desculpas. Quanto aos seus posicionamentos em campos menos “tradicionais”, como o antirracismo ou a questão palestina, ela diz que eles são consequência da percepção de que os problemas climáticos permeiam todas as questões de justiça.  Além disso, seu movimento é global, com membros de partes desfavorecidas do mundo.

Quanto à desobediência civil, o núcleo suíço da Fridays for Future nunca bloqueou estradas, diz ela. Como muitos de seus membros são jovens adolescentes, esse método dificilmente seria aconselhável. Mas ela não condena essas táticas, nem entende a “enorme raiva” que elas provocam: no final, os ativistas climáticos estão trabalhando para benefício de todos, enquanto a esfera política permanece inerte, diz ela.

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Pequenos passos

Mas as coisas mudaram na esfera política suíça desde 2019. Em 2021, os próprios cidadãos haviam rejeitado uma proposta de lei que visava reduzir as emissões de CO2. No ano passado, no entanto, eles votaram a favor de alcançar a neutralidade de carbono até 2050. Em junho, eles decidirão sobre uma “lei de eletricidade” que visa acelerar a construção de parques solares e eólicos em grande escala.

Isso será suficiente? A cientista política Stadelmann-Steffen diz que a formulação de políticas públicas sempre ocorre na lacuna entre o ideal e o viável. Isso acontece ainda mais no sistema suíço, caracterizado pelos “compromissos e pequenos passos”. A política climática não é uma exceção nesse sistema, diz ela – ou, se for, é no bom sentido, pois os políticos realmente deram passos maiores do que o normal, pelo menos nos últimos meses.

Schefer discorda. Medidas como a proposta de lei de eletricidade – que o Fridays for Future apoia oficialmente – mostram que “as pessoas estão claramente pensando no clima”, diz ela. Mas, na sua opinião, esses avanços graduais não permitem acreditar que o suficiente esteja sendo feito. “Sou muito impaciente”, diz ela.

É possível imaginar como será o movimento climático, ou especificamente o Fridays for Future, daqui a cinco anos?

“Não é possível planejar o ativismo neste mundo”, diz Schefer. No entanto, sua “esperança” é que, em 2029, a situação climática esteja “tão pior” que os países desenvolvidos finalmente percebam a dimensão do problema e ajam de maneira inédita – como no caso da Covid – para zerar as emissões de carbono em alguns anos. Isso é o mais otimista que podemos ser, diz ela.

Edição: Balz Rigendinger/fh
(Adaptação: Clarice Dominguez)

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Moderador: Emilie Ridard

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