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A barqueira mais bonita de Brienz

Encenação da peça "Elisabetha, a bela barqueira do lago de Brienz" em 2004 (foto: Dora Schmid-Zürcher) Dora Schmid-Zürcher

O lago de Brienz, um dos mais belos cenários alpinos da Suíça, é palco de uma história triste de amor que se transformou em livro, peça de teatro e até obra de arte.

Elisabetha Grossmann foi uma das mais belas barqueiras no século XIX. Hoje sua lembrança se transformou em atração turística.

Estamos em 1814. Nessa época os primeiros turistas estrangeiros, sobretudo vindos da Inglaterra, começavam a descobrir as belezas naturais dos Alpes, uma região tradicionalmente pobre e agrária na Suíça.

O lago de Brienz, na região de montanhas do cantão de Berna, era um desses locais. Com 29,8 quilômetros quadrados e até 260 metros de profundidade, suas águas azuis e a paisagem de majestosas montanhas cobertas de neve enfeitiçavam os estrangeiros. Os habitantes dos povoados às suas margens – Brienz, Giessbach ou Kienholz – perceberam que entreter esse estranho público seria uma boa alternativa de renda às atividades tradicionais como a pesca ou agricultura.

Um desses habitantes, o diretor de escola Johannes Kehrli, teve uma boa idéia: ele construiu uma trilha cortando as famosas cascatas de Giessbach, que existe até hoje. Já os pescadores abriram as primeiras pensões e simples restaurantes, enquanto agricultores tocavam corne dos Alpes e outros instrumentos típicos durante o jantar. Artesãos como os talhadores de madeira de Brienz começaram a fazer as primeiras esculturas de madeiras, um produto que faria posteriormente a fama de Brienz na Europa.

Porém uma das melhores idéias surgidas no povoado foram os pequenos barcos à remo, utilizados para levar os turistas de Brienz até as cascatas e trazê-los de volta. Um detalhe: eles eram conduzidos por jovens mulheres, filhas dos habitantes locais, e que cantavam belas canções durante o trajeto.

A mais bela

Elisabetha Grossmann foi seguramente a mais famosa delas. Sua beleza era tanta, que ela se tornou conhecida em toda a Suíça como “la belle batelière”, ou seja, a mais bela das barqueiras.

Nascida em 14 de dezembro de 1794, filha de um casal de agricultores, com apenas doze anos ela já remava barcos no lago de Brienz. Um dos turistas, o barão alemão Wilhelm von Bal, ficou tão encantado com seu charme que chegou a financiar um ano para ela numa escola privada em Berna.

Porém não era fácil para uma filha de agricultor dessa época completar os estudos. Assim Elisabetha voltou para Brienz e com o dinheiro obtido nos passeios de barco com os turistas ela podia continuar a ajudar sua família.

Com o passar dos anos, a fama da bela barqueira extrapolou os limites do lago de Brienz. Pintores como Franz Niklaus König, Markus Dinkel, Emanuel Locher, Ludwig Vogel e outros a retrataram em pinturas à óleo ou aquarelas.

História de amor

Um dos motivos que contribui à fama de Elisabetha foi uma triste história de amor. Em 1813, o jovem professor de Nêuchatel, cantão vizinho, se apaixonou por ela na sua primeira viagem ao lago de Brienz. Depois de cortejá-la durante várias viagens à região, ele conseguiu finalmente convencê-la a aceitar o noivado.

Porém o casal não contava com a forte oposição da mãe do professor, que considerava Elisabetha pouco digna de casar com um acadêmico oriundo de uma das famílias mais conhecidas de Neuchâtel. A pressão foi tanta, que Abram François Pettavel, o professor, desistiu de casar com a barqueira e indenizou-a com uma certa quantia de dinheiro.

Decepcionada, ela casou-se em 1816 com um comerciante da região, com quem teve nove filhos. Ao abandonar os barcos, ela e seu marido se tornaram proprietários de um restaurante e, quando a concessão deste foi tomada pelo governo, de uma pequena loja de venda de objetos talhados na madeira.

A “belle batelière” faleceu em 20 de março de 1858 com 63 anos. Doze anos depois faleceu seu primeiro amor, o professor, com quase oitenta anos. Sua história se transformou em 1964 num livro intitulado “Elisabetha, a bela barqueira do lago de Brienz”, escrito pelo autor suíço Rudolf Perren.

Elisabetha e o turismo

Há muitos anos os barcos à remo e suas belas barqueiras desapareceram do lago de Brienz. Essa tradição começou a morrer em 1839 com a introdução dos primeiros barcos à vapor. Hoje em dia, cinco navios da empresa BLS AG fazem passeios com turistas pela região. O mais conhecido deles è o navio à vapor “Lötschberg, construído em 1914.

Porém a lembrança de Elisabetha continua viva em Brienz. Ela ajuda a dar um toque especial, um ambiente quase de Romeo e Julieta ao pequeno vilarejo às margens do lago de Brienz.

“Para nós a história de Elisabetha, a bela barqueira, não é apenas um folclore. Ela fala das mais importantes e bonitas tradições da nossa região”, explica Monika Gruenenfelder, chefe de marketing na Secretaria de Turismo de Brienz, Meiringen e Hasliberg.

No verão de 2004, a Associação Dramática de Brienz organizou uma peça ao ar livre para contar a história da barqueira. Os 57 atores e 10 músicos que participaram da encenação resgataram até antigos barcos à remo e roupas de época para criar um clima de passado. O grupo apresentou 19 vezes a peça. Em todas elas, os quinhentos lugares ficaram ocupados.

Em 23 de agosto de 2005, Brienz e grande parte da Suíça central foram atingidas por fortes chuvas. Elas terminariam causando uma das maiores enchentes na Suíça nas últimas décadas. O rastro de destruição deixado pelas águas pode ser visto até hoje na região. Muitas casas de Brienz tiveram de ser abandonadas por risco de desabamento.

Hoje o lago de Brienz parece estar recuperado da tragédia. Os turistas retornaram para admirar as cascatas de Giessbach e as montanhas nesse deslumbrante cenário alpino. Os artesãos de madeira talhada continuam a vender suas obras. O povoado se orgulha de viver num permanente “natal” (ler matéria do arquivo).

E quanto à Elisabetha, sua memória vai ser protegida através das tradições locais. A firma Jobin, um dos talhadores de madeira mais conhecidos de Brienz, foi contratada para fazer uma escultura da bela barqueira em tamanho natural e pilotando seu barco. Ela deve estar pronta até o verão de 2007, quando uma grande festa irá inaugurar o retorno de Elisabetha às margens do lago de Brienz, logo a frente da estação de trem do vilarejo.

“A única coisa que achamos triste é que Elisabetha não poderá cantar para nós uma canção”, brinca Monika Gruenenfelder.

swissinfo, Alexander Thoele

Turistas famosos na região de Brienz:

Lord George Byron (escritor)
James Fenimore Cooper (escritor)
Rodolphe Töpfler (escritor)
James Cook (empresário)
Alexandre Dumas (escritor)
Jakob Ludwig Felix Mendelssohn Bartholdy (compositor)
Mark Twain (escritor)
Sir Arthur Ignatius Conan Doyle (escritor)

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