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Arqueologistas na Suíça se preparam para a Síria do pós-guerra

Foto publicada em 25 de agosto de 2015 nas mídias sociais utilizadas pelo Estado Islâmico. Ela mostra a destruição do tempo sírio de Baalshamin. Keystone

Enquanto a guerra na Síria continua, três arqueólogos suíços ressaltam a importância da preservação do seu patrimônio cultural. Ao mesmo tempo, o país já figura como um refúgio para as obras. 

“Como arqueólogo sírio, estou evidentemente muito, muito triste. É realmente uma tragédia para o nosso patrimônio cultural”, testemunha Mohamad Fakhro, professor da Universidade de Aleppo, a cidade mais atingida pelo conflito. “Mas a primeira reação quando ouço falar do templo de Baalshamin em Palmira e outros atos de destruição é de me concentrar sobre uma maneira de reconstrui-los. Nós somos arqueólogos e não políticos ou soldados. Nosso objetivo, nosso trabalho é de proteger o patrimônio cultural.”

Mohamad Fakhro esteve recentemente em Berna com Mohammed Alkhalid, um pesquisador em arqueologia na Universidade de Berna, e Cynthia Dunning, diretora da ArchaeoConceptLink externo, uma empresa suíça de apoio aos arqueólogos e às pessoas encarregadas de proteção do patrimônio.

Em sua apresentação a uma sessão local do TEDxLink externo, (um programa de conferencias concebido para difundir ideias inovadoras nascido na Califórnia em 1984), eles se concentraram sobre o trabalho de “s h i r ī nLink externo“, uma iniciativa de pesquisa internacional sobre o patrimônio sírio lançado pela American Schools of Oriental Research (Boston).

“Minha esperança é que meus colegas suíços, ou até empresas privadas do país, participem igualmente dessa reconstrução e nos ajude a encontrar vagas para pessoas em formação profissional na área”, afirma Cynthia Dunning.

É a Secretaria Federal de Cultura que está principalmente encarregada da guarda dos bens culturais. “As leis suíças permitem ao governo importar objetos culturais de países em guerra para protegê-los”, completa Cynthia Dunning, antes responsável pelo serviço arqueológico do cantão de Berna entre 1998 e 2010.

O refúgio suíço

Durante a guerra civil espanhola, um grande número de quadros do Museu Nacional do Prado em Madrid foi abrigado na Suíça e apresentados no Museu de Arte e História de Genebra.

Mais recentemente o chamado Museu Afegão de Bubendorf (cantão Basileia-campo) foi a iniciativa de um particular em prol dos bens culturais afegãos ameaçados, colocados temporariamente em segurança no local a partir de outubro de 2000 e posteriormente repatriados em 2007.

O governo suíço dispõe hoje de locais adaptados à criação de um refúgio nesses moldes. O local de depósito e os bens culturais que lá se encontram são administrados por especialistas do Museu Nacional Suíço.

O 2° Protocolo da Convenção de Haia para a proteção de bens culturais em caso de conflito armado estipula os países-membros (dentre eles a Suíça) permitam que a Suíça disponibilize um refúgio – conhecido igualmente, no plano internacional, pelo nome de “safe haven”. Esse seria um local temporário de deposito destinado aos bens culturais gravemente ameaçados em um país.

Um refúgio, ou “safe haven”, existe mesmo em Zurique, próximo às oficinas dos restauradores do Museu Nacional Suíço, mesmo se nenhum governo estrangeiro faça apelo à Suíça para aproveitar dessa opção recomendada pela UNESCO.

“O governo sírio deveria dizer se quer proteger seus bens culturais e fazer o pedido correspondente à Suíça, o que não ocorreu até então”, revela Cynthia Dunning.

Mohamad Fakhro tentou entrar em contato com seus colegas da Direção de antiguidades e museus em Damas para informar-lhes sobre essa opção de refúgio na Suíça. Mas a legislação síria impediria de aceitar essa possibilidade. “É completamente proibido. Meus colegas na Síria dizem que se Damas solicitasse ajuda à Suíça, isso significaria que o governo é fraco. Nós perguntamos a eles se essa interdição estaria relacionada também aos objetos sírios encontrados na Turquia ou Jordânia. Eles nos responderam que também era igualmente proibido.”

Cynthia Dunning insiste: “O patrimônio cultural pertence a todos nós. É um desafio mundial, não somente uma questão síria. Somos todos atingidos pelo problema.”

A guerra na Síria, que já provocou milhares de mortes e a fuga de milhões de pessoas, afeta também os museus e os sítio arqueológicos, seja como efeito colateral dos combates ou devido às pilhagens.

“O caso de Palmira não foi o único. A destruição do patrimônio cultural ocorreu em toda a Síria, onde tivemos também inúmeras escavações ilegais”, denuncia Mohamad Fakhro, que é igualmente diretor do Departamento de escavação na Direção de antiguidades e museus de Aleppo.

“Há sempre esperança”

Inúmeras instituições governamentais e ONGs lançaram iniciativas para proteger os sítios do patrimônio histórico, registrar as destruições e as pilhagens e para impedir o comercio de objetos roubados no mercado internacional de arte.

Mas pouco é feito para formar os especialistas necessários para o período do pós-guerra. Os museus devem ser reconstruídos ou recriados, os objetos restaurados e os sítios arqueológicos livres das minas e outros traços de guerra.

Cynthia Dunning diz que grandes organizações internacionais como a UNESCO, ICOMOS (Conselho Internacional de Monumentos e Sítios) e ICOM (Conselho Internacional dos Museus) podem utilizar o seu poder para proteger o patrimônio cultural, ressaltando ao mesmo tempo seus limites:

“Os únicos parceiros com os quais eles falam são os governos. Eles não podem falar com outros atores como as forças de oposição. As ONGs é que podem reunir esses diferentes atores.”

Uma solução de futuro? Mohamad Fakhro se mostra realista: “É difícil dizer o que o futuro pode nos trazer. Mas nós devemos dar o melhor de si para preparar a reconstrução e a preservação do patrimônio. Infelizmente, até o presente, a situação é sombria. Mas sem esperança, você não pode trabalhar.”

Qual você reagiu à destruição de tempos antigos no Oriente Médio como Palmira, na Síria? 

Adaptação: Alexander Thoele

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