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Arte Bruta é arrebatada por frenesi do mercado

Josef Bachler/Collection de l'Art Brut Lausanne

A súbita popularidade da arte bruta provocou um frenesi que está mexendo com o mercado de arte contemporânea. Com o aumento da demanda, especialistas e colecionadores questionam se a arte bruta, produzida por indivíduos imunes a remunerações, tem alguma razão para sobreviver.

“Antes de tudo, a arte bruta não é um movimento artístico, com um começo e um fim”, explica Sarah Lombardi, diretora do museu Collection de l’Art Brut, o primeiro de seu tipo e o maior do mundo.

O museu de Lausanne foi criado em 1976 com base na coleção do pintor francês Jean Dubuffet, que cunhou o termo art brut (arte bruta) para definir “uma operação artística completamente pura, crua, reinventada em todas as suas fases por seu autor, baseada unicamente em seus próprios impulsos”.

“O que é novo é que a arte bruta não está mais confinada às sombras do mundo artístico”, disse Lombardi, admitindo com um sorriso que Jean Dubuffet não tinha previsto a tendência atual.

Inúmeros locais de prestígio, incluindo a Bienal de Veneza 2013, organizaram recentemente eventos em torno da arte bruta. Mas a novidade é um novo foco que não destaca a excentricidade, mas a criatividade da arte bruta, também conhecida como marginal, que vem eliminando as fronteiras com a arte convencional.

A expressão arte bruta (em francês Art brut) foi concebida por Dubuffet, em 1945, para designar a arte produzida por criadores livres de qualquer influência de estilos oficiais, incluindo as diversas vanguardas, ou das imposições do mercado de arte.

Dubuffet via nesses criadores – oriundos de fora do meio artístico, a exemplo dos internos em hospitais psiquiátricos – a forma pura e inicial de arte. O suíço Adolf Wölfli (1864-1930), que viveu em um asilo de alienados desde 1895 até sua morte, é apontado por Dubuffet como autor símbolo da arte bruta.

O interesse de Dubuffet foi dirigido especialmente para a arte realizada por pacientes de hospitais psiquiátricos.

Enquanto o termo de Dubuffet é bastante específico, o termo arte marginal foi estendido aos artistas autodidatas ou ingênuos, que nunca tenham sido submetidos a nenhum tipo de internação psiquiátrica.

O artista marginal que desenvolve o seu trabalho criativo, sem qualquer contato com tradicionais instituições de arte, responde a uma forte motivação intrínseca e muitas vezes utiliza materiais e técnicas inéditas e improváveis. Grande parte da arte marginal reflete estados mentais extremos, idiossincrasias individuais ou mundos de fantasia.

“Dubuffet achava que a arte bruta iria derrubar os museus tradicionais, agindo como um contrapoder, mas, na verdade, ocorreu o oposto: a arte bruta está sendo engolida pelo mundo da arte, inclusive pelo mercado de arte contemporânea”, disse Lombardi.

A diretora cita as feiras de arte marginal que acontecem agora ao lado das grandes feiras comerciais, como a FIAC em Paris e as edições do Frieze de Londres e de Nova York.

Em Zurique, o recém-inaugurado Musée Visionnaire, o desdobramento de uma antiga galeria comercial, tem como objetivo mostrar a arte bruta no contexto das formas de arte relacionadas, tais como arte urbana e de rua.

Forças de mercado externas

O paradoxo, ressaltado por Lombardi, é que os artistas de arte bruta nunca trabalham em busca de reconhecimento ou de dinheiro e não podem, portanto, responder às expectativas do mercado. Acervos inteiros são muitas vezes descobertos só depois da morte dos autores.

O papel dos especialistas seria ressaltar essa realidade. “Esse é o nosso motor”, diz a diretora.

A Bienal lançada recentemente por Lombardi (veja a galeria) é precisamente um lembrete do papel da coleção de Lausanne, bem como uma forma de revelar a extraordinária riqueza de um acervo que já contém 60 mil peças, além das 5 mil doadas originalmente por Dubuffet.

Lombardi reconhece que o museu não pode trabalhar fora do mercado de arte, “mas preferimos estar à frente dele quando possível”.

Questionada sobre o porquê desse súbito reconhecimento, Sarah Lombardi responde: “a arte bruta tem uma dimensão espiritual que a arte contemporânea muitas vezes não tem”.

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Veículos são atração em coleção de Arte Bruta

Este conteúdo foi publicado em “Museus e galerias dedicados à arte bruta estão surgindo em toda parte”, diz a diretora Sarah Lombardi. “É nosso dever continuar sendo um ponto de referência internacional, reafirmando a identidade do museu e apresentando as obras cuidadosamente montadas de nosso enorme acervo.” Criado em 1976 por Jean Dubuffet, que cunhou o termo e começou a…

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Paredes escuras

Apesar dos museus de arte bruta espalhados pelo mundo tenderem a permanecer fora da arte convencional, as galerias estão fazendo de tudo para integrar esse tipo de produção em suas vendas.

Nos últimos 25 anos, a galeria  de Susanne Zander, em Colônia, na Alemanha, procura revelar talentos da arte bruta, que ela acredita que deve ser apreciada ao lado da arte contemporânea.

Zander prefere tomar emprestado o termo “conceptual outsiders”, usado pela crítica de arte do jornal New York Times, Roberta Smith, para descrever as monomanias conceituais dos artistas que trabalham obsessivamente em meios simples, criando todo um universo com sua arte.

Para a galerista, a arte marginal estaria ganhando terreno em resposta à virtualização do mundo. “Em uma era digital, as pessoas estão à procura de raízes, de autenticidade”, disse, acrescentando que ela passa mais da metade do seu tempo à procura de novos artistas conceituais.

Na opinião de Zander, não houve uma mudança significativa no mercado de arte, os colecionadores ainda seriam os mesmos de antes, no entanto, ela observa que o público está muito mais interessado pela arte bruta.

Susanne insiste que os artistas marginais não deveriam ser tratados de forma diferente: “isso não tem nada a ver com paredes escuras”, disse.

Courtesy Delmes & Zander

Tudo para todos

“Jean Dubuffet era brilhante, mas um pouco pretencioso e até fascista”, alega, por sua vez, James Brett, produtor de cinema na Inglaterra. Brett transformou sua paixão pela arte marginal (um termo que ele evita) em uma aventura que agora domina sua vida.

Brett criou em 2009 o Museu de Tudo (The Museum for Everything) para destacar “os artistas sem formação, sem intenção, desconhecidos e inclassificáveis dos tempos modernos”.

Seu museu nômade foi apresentado sucessivamente em Londres, Turim, Paris, Moscou e Veneza, atraindo um público totalmente novo para a arte que ele defende.

James Brett está convencido de que o aumento do consumo de arte moderna e contemporânea ajudou a empurrar sua iniciativa. “As pessoas precisam se reconectar com a criatividade”, disse.

Generalização

Sarah Lombardi ressalta que com a notoriedade o termo arte bruta passou a ser usado de forma abusiva. Para a especialista, há um equívoco comum, inclusive entre galerias e marchands de arte, que consideram que qualquer arte produzida por indivíduos marginais se enquadraria nessa categoria, o que, de acordo com Lombardi, estaria muito longe da verdade.

A diretora do museu insiste que só que pode ser considerado arte bruta o conjunto de obras que reflete um sistema forte e complexo de representação, mesmo assim ainda é preciso haver talento.

Para Sarah Lombardi, não há mais talento ou criatividade entre os indivíduos marginais do que há em qualquer população em geral. O impacto emocional de uma obra de arte, o jeito que ela emociona o espectador, continua sendo o principal critério para a especialista.

“Ninguém se torna especialista em arte bruta da noite para o dia”, adverte Lombardi.

Adaptação: Fernando Hirschy

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