Cinema: Irã leva prêmio principal em Fribourg
Be Ahestegi, de Maziar Miri, foi contemplado com o Olhar de Ouro no Festival de Filmes de Friburgo. Esta e outras recompensas consagram a boa fase do cinema asiático, com destaque para o Irã e as Filipinas.
O Brasil – que concorreu nas categorias ficção e documentário – nada leva…
O Festival Internacional de Filmes de Friburgo (FIFF) – voltado para as cinematografias dos países emergentes, praticamente ignoradas pelos grandes circuitos de distribuição – contemplou o filme iraniano Be Ahestegi (algo como “devagarinho” ou “gradualmente”) com o Regard d’Or, a recompensa máxima desse festival suíço que encerrou no domingo, 19 de março, sua 20a. edição.
A mesma obra foi premiada pelo júri FIPRESCI (a federação internacional da imprensa cinematográfica).
No filme, o quadragenário Maziar Miri – ele nasceu em 1972 – conta o drama vivido por um casal: a mulher desaparece oito dias e, quando volta ao lar, seu destino depende inteiramente do marido.
Em função dos tabus da sociedade iraniana, o marido tem, de fato, direito de, impunemente, até matá-la, o que revela o grau de opressão exercida sobre a mulher naquele país.
Este aspecto parece ter sensibilizado o júri internacional, integrado por 5 personalidades, inclusive Paloma Rocha.
Para filha de Glauber, “houve uma unanimidade do júri quanto à mise-en-scène e às qualidades técnicas da obra”. E lembra que “o filme retrata artisticamente a realidade político-social iraniana: seus tabus, suas dificuldades”…
Não descarta também que esteja embutida na decisão uma escolha política diante de um quadro geo-estratégico atual.
Mas se a escolha dependesse só dela, gostaria de ter optado pelo filme Heremias, do filipino Lav Diaz, realizador descrito como “um dos mais intransigentes e inovadores de seu país”.
Heremias é a última peça de uma trilogia, com duração assustadora de 8 horas! (Mesmo assim, ainda perde, em tamanho, para outra obra filipina: Ebolusyon ng isang Pamilyang Pilipino, lit. “Evolução de uma Família Filipina” que dura 10h40min).
Filmado num período de 9 anos, este longa (que faz realmente jus ao termo) narra a história de camponeses envolvidos em tramóias políticas no período do ditador Marcos.
“Um cinema sem compromisso
Paloma Rocha gostaria que Heremias tivesse pelo menos recebido uma menção, porque “o filme recomeça uma história cinematográfica para a cultura filipina”. E ela defende a liberdade de existência desse tipo de cinema: “Também as pessoas têm tamanhos e formas diferentes e têm liberdade de existir”, argumenta.
E conclui realçando que o filme expressa “um cinema sem compromisso com as formas convencionais do momento: duas horas de duração, narrativa x, enquadramento y”.
Um senão na hora de decidir é que o filme filipino estava inacabado.
Lav Dias deve, então, se contentar com o Prêmio Especial do Júri que elogia “a pesquisa pelo realizador de uma linguagem cinematográfica radical e anti-convencional, no sentido de salvaguardar uma cultura nacional original”.
Resta que a premiação do FIFF consagra a boa fase do cinema asiático. Sinal de que esse cinema está com tudo, dos documentários em competição, ganharam Taimagura Baachan (lit. vovó de Taimagura) de Yohihiko Sumikawa (Japão) e Doust (lit. O Amigo), realizado pela iraniana, radicada na França, Sara Rustegar.
Para as demais recompensas veja site do FIFF (ao lado)
Presença do cinema brasileiro
Com isso, os cineastas brasileiros que participaram na competição saíram de mão abanando.
O interessante documentário de Joel Pizzini, 500 Almas e o filme de José Araújo, As Tentações do Irmão Sebastião que competia na categoria ficção nada levaram.
Mas o Festival Internacional de Filmes de Friburgo constituiu-se este ano numa excelente vitrine para a cinematografia brasileira. Filmes do final da década de 50 para cá – cerca de vinte e cinco obras – foram apresentadas numa retrospectiva.
Mesmo abrindo maior espaço para Rogério Sganzerla, possibilitou ao público interessado e especialmente aos especialistas conhecer algumas obras marcantes que já fazem parte da história do cinema brasileiro.
Através da retrospectiva e da seleção de obras recentes, o FIFF vem cumprindo seu objetivo: trazer à Europa o que considera o melhor da produção cinematográfica dos países emergentes, tornando-se uma vitrine dos países do Sul.
Assim fazendo tem conseguido com sucesso aproximar culturas diferentes.
Distribuição na Suíça
Já é uma tradição no Festival de Friburgo: todos os anos, TRIGON-FILM – empresa suíça especializada na distribuição de filmes que não conseguem penetrar no mercado – escolhe 4 filmes – este ano foram cinco – entre os selecionados pelo FIFF e os difunde na Suíça.
As obras escolhidas, comercializadas no ano seguinte, são denominadas Filmes do Sul, ou seja, “países do Sul”, a etiqueta que se colou aos países em desenvolvimento ou emergentes.
Uma novidade introduzida nesta 20a. edição do Festival de Friburgo vai facilitar esse trabalho de Trigon: todos os filmes que entraram na categoria de competição estavam legendados em alemão (além de francês).
É uma decisão bem acolhida pela empresa que pode, então, prescindir de um trabalho indispensável para quem deseja difundir filmes num país em que cerca de 70% da população é de língua alemã.
O aporte do Festival
Note-se que, como Friburgo fica na Romandia (região da Suíça de língua francesa), os filmes hors-concours são projetados no idioma do país de origem, com legendas apenas em francês.
Acontece mesmo que para certos filmes se organize tradução simultânea em francês.
Mas com as aparentes pretensões do Festival de tornar-se um evento realmente nacional, as coisas podem mudar.
Vê-se, portanto, que o Festival Internacional de Friburgo vem trazendo à Suíça um cinema diferente. “O Festival aporta filmes independentes, não comerciais, não europeus”, diz o presidente do FIFF, Jean-François Giovannini.
E com bons resultados, realça: “Em Berna há um cinema que só projeta filmes de outras partes do mundo e ele funciona. Nós criamos um público para esse tipo de cinema; tornamos conhecido esse cinema na Suíça”.
swissinfo, J.Gabriel Barbosa, de Friburgo
Realizado de 12 a 19 de março, o Festival de Filmes de Friburgo projetou uma centena de obras. Nas competições prevaleceram filmes da Ásia, o que representa a força do cinema no continente.
Uma retrospectiva sobre cinema brasileiro, do fim dos anos 50 para cá, trouxe algumas obras primas da cinematografia brasileira, como Terra em Transe e várias realizações de Rogério Sganzerla.
Dois diretores brasileiros disputaram prêmios: Joel Pizzini e José Araújo.
O 21° FIFF vai de 18 a 25 de março de 2007.
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