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Paulistano, filho de mãe-de-santo e de professor de medicina, o percussionista Fabio Freire diz que está muito bem na Suíça.
Ele afirma que é preciso seguir sua linha, seu rumo, e trabalhar, trabalhar e trabalhar… e está feliz da vida ao ver seu trabalho reconhecido no Brasil.
“O interesse pela música popular brasileira cresce mais e mais na Europa justamente porque não é moda.” A opinião é de Fabio Freire, da primeira geração de percussionistas brasileiros que lê e esvreve música, compõe, faz arranjos e canta.
“Na minha casa, música sempre foi uma coisa natural”, conta Fabio. O avô tocava clarinete, a avó violino, os tios Eloá e Elcio de Souza eram maestros nos tempos da Rádio Tupi.
No terreiro de dona Deise, mãe-de-santo e atleta da seleção brasileira, Fabio diz que já nasceu tocando atabaque. Começou a estudar violão e aos 8 anos lia acordes.
Música e faculdade
Mas os filhos de dona Deise e de seu Edgard – outro atleta da seleção brasileira e professor da Escola Paulista de Medicina – tinham que estudar outra coisa além de música.
Fabio se aplicou nos estudos mas ainda arranjou tempo para ganhar três vezes o festival de música do Objetivo, em São Paulo. Numa delas, foi aconselhado pelos jurados Zuna Homem de Mello, Rogério Duprat e Milton Banana.
Passou então a dividir a vida entre a Faculdade de Economia da Puc e o funk do grupo Placa Luminosa, que tocava muito em bailes e acompanhava grandes nomes da MPB, como Tim Maia, Cesar Camargo Mariano e o trombonista Raul de Souza.
Com Ney Matogrosso, fizeram a abertura do primeiro Rock in Rio, em 1985.
“Ao tocar com esses grandes nomes, resolvi estudar música porque senti a necessidade”, lembra Fabio Freire. A música foi tomando cada vez mais espaço em sua vida. O percussionista decidiu largar a faculdade seis meses antes de se formar e foi estudar com Roberto Sion e Nelson Aires.
“Foi difícil parar os estudos mas já ganhava uma boa grana, aparecia na televisão e tal e aí acho que foi mais fácil para a família aceitar”.
Espanha e Suíça
Em 1986, Fabio Freire daria outro passo importante para a carreira. Não queria voltar a tocar em bailes mas continuar aprendendo. Juntou então os instrumentos e zarpou para Madri. “Recomecei do zero, tocando em estação do metrô”.
Nos contatos com outros músicos, disseram a Fabio que os países mais frios da Europa eram mais receptivos à percussão. Lembrou-se então de um amigo na Suíça e veio visitá-lo. Estava tocando na rua, em Basiléia, quando foi abordado por duas pessoas ligadas ao movimento musical da cidade. Resultado: o percussionista está até hoje em Basiléia, noroeste da Suíça.
“Faz 15 anos que faço meu trabalho e só toco com quem gosto”, afirma. Esse trabalho inclui composição, arranjo, shows, gravação e ateliês de iniciação musical em escolas.
Manter contatos
Fabio Freire acredita que é preciso seguir uma linha, um rumo, e trabalhar muito. Mas reconhece que “aqui as pessoas têm respeito pelo seu trabalho e você tem tempo de parar para analisar; aqui, eu também aprendi a me organizar”.
Isso não significa isolamento e Fábio enfatiza que mantém contados com músicos brasileiros e suíços, entre outros com Célio Borges, Yamandu Costa, Mathieu Michel, Claudio Hugo, Ademir Cândido, Rodrigo Botter Maio e Dudu Penz.
Entre os trabalhos mais interessantes dos últimos anos está o CD Limmazonas, um duo de percussão, piano e vocal com o pianista suíço Christoph Stiefel, publicado em 2000. O título é uma contração de “Limmat” (um rio de Zurique) com Amazonas. Ambos fizeram vários shows em São Paulo com essse repertório do qual são autores.
Encruzilhada
A música de Fabio Freire está cada vez mais elaborada e lapidada. É o caso de First Intuition (2004), com o Quarteto Ignis (contrabaixo, saxofone, violino e trompete), em que algumas faixas estão muito próximas de uma espécie de música de câmara moderna.
“Quando compunha para este disco, me lembrei muito do Zé Gomes (violinista e rabequista) que me estimulou muito a escrever música”, afirma Fábio.
Sete das oito faixas foram compostas e arranjadas por Fábio (a exceção é “Ponteio”, de Edu Lobo). “A loucura continua a mesma, mas escrita; aqui a gente tem a possibilidade de escrever a loucura”, explica o percussionista, que considera First Intuition como uma “encruzilhada” em sua carreira.
Reconhecimento no Brasil
O Intuition, com o Quarteto Ignis (Susanna Andres violino, Stefan Hulliger violino, Ueli Angtmann sax, Martin Hess baixo, Matthieu Michel trumpet & flughorn) acaba de ser pré-selecionado pelo programa Rumos 2004-2005, do Itaú Cultural, para participar de um CD de MP-3 que será divulgado no Brasil e no exterior.
“Estou muito feliz com esse reconhecimento. É a prova de que a música é universal. Um compositor brasileiro, interpretado por músicos suíços que nunca estiveram no Brasil … é motivo de muita alegria para mim”, afirma Fábio, com o grande sorriso que traz sempre estampado no rosto.
A originalidade talvez esteja no fato da música de Freire vir primeiro do ritmo e não da melodia ou da harmonia. “Pra mim, o ritmo é o rei mas o rei que abre todas as portas”, explica.
Fabio diz que, depois desse anos todos, ele também vê o Brasil de uma maneira diferente. “Tenho a impressão que aqui as pessoas sentem o Brasil como um lugar de esperança e de alegria e que isso é refletido na nossa música. E a boa MPB só tende a crescer justamente porque não é moda”.
swissinfo, Claudinê Gonçalves
Discografia:
– “Dança do Caboclo” (1995) – Fabio Freire e Carioca
– “Trio” (1999) – Fabio Freire, Célio Barros e Thomas Rohrer
– “Limmazonas” (2000) – Fabio Freire e Chistoph
– “Intuition” (2004) – Fabio Freire e Quarteto Ignis
– Tilha sonora em “Saudade do Futuro”, com Thomas Roher.
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