Jason Beechey quer mudar ensino de dança
O Departamento de Dança da Universidade de Artes de Zurique (ZHdK) tem um novo diretor. Jason Beechey pretende readequar a forma como o balé é ensinado e incentivar jovens bailarinas e bailarinos a se manifestarem – tendo em vista os vários casos de suposto assédio em escolas suíças de balé.
Três grandes escândalos de assédio abalaram o ensino do balé na Suíça nos últimos anos, ocasionando mudanças na forma como a disciplina é ensinada. Em 2021, a prestigiada Escola de Balé Rudra Béjart fechou suas portas. No último ano, a Escola de Balé e Teatro da Basileia cessou seu Diploma Federal de Educação e Treinamento Vocacional e a equipe de gestão da Academia de Dança de Zurique (TaZ) foi forçada a renunciar.
Jason Beechey é o novo diretor de Dança da Universidade de Artes de Zurique (ZHdK) e está assumindo a responsabilidade pelo programa de dança da TaZ. Ele também participa, há 15 anos, do Prix de Lausanne, uma competição internacional de balé – tanto como membro do comitê artístico quanto como comentarista de live streaming. O Prix, que oferece oportunidades de educação adicional para jovens bailarinos de 15 a 18 anos, aconteceu até 4 de fevereiro.
SWI swissinfo.ch conversou com Jason Beechey acerca de sua visão sobre o ensino do balé na Suíça, seus desafios e oportunidades para jovens bailarinas e bailarinos.
Biografia
Nascido em Vancouver, é solista do London City Ballet e do Charleroi/Danses na Bélgica. Desde 2009, é membro do comitê artístico do Prix de Lausanne e comentarista de live streaming desde 2015. É membro do júri do Youth America Grand Prix e reitor da Universidade Palucca de Dança de Dresden, na Alemanha, onde supervisiona a formação de jovens dançarinos do balé clássico à dança contemporânea. Em 2023, foi membro da equipe interina de gestão da Academia de Dança de Zurique. Foi designado para assumir o cargo de diretor de dança da Universidade das Artes de Zurique (ZHdK) a partir de 1º de janeiro de 2024.
swissinfo.ch: Ao contrário de outros países, como a França, o Reino Unido e a Rússia, que reconhecem há décadas a dança como uma carreira, a Suíça desenvolveu há pouco suas próprias qualificações e diplomas nacionais para profissionalizar essa área. O que você acha desses esforços?
Jason Beechey: A Suíça só criou recentemente o Diploma Federal de Educação e Treinamento Vocacional. Acho que esse é um bom sinal. Há também cada vez mais programas de bacharelado ofertados em Zurique. Hoje há uma grande variedade de cursos de dança, como dança urbana contemporânea ou balé clássico. Acho que a dança está se desenvolvendo, crescendo e se tornando mais reconhecida.
swissinfo.ch: Quais são os desafios recentes enfrentados por jovens bailarinas e bailarinos?
Beechey: É muito bonito ver bailarinos jovens, apaixonados e motivados. É uma carreira que pode trazer muita beleza e amor. À medida que os bailarinos se desenvolvem e crescem, vão surgindo desafios, como mais lesões ou a manutenção de uma boa coordenação física. Outros desafios incluem a perda de motivação. A conscientização sobre a saúde mental e o bem-estar também são essenciais. Muitos estudantes beiram o perfeccionismo e podem ser muito críticos consigo mesmos.
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Bailarina suíça concorre ao Prix de Lausanne
O ensino da dança exige muita dedicação e muito apoio da família, pois pode ser uma carreira difícil e de curta duração. Para estudantes mais jovens, adaptar-se, aos 11 anos de idade, a ficar longe da família e a um outro idioma, a uma cultura e a uma alimentação diferentes, pode ser um desafio, embora isso possa trazer também muitas oportunidades.
A dança exige muita dedicação e um trabalho árduo desde muito cedo. Espera-se que a TaZ possa criar uma atmosfera, na qual jovens bailarinos e bailarinas se sintam apoiados para atingir o máximo de seu potencial.
swissinfo.ch: Como jovens bailarinas e bailarinos podem superar esses obstáculos?
Beechey: Como professores e profissionais, podemos ajudar os jovens bailarinos a superar esses obstáculos, estando alertas sobre sua própria saúde. É preciso se alimentar bem. Podemos trabalhar juntos como equipe e não enfatizar comentários negativos do tipo: “você é ruim e não é bom o suficiente”. Podemos apoiar e desafiar uns aos outros. É importante que os bailarinos digam quando sentem dor. A medicina da dança está passando por muitas mudanças.
A dança é uma paixão, não se trata de ser o melhor. Competir no Ballet de Lausanne, por exemplo, é competir consigo mesmo: O que aprendi? Como cresci? Como melhorei? É uma mentalidade. Espero que os pais deixem seus filhos e suas filhas se desenvolverem e perceberem por si próprios que têm talento.
swissinfo.ch: O assédio, bem como o abuso sexual e o estresse mental, são problemas comuns na dança. Como você está abordando essas questões em seu novo trabalho?
Beechey: As coisas estão mudando. A pandemia nos ajudou a ser uma comunidade mais unida. Agora temos uma rede global de especialistas em saúde para apoiar alunos, professores e bailarinos, uma rede que compartilha novos programas e novas ideias. Espero realmente que possamos conscientizar as e os jovens bailarina(o)s a se manifestarem caso sofram abuso ou assédio, ou caso se machuquem. Acho que estamos trabalhando muito mais para educar professores sobre novos métodos de ensino que possam incentivar e apoiar bailarinas e bailarinos.
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O que fazer quando o assédio sexual ocorre com você?
Na Universidade de Zurique, criamos um conselho estudantil e um comitê de pais para conversar e discutir questões. Estamos também fazendo workshops sobre novas maneiras de ensinar de forma construtiva e solidária. Tenho muita sorte de nunca ter tido uma experiência ruim como aluno, mas já ouvi histórias sobre professores que eram muito duros e ouviam choros com frequência. Não acho que precisa ser assim. Você pode manter um ensino de qualidade com alunas e alunos saudáveis e fortes. Vejo as bailarinas e os bailarinos de hoje como mais inclusivos, diversificados, individuais e atléticos. Acho que há uma grande mudança de mentalidade.
swissinfo.ch: Em que sentido?
Beechey: Bailarinas e bailarinos estão se manifestando e dizendo que querem ser tratados com respeito e igualdade. E não aceitam mais abusos de diretores e coreógrafos. Espero que práticas anteriores comuns, como o medo e a intimidação, sejam coisa do passado.
swissinfo.ch: O mundo da dança é também afetado pela globalização e pela digitalização. Como você pretende se adaptar a isso?
Beechey: Acho que a globalização torna a comunicação mais rápida e mais aberta. Quando eu estava na escola, não existia internet. Eu não fazia ideia de como era tudo nas outras escolas, mas hoje há programas de intercâmbio entre escolas de regiões diferentes. A Assemblée Internationale, de Toronto, por exemplo, reúne 28 escolas a cada quatro anos. As escolas não apenas competem, mas também aprendem e compartilham ideias.
É incrível ver bailarinos da Coreia treinando no Canadá e dançando nos Estados Unidos, ou bailarinos estrangeiros como Hannah O’Neill, da Nova Zelândia, ou Bianca Scudamore, da Austrália, dançando na Ópera de Paris. É interessante o fato de as pessoas poderem ir para onde se sentem inspiradas. As escolas estão compartilhando e aprendendo, mas isso não significa que todos vão se transformar no mesmo tipo de bailarino ou bailarina. Por mim, o mundo da dança pode crescer como uma comunidade, pode compartilhar, aprender e celebrar as diferenças.
Edição: Virginie Mangin
Adaptação: Soraia Vilela
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