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Nova Friburgo entra para a história

Caboclo (índio civilizado) perto de Cantagalo, de Jean-Baptiste Debret. Paris, Biblioteca Sta. Genoveva

"Majestade": Entre todos os feitos, que marcarão e distinguirão o reino feliz de Sua Majestade, o deste dia terá lugar especial.

Hoje, inauguramos a cidade de Nova Friburgo e formamos, segundo a lei, o Governo Municipal para os 3 primeiros anos.

E sob sua proteção, todas essas ações respeitáveis, se realizaram. Nova Friburgo, 17 de abril de 1820 Pedro Machado de Miranda Malheiros

Nova Friburgo : lugar salubre ou necrópole?

Nos primeiros meses de existência, Nova Friburgo, ao invés de desfrutar de urna-atmosfera de festa permanente, vive um ambiente de hospital. Os colonos sofrem, caem em depressão, ficam doentes. Em março, o Dr. Bazet se ocupa de 600 enfermos. E a morte ronda. Só em abril foram mais de 40 falecimentos. Miranda quase enlouquece e chama 4 médicos à cidade nova, entre eles o famoso José Feliciano de Castilho. Conclusão dessa célebre pesquisa: “0 lugar de Nova Friburgo é muito sadio “. O futuro confirmará a razão desse diagnóstico. Com a chegada da seca, a mortalidade diminui prodigiosamente : julho (5 mortes), agosto (8),
setembro (6), outubro, novembro e dezembro (O). Mas, só mais tarde, Nova Friburgo conhecerá o desenvolvimento turístico, exaltando a beleza de suas montanhas e a salubridade do seu clima .

Índios visitam os brancos

O cavaleiro de Porcelet, médico de Estavayer-le-Lac, é o primeiro a pisar em Nova Friburgo. Dele há um documento que relata um primeiro encontro com os índios: “Pretendia-se também que esse local estivesse a uma grande distância dos selvagens ; no entanto, há seis semanas, 150 índios apareceram armados de arcos e até de fuzis. Eles não fizeram mal algum, é verdade, mas será que se manterão sempre benignos e prudentes? Eles nos trouxeram macacos, papagaios e peles em troca de machados, facas, tesouras, espelhos e aguardente. Esses indivíduos, inteiramente nus, se lançam com fúria, sobre a carne crua para devorá-la. Utilizam a flecha com destreza notável”. Em 3 de dezembro de 1819, chega ordem do Rio, para que se afastem os índios dos novos brancos.

Entre a vida e a morte

Miranda segue plano audacioso, difícil e contraditório. Quer continuar a construção da cidade e, ao mesmo tempo, alcançar êxito na agricultura. Com esse objetivo, dirige dupla operação: conduz levas de colonos para as terras e mantém equipes encarregadas de realizar as infra-estruturas urbanas e de fazer uma estrada entre os lotes. As equipes trabalham em sistema de rodízio.

A ocupação parcial do campo é complicada pelas pessoas que lutam para sobreviver (enfermos e viúvas) e por quem veio ao Brasil manejar fuzis e arados, e não para pegar no pesado, empunhando o machado do pioneiro. Mas Miranda quer continuar seu sonho, pois a colônia vive uma economia artificial graças às subvenções.

Os colonos criticam a política do Chatô e resmungam contra esses trabalhos fastidiosos que lhes lembram o antigo regime, tão detestado, e lhes impedem ir ao essencial: desbravar as terras. Miranda os escuta e os escravos passam a substituí-los.

A partir de maio, os colonos realizam a mais bela proeza: deixam a cidade e partem para a conquista do campo. Desejam cultivar um pedaço de terra e enriquecer progressivamente, com a venda da sobra da produção.

Em agosto, há muita animação, na zona rural, com o barulho do trabalho, o ruído da derrubada e o cheiro das queimadas nos céus de Morro-queimado. Os suíços plantam milho e feijão. Ocorrem, porém, incidentes. Por exemplo, Benjamin Vollu, do Valais, morre esmagado, pela queda de uma árvore. Apesar disso, os suíços se instalam no campo. Constroem barracas no pedaço de terra que lhes foi atribuído e aprendem a lutar contra animais selvagens como onças e capivaras.

Outubro traz alegria. As lavouras crescem. Os colonos crêem ter encontrado a terra prometida. Ouvem-se gritos de alegria no Novo Mundo.

Novembro traz tempestades, frio e fim das esperanças. As lavouras param de crescer. Desanimados, os colonos deixam o campo para morar, de novo, nas acanhadas casas da cidade.

Afogam seus fracassos no álcool, no jogo e no sexo. Vivem de saudades, sonhando com a doçura do país natal. Choram as próprias ilusões e fazem um amargo balanço dos esforços e sofrimentos inúteis. Analisando a situação in loco, o inglês Mathison fala de fracasso definitivo do plano de colonização. Em setembro de 1821 a última esperança dos colonos é regressar à Suíça. É eventualidade encarada até pelo corajoso P. Joye.

Os colonos passam o segundo Natal no Brasil, em meio ao desespero e a violência, insurgindo-se contra o Chatô, símbolo da opressão, bode expiatório de todas as desgraças. Miranda se demite. Os subsídios acabam. Os colonos enviam missão especial ao Rio. O Rei parte para Portugal. No Brasil inicia-se o processo de independência.

Nova Friburgo fica abandonada ao destino. Em vez de terra prometida, vive como uma Jerusalém maldita. E os colonos se consideram vítimas da cólera divina.

Iniciativas para salvar a colônia

A Suíça pratica ajuda humanitária. Por impulso de Pierre Schmidtmeyer, banqueiro genebrino residente em Londres, que permaneceu muito tempo na colônia e acredita no futuro de Nova Friburgo, cidadãos suíços fundam, no Rio de Janeiro, em 31 de maio de 1821, uma Sociedade Filantrópica. Eles querem combater a miséria e a ajudar os colonos a ganharem o pão de cada dia. Decidem não favorecer o regresso à Suíça, como o faz “La Gazette de Lausanne”, mas continuar a obra de Dom João VI, pois a agricultura é uma das maiores riquezas do país,

Esses filantropos organizam grande campanha financeira no Brasil, na Suíça e em outros países da Europa. No fim de 1821 e no início de 1822, em Friburgo, Solothurn e Lucerna, os padres fazem seus paroquianos chorarem e abrirem suas carteiras, descrevendo, com imagens bíblicas, as desgraças que vivem seus irmãos de Nova Friburgo. Até o Papa participa da coleta dando 3.333 francos.

Em março e em dezembro de 1822, a Sociedade Filantrópica vai à colônia e distribui alimentos, roupas, utensílios e sementes. A luta, quase em vão, pretende resolver um problema urgente : fundar um lar para órfãos. Eles são numerosos, vivem com os colonos ou em casa de brasileiros, onde chegam a ser tratados” como escravos negros”.

Os primeiros inventores do campo

Dom Pedro I decide prosseguir a obra do pai e salvar Nova Friburgo. Nomeia
João Vieira de Carvalho como novo diretor, concede liberdade de estabelecimento, redistribui subsídios e oferece novas terras. A esperança renasce. Colonos permanecem nos seus lotes de terra. Confiantes no know-how helvético, crêem no futuro da “Gruyère do Brasil”. Documentos de 1822 mostram o resultado dessa coragem.

Jacques Vuichard cultiva milho, planta alfafa, aluga um moinho e tem projeto de uma serraria. No lote número 17, Jean-Maríe Péclat constrói uma grande casa de madeira e cultiva, com sucesso, todas as gramíneas da Europa. A família Jean Vial possui grandes pastos com um belo gado. Os Rime criam 20 vacas, fabricam queijo e plantam uva. Os arquivos testemunham também a vitalidade dos Anklin, Overney, Cortat, Miserez e outros.

Os colonos ganharam a primeira batalha: a do pão de cada dia. A Sra. Rémy conta, com satisfação, ter recuperado uma economia de subsistência. “Temos todos os terrenos suficientes. Plantamos e replantamos o ano inteiro. Estamos em pleno inverno, mas nossos jardins estão estupendos, roseiras e laranjeiras florescem”.

Mas há consciência de que será difícil a luta para viverem melhor. Não podem vender os excedentes da produção por falta de comunicações e transações comerciais, como diz o colono Moser a Georg-Heinrich von Langsdorf, em visita a Nova Friburgo em novembro de 1822. É quando recruta colonos para sua colônia Mandioca. Esses pioneiros plantam e inventam o campo de Nova Friburgo.

Mgr Miranda deposita esperanças nos alemães

Nesse meio tempo, o Império do Brasil recruta na Alemanha milhares de soldados e colonos, financiando a operação com a venda de diamantes.

Miranda reaparece em cena, sempre com o sonho de realizar em Morro-queimado uma pequena Roma ou uma pequena Cartago. Ele convence Dom Pedro a enviar um contingente de novos emigrantes para insuflar vida a sua cidade deteriorada. Em 3 de maio de 1824, 342 alemães chegam a Nova Friburgo. Entre eles, o pastor Frederic Oswald Sauerbronn. Os alemães ocupam as casas e os lotes numerados que os suíços abandonaram. E recebem subsídios. Miranda renova o castelo e reconstrói casas em ruínas. Depois de alguns incidentes entre o pároco e o pastor, reina a tolerância entre católicos e protestantes. Suíços e alemães ajudam-se, mutuamente. Sinal de bom entendimento : Jean Erthal casa-se com Catherine Wermellinger, filha de Xavier.

Em 1826, Mgr. Miranda elogia o crescimento demográfico da colônia e acha que seu sonho vai se realizar. Mas se engana, porque a cidade de Nova Friburgo vive sempre uma economia artificial. E os alemães passam pela mesma experiência que os suíços. Alguns se agarram às suas terras e outros partem.

Quando e como Nova Friburgo vai finalmente se desenvolver?
Para responder a essa indagação é preciso contar uma prodigiosa página da história que os suíços escreveram no Eldorado encontrado longe de Nova Friburgo.

10 de maio de 1820: colonos começam a desmatar.

Dezembro de 1820: demissão de Mons. Miranda.

Fevereiro de 1821 : colonos enviam missão especial à corte do Rio de Janeiro.

Março de 1821 : suspensão dos subsídios.

26 de abril de 1821: a Família Real embarca para a Europa.

31 de maio de 1821 : fundação da Sociedade Filantrópica Suíça, no Rio de Janeiro.

29 de agosto de 1821 : Dom Pedro I adota medidas para salvar a colônia.

10 de novembro de 1821 : o Diretor da colônia distribui terras na região de Macahé.

03 de maio de 1824: chega contingente de 342 alemães.

1831: com o fim do regime colonial, Nova Friburgo adquire independência administrativa.

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