O paraíso do esgrafito à beira da Via Engiadina
A Via Engiadina oferece uma vista panorâmica da Engadina Baixa, região alpina do extremo leste da Suíça, na fronteira com a Áustria. E muito mais do que isto.
A trilha passa por históricos povoados alpinos que são verdadeiros cartões postais, considerados modelos na decoração das casas com a tradicional arte do esgrafito. Guarda é um deles.
O cantão dos Grisões (leste) é o maior e menos povoado da Suíça. Sua paisagem é dominada por montanhas e vales. Um deles é o da Engadina Baixa (em reto romano, Engiadina Bassa).
Uma vista panorâmica da região é oferecida pela Via Engiadina, uma trilha de cerca de 50 quilômetros entre Zernez, porta de entrada do único Parque Nacional Suíço, e Vinadi, na fronteira com a Áustria. Devido às grandes diferenças de altitude, é um programa para dez dias de caminhadas (veja o mapa na coluna à direita).
O trajeto entre Susch e o balneário termal alpino de Scuol, de aproximadamente dez quilômetros, pode ser percorrido também no inverno. O repórter de swissinfo.ch caminhou quatro horas sobre a neve entre Guarda e Scuol (veja a galeria de fotos na coluna à direita) .
Guarda tem apenas cerca de 70 casas, quase todas decoradas. Situada a 1650 metros de altitude, é um ponto de partida ideal para o montanhismo e o alpinismo. Por ser uma espécie de “Meca do esgrafito”, o povoado atrai mais de cem mil turistas por ano.
“Museu do esgrafito ao ar livre”
O esgrafito (do termo italiano sgraffiare, riscar) é uma espécie de pintura ou desenho em que se calca um estilete na camada exterior da tinta para fazer com que a camada inferior fique descoberta.
É um tipo especial de decoração de parede que foi muito usado durante o Renascimento (séculos 13 a 15) na Itália. Foram arquitetos italianos que trouxeram essa arte para a Suíça no século 16.
Depois da Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), que destruiu quase todos os povoados, o esgrafito teve seu auge nos Grisões entre meados do século 17 e meados do século 18.
As típicas construções da Engadina, com suas fachadas ornamentadas com esgrafito, são encontradas em muitos povoados dos Grisões, mas Guarda, com 180 habitantes, ganhou importância nacional por causa dessa arte (veja galeria de fotos na coluna à direita).
Trata-se de uma espécie de “museu do esgrafito ao ar livre”. Suas casas, construídas no século 17, foram restauradas e estão bem preservadas. Em 1975, Guarda ganhou o Prix Henri Louis Wakker, principal prêmio suíço de preservação do patrimônio arquitetônico.
Uma de suas casas inspirou o pintor Alois Carigiet (1902-1985) ao ilustrar um dos livros infantis mais famosos da Suíça, o Schellenursli (Uorsin, em reto romano), escrito por Selina Schönz (1910-2000).
“Fazer algo bonito e duradouro”
Em Susch, a 9 km de Guarda, o pintor Josef Neuhäusler oferece cursos de esgrafito em cooperação com a Engadin Scuol Turismo. Ele recebe anualmente cerca de mil visitantes da Suíça, mas também da Alemanha, Itália, Áustria e Holanda em seu ateliê – em torno de 350 frequentam os cursos.
Neuhäusler, de 49 anos, é o mais jovem dos três mestres em esgrafito ativos na Engadina. Junto com o pai, ele já decorou mais de 30 casas da região, principalmente em Susch, Lavin e Guarda, ao longo da Via Engiadina.
“Há milhares de casas com esgrafito nos Grisões, mas a demanda vem diminuindo. Decoro no máximo uma casa por ano. É um trabalho muito caro. O enfeite de uma fachada inteira pode demorar meses, a maior parte para a preparação”, explica à swissinfo.ch.
Segundo Neuhäusler, “uma boa decoração de casa é uma joia, uma obra de arte que pode durar séculos. Fazer algo bonito e duradouro é uma alegria para mim e dá sentido à minha vida”.
Mais do que decoração
Na opinião do professor Oskar Emmenegger, mestre em restauração em Zizers, nos Grisões, “o esgrafito é mais do que uma simples decoração ou arte popular. Ele mostra como a pintura de parede e a arquitetura se influenciam. Desde o século passado, também é usado como técnica de pintura por artistas famosos”.
Os ornamentos muitas vezes têm formas abstratas, mas seu sentido é profundo. Uma forma frequentemente encontrada na Engadina é a faixa dupla ondulada, popularmente chamada “cachorro correndo”, que simboliza o ciclo da vida.
O sentido profundo do esgrafito é manifestado também em frases quase filosóficas gravadas nas fachadas de algumas casas. Na saída de Guarda em direção a Scuol, lê-se na parede de uma casa relativamente nova: “De todos os que passam: quem és tu?”. Boa pergunta para refletir durante a caminhada.
Geraldo Hoffmann, swissinfo.ch
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