Sainte-Croix: o vilarejo suíço que mantém viva a tradição dos autômatos
Você se lembra de já ter visto esculturas mecânicas que se movem sozinhas, talvez com figuras humanas que parecem ganhar vida? Se a resposta foi sim, você provavelmente se lembrou de ter visto um autômato – mesmo que não o conheça por este nome.
A nova exposição na Maison de la Mécanique d’Art (Casa da Arte Mecânica) em Genebra homenageia estas “maquetes” que criam magia através de truques mecânicos. Dezenas de autômatos e caixas de música impressionantes construídas por artesãos e artistas do vilarejo de Sainte-Croix estão reunidas até o dia 17 de novembro, celebrando os anos de trabalho em mecânica relojoeira da Suíça.
No oeste do país alpino, no cantão de Vaud, Sainte-Croix é às vezes chamada de “Vale do Silício dos autômatos”, em referência à tradição regional de construir as figuras que se movem sozinhas. A pequena vila tem uma longa história de arte mecânica e é um tesouro de artesanato antigo, preservando os segredos de seus mecanismos automáticos.
“Este ofício remonta a vários séculos atrás”, diz Denis Flageollet, mestre relojoeiro e fundador da marca De Béthune, que trabalha em Sainte-Croix. “A abundância de minério e madeira, além do tempo livre dos fazendeiros no inverno, permitiram o desenvolvimento deste intrincado ofício. Os relojoeiros de Genebra confiaram a eles a criação de peças raras e mágicas, como autômatos e caixas de música”, diz ele.
O legado iluminado dos autômatos
Os autômatos ganharam reconhecimento durante o Iluminismo na Europa. Voltaire, por exemplo, disse que Jacques de Vaucanson, o inventor francês dos autômatos, era um “rival de Prometeu”. No século XIX, os criadores das minuciosas figuras automatizadas eram vistos às vezes como feiticeiros, às vezes como mestres das artes. Suas obras inspiraram a literatura, como o pássaro mecânico no conto de fadas de Hans Christian Andersen, O Rouxinol, ou a boneca Olímpia em O Sandman, de ETA Hoffmann.
Algumas dessas criações estão preservadas em coleções notáveis, como os autômatos da família Jaquet-Droz disponíveis no Link externoMusée d’art et d’histoire de NeuchâtelLink externo. As obras-primas “The Draftsman”, “The Musician” e “The Writer” continuam a fascinar o público com seus mecanismos intrincados.
O artesanato renascendo
“Quando visitantes jovens vêm à exposição, eles geralmente ficam surpresos, pensando que autômatos são relíquias do passado”, diz François Junod, um renomado artista de autômatos de Sainte-Croix. Ele conta que sua profissão já esteve à beira da extinção, mas que agora vê um ressurgimento. “As pessoas estão redescobrindo a magia da habilidade e da emoção”, diz ele.
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O talento de Junod desempenhou um papel significativo nesse renascimento. Em 2010, ele foi contratado para criar um autômato do poeta russo Alexander Pushkin – um androide capaz de escrever, desenhar e expressar emoções.
Com uma equipe de oito pessoas, Junod segue criando essas “máquinas divinas”, agora procuradas por colecionadores e marcas de luxo. Ele colaborou com a marca francesa Van Cleef & Arpels por muitos anos, criando peças como a Fée Ondine em 2017 e a Fontaine aux Oiseaux, que venceu o Grande Prêmio de Relojoaria de Genebra em 2020. A Van Cleef & Arpels está até abrindo uma oficina em Sainte-Croix para expandir sua coleção de “Objetos Extraordinários”.
Mais do que mecânica: dar vida aos movimentos
“Nós criamos objetos extraordinários. Não é só mecânica – é mágica, performance e um enigma,” diz Junod.
Seus autômatos estão “vivos”? “Sim, eles vivem e contam histórias. Os clientes me passam o roteiro, mas nós que construímos os atores”, ele diz.
Sainte-Croix está trabalhando para preservar sua marca como uma vila de autômatos. “A Associação Mec-Art foi criada para proteger os artesãos e sua expertise”, diz o diretor, Pierre Fellay. A Mec-Art oferece workshops para estudantes e profissionais aprenderem o ofício da maneira tradicional sob a orientação de um mestre.
Embora não seja mais um centro europeu de produção mecânica, Sainte-Croix continua sendo um paraíso para artesãos dedicados à rara e cativante arte dos autômatos.
A exposição “Maravilhas Mecânicas”, que acontece até 17 de novembro em Genebra, apresenta autômatos projetados pela Mec-Art em colaboração com alunos da École Cantonale d’Art de Lausanne (ECAL).
“A ideia é mostrar os fundamentos básicos, o ABC dos movimentos antropomórficos movidos por mecanismos”, diz Pierre Fellay, diretor da associação Mec-Art. “São máquinas projetadas para interagir com o espectador, que pode dar corda e tocá-las, o que é impossível com as peças em exposição nas vitrines dos museus.”
“Maravilhas Mecânicas” oferece uma rara oportunidade de vivenciar este artesanato, inscrito desde 2020 na Lista Representativa do Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade da UNESCO. A exposição é também uma chance para mergulhar na magia mecânica que perdura até os dias de hoje em Sainte-Croix.
(Adaptação: Clarissa Levy)
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