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Quando a Rádio Suíça Internacional transmitia em esperanto

A Towel of Babel made of books
Buenos Aires, 11 de maio de 2011: a "Torre de Babel" reconstruída utilizando 30 mil livros em diferentes idiomas pela artista Marta Minujin. Keystone / Natacha Pisarenko

De 1946 a 1992, a emissora pública que antecedeu a swissinfo.ch transmitia programas em esperanto. Por que a escolha de um idioma tão diferente e por que os programas foram interrompidos? Fomos investigar.

No dia 17 de fevereiro de 1946, o Serviço de Ondas Curtas da Suíça (SOC) começou a transmitir para a Europa um programa semanal em esperanto, a língua artificial mais utilizada no mundo.

No áudio abaixo, tirado de nossos arquivos multimídia, o psicólogo suíço e tradutor da ONU, Claude Piron, conta ao jornalista da Roy Probert as vantagens do esperanto, bem como os preconceitos que ele enfrentou:

De acordo com um memorando de Berna, datado de 6 de julho de 1953, o objetivo do conteúdo do SOC era “difundir as ideias da Cruz Vermelha”. Estas transmissões foram mais tarde substituídas por uma série de transmissões da Cruz Vermelha sobre os esforços internacionais de paz.

Durante o Congresso Mundial de Esperanto de 1947, em Berna, foram transmitidos diariamente, de forma temporária, breves reportagens sobre o congresso e entrevistas com participantes notáveis. A partir de outubro de 1947, um segundo programa de cinco minutos foi transmitido uma vez por semana, sob a orientação de Arthur BaurLink externo, editor do jornal “Neue Berner Zeitung”. O programa visava explicar os acontecimentos políticos e culturais na Suíça aos esperantistas no estrangeiro.

O memorando de 1953 dizia que, a partir de 1 de abril de 1949, os dois programas semanais de esperanto poderiam ser ouvidos não só durante a transmissão noturna para a Europa, mas também ao meio-dia, uma vez que o sinal de rádio podia alcançar diferentes localizações durante o dia e durante a noite. Assim, no total, as transmissões em esperanto obtiveram quatro faixas horárias de cinco minutos na programação semanal.
Esperanto

Um novo idioma

O esperanto (literalmente “aquele que tem esperança”) foi criado pelo oftalmologista judeu-polonês Ludwik Lejzer Zamenhof, que publicou sua primeira brochura na língua em 1887. Ele queria que o esperanto se tornasse uma segunda língua para todos. 

A Sociedade Suíça de EsperantoLink externo foi fundada em 1903. 

A Universala Esperanto-AsocioLink externo (Associação Universal de Esperanto) foi fundada em Genebra em 1908, e sua sede atual está localizada em Rotterdam. 

Segundo esta associação, “com base no número de livros didáticos vendidos e no número de membros das sociedades locais, o número de pessoas com algum conhecimento do esperanto é de centenas de milhares e, possivelmente, milhões”. Aproximadamente mil pessoas teriam o esperanto como primeira língua.

O esperanto tem uma gramática relativamente simples, sem exceções nas suas regras. O seu vocabulário deriva sobretudo das línguas românicas e, em menor grau, das línguas germânicas e eslavas.

“Para além da Europa, não há transmissões regulares de esperanto”, diz o memorando. A única exceção foi uma transmissão especial para esperantistas no Brasil, em janeiro de 1953. 

Baur, que até 1991 trabalhou nos programas de esperanto do SOC, conta que havia um grande interesse pelo esperanto no Brasil. O memorando observava que a resposta à transmissão pontual de cinco minutos era “muito gratificante”, resultando em 25 cartas de ouvintes (17 do Brasil, oito de outros países com recepção). “Mas, desde o início, enfatizamos que, mesmo que as pessoas gostassem muito, isso não resultaria na introdução de transmissões em esperanto na América do Sul uma vez que, tendo em vista os objetivos de união entre nações do esperanto, seria contraditório acrescentar uma terceira língua a um continente com apenas duas línguas, mais ou menos compreensíveis mutuamente”, disse ele.

Objetivos das transmissões

O memorando de Berna explica que o principal objetivo das transmissões em esperanto sempre foi “alcançar, através do esperanto, a intelectualidade por detrás da Cortina de Ferro, especialmente no sudeste da Europa, que conseguiu ultrapassar com êxito a barreira de sua diversidade linguística”.

E acrescentou: “Nossas transmissões em esperanto podem, portanto, difundir informações sobre a Suíça e suas ideias e ideais de forma discreta nessas regiões que de outra forma eram fechadas, uma vez que as transmissões nas línguas nacionais dessas regiões não fazem sentido para nós”.

É difícil dizer quantas pessoas ouviram estas transmissões, nenhuma das quais, infelizmente, foi guardada nos arquivos da Sociedade Suíça de Radiodifusão e Televisão (SRG SSRLink externo, da qual a swissinfo.ch faz parte). Ainda de acordo com o memorando de 1953, Berna recebeu duas ou três confirmações de recepção por semana, em sua maioria dos países atrás da Cortina de Ferro: “Sua raridade relativa pode ser explicada pelo grande risco que os autores das cartas provavelmente enfrentam”.

Então, no final de janeiro de 1965, foi anunciada a notícia chocante de que, por razões financeiras, os 16 programas de esperanto por mês não seriam mais transmitidos. 

A Sociedade Suíça de EsperantoLink externo disse que se tratava de uma “grande perda para o mundo ocidental”. Para ela, “uma redução de quatro programas semanais para dois ou até mesmo um teria certamente encontrado compreensão geral, mas é altamente lamentável que a Rádio Suíça Internacional (RSI, predecessora da swissinfo.ch) tenha decidido cancelar a totalidade dos programas em esperanto”.

Ainda viva 

O que aconteceu a seguir não está claro nos arquivos. Sabemos, no entanto que, se os programas realmente pararam, em algum momento eles recomeçaram e com alguma frequência. Isto porque no final dos anos 80, a RSI (sucessora do SOC a partir de uma reestruturação em 1978), estava enviando para todo o mundo fitas de transcrição com material em esperanto.

A carta abaixo é uma das várias correspondências arquivadas desde 1988: 

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Na seguinte carta em esperanto, datada de maio de 1990, John B. Victery diz que vai dar aulas de esperanto na Universidade de São Francisco e pergunta-se se a SRI lhe poderia enviar algumas gravações em cassete das suas transmissões

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No entanto, no final de março de 1992, a cortina se cerrou de uma vez por todas para a produção de esperanto da SRI.

Numa carta de 29 de Junho de 1992, Walter Fankhauser, diretor de relações públicas e marketing da RSI, explica a um ouvinte na Bélgica que a empresa havia “definido novas prioridades que colocavam a ênfase no inglês e no francês e na informação aos cidadãos suíços residentes no exterior, aos quais foi recentemente dado o direito de voto e que, portanto, dependem de notícias atualizadas da Suíça”.

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Nem todos os ouvintes ficaram satisfeitos com esta explicação. Em julho de 1992, Tobias Meissner, em Berlim, a quem Walter Fankhauser tinha escrito no mês anterior, disse que “ainda não estava satisfeito”.

“Existem sérios problemas linguísticos nos países do antigo bloco do leste, uma vez que o inglês e o francês, por razões ideológicas, não são muito falados lá e o russo, que tinha sido imposto, é rejeitado”, escreveu Meissner. 

“Aprender uma língua nacional requer muitos anos de estudo, tempo que não está disponível tendo em vista que a criação de uma economia funcional deve acontecer rapidamente. O esperanto é neutro e pode ser aprendido muito rapidamente”.

Mídia em transição

Em outubro de 1992, Fankhauser enviou uma resposta a Andy Künzli, um dos apresentadores dos programas da RSI, para oferecer uma nova justificativa para a decisão.

“Não devemos esquecer a decepção causada pela nossa decisão. No entanto, surpreende-me bastante que a suspensão destes programas tenha mobilizado apenas 270 ouvintes e organizações (das quais apenas 20% estavam fora da Europa!). Por outro lado, como você bem diz, sei que existe uma grande maioria silenciosa a quem nossa decisão não alegrou de forma alguma”.

Fankhauser ressaltou que abandonar as transmissões em ondas curtas de esperanto “não foi uma medida seletiva contra os falantes de esperanto”, mas sim parte de uma nova orientação para a RSI e para os meios de comunicação social em geral.

“A mudança no cenário da mídia é uma realidade que afeta tanto a mídia quanto os usuários da mídia. Ela faz parte de um amplo desenvolvimento sociocultural que, inevitavelmente, tem um impacto não só na comunicação em si, mas também nas línguas individuais. Não há dúvida de que o esperanto ocupa um lugar importante na história da comunicação. Temos consciência disso e estamos orgulhosos de ter contribuído para o seu louvável passado. Mas é difícil entender por que razão a língua deve ser forçada a ter parte um futuro em que terá dificuldade de se afirmar”.

Emissora para o mundo

O Serviço de Ondas Curtas da Suíça (SOC) foi rebatizado em 1978 como “Rádio Suíça Internacional” (RSI). Em 2001 a empresa se transformou em um portal da internet e passou a se chamar swissinfo.ch

As emissões de rádio do serviço internacional foram transmitidas de 1935 até ao seu encerramento em 2004. A partir desse ano o mandato de fornecer notícias sobre a Suíça a um público estrangeiro passou a ser de responsabilidade exclusiva de seu serviço online, a swissinfo.ch.

Em 1939, o SOC adquiriu sua própria antena, localizada em Schwarzenberg, no centro da Suíça.

As transmissões de rádio destinadas a um público estrangeiro atingiram a sua idade de ouro durante a Guerra Fria. Com programas em oito línguas, estima-se que a RSI tenha alcançado de cinco a dez milhões de ouvintes em todo o mundo.  

O declínio do rádio de ondas curtas começou no final dos anos 80. Mudanças políticas, como o fim da Guerra Fria, e avanços tecnológicos, incluindo transmissões via satélite e o surgimento da internet, puseram em questão a necessidade de se continuar as transmissões em ondas curtas. 

Adaptação: DvSperling

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SWI swissinfo.ch - sucursal da sociedade suíça de radiodifusão SRG SSR

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