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A “ambiciosa jornada” para capturar toneladas de CO2

impianto per la cattura del co2 dall aria
"Orca" está localizada perto de Reykjavik, Islândia. Climeworks

É possível remover o CO2 da atmosfera e armazená-lo permanentemente no subsolo, mas não é fácil. É o que mostra Climeworks, empresa que abriu há um ano na Islândia a maior fábrica do mundo de processamento do gás.

A Suíça está na vanguarda do desenvolvimento de tecnologias que visam reduzir a quantidade de CO2 na atmosfera. Em 8 de setembro de 2021, as empresas ClimeworksLink externo (Suíça) e CarbfixLink externo (Islândia) a maior fábrica do mundo capaz de filtrar o dióxido de carbono da atmosfera (Direct Air Capture ou simplesmente DAC) e armazená-lo permanentemente no subsolo.

A Agência Internacional de Energia e o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) consideram o DAC e outras tecnologias de captura e armazenamento de CO2 “indispensáveis” para limitar o aquecimento global a 1,5 °C e alcançar a neutralidade climática até 2050.

A usina, chamada “OrcaLink externo“, está localizada nos arredores de Reykjavik, Islândia, e funciona graças à eletricidade gerada por uma usina de energia geotérmica. Os filtros nos coletores separam o CO2 do ar e o gás é, então, misturado com água e bombeado para as camadas de rocha basáltica a uma profundidade de 800 a dois mil metros, onde deve permanecer por milhões de anos.

>> Veja como funciona a remoção e captura de CO2:

Queríamos saber se a fábrica se mostrou eficaz. Judith Hebekeuser, porta-voz da Climeworks, respondeu por escrito às perguntas.

swissinfo.ch: Orca foi projetada para filtrar até quatro mil toneladas de CO2 por ano, o equivalente às emissões anuais produzidas por 600 pessoas na Europa. Quanto dióxido de carbono ele conseguiu remover da atmosfera no primeiro ano de funcionamento?

Judith Hebekeuser: Orca está atualmente na sua fase inicial, como é usual para novas instalações nos seus primeiros 18 a 24 meses de funcionamento. Portanto, ainda não atingiu a capacidade máxima. A capacidade de remoção de CO2 aumenta gradualmente e estamos aplicando as lições aprendidas com a Orca em nossa próxima fábrica, a ‘Mammoth’, que terá uma capacidade dez vezes maior.

A lição mais importante com a fábrica é que o processo de captação direta de ar, combinado com o armazenamento geológico, funciona como esperávamos.

swissinfo.ch: Devido à uma geada na Islândia, a fábrica parou de funcionar por algum tempo. Como o problema foi solucionado? Houve outros?

J.H.: Iniciar a operação de uma nova instalação significa antecipar os ajustes exigidos em condições reais. Embora os problemas iniciais fossem previstos, não foi possível prever tudo que poderia ter ocorrido até o início das operações.

A tecnologia da Climeworks é projetada para operar em todas as condições climáticas. Embora tenha sido testada para o clima frio da Islândia, durante seu primeiro inverno a fábrica foi confrontada com condições climáticas excepcionalmente severas.

Tivemos que ajustar algumas peças devido à geada. Por exemplo, os recipientes de nossos coletores foram fechados com cintas de borracha, mas estas congelaram durante temperaturas excepcionalmente baixas e após as tempestades de neve. Finalmente elas foram substituídas por cintos metálicos.

>> Veja vídeo abaixo uma vista aérea da “Orca”:

swissinfo.ch: Climeworks construirá uma segunda fábrica ainda mais potente também na Islândia. O país se tornará, então, o maior depositário de emissões de CO2. Existiriam outros países ou regiões onde as condições seriam também favoráveis a essa missão?

J.H.: A Islândia é o ponto de partida ideal para aplicar a tecnologia DAC, pois combina uma abundante fonte de energia renovável fornecida pela planta geotérmica da ON Power e uma forte parceria com o especialista em armazenamento geológico, a empresa Carbfix.

Nossa tecnologia também pode ser utilizada em outras regiões onde há opções de energia renovável e armazenamento geológico. Um total de 10.000 a 1.000 trilhões de toneladas de carbono podem ser armazenadas em depósitos minerais naturais em todo o mundo, de acordo com um estudo de 2021 publicado na revista NatureLink externo. Já estamos investigando outros locais com projetos-piloto em várias regiões, incluindo Noruega e Omã.

swissinfo.ch: As fábricas DAC requerem muita energia, tanto para alimentar os ventiladores nos coletores quanto para aquecer os filtros a fim de liberar o CO2 capturado do ar. Como a atual crise energética afeta o futuro desenvolvimento da tecnologia DAC?

J.H.: Apesar das condições atuais do mercado, a necessidade da remoção permanente e segura do carbono continuou a crescer, resultando em uma demanda sólida e estável, o que é muito encorajador.

Nossa tecnologia DAC é alimentada exclusivamente por fontes renováveis de energia ou energia proveniente de resíduos, a fim de maximizar o impacto da remoção de CO2. Isto nos permite atingir 90% de eficiência na captura de CO2. Isso significa que a construção e operação da fábrica gera cerca de 10% da quantidade de CO2 que é removida da atmosfera, como demonstrou um estudo independente.

Filtragem de CO2

– Atualmente, 19 plantas estão em operação para a remoção e captura de CO2 na atmosfera (tecnologia “Direct Air Capture”), de acordo com a Agência Internacional de EnergiaLink externo (AIE). Juntos eles têm a capacidade de filtrar 10 mil toneladas de CO2 por ano.

– O CO2 também pode ser capturado onde é produzido, por exemplo, em incineradores. Existem atualmente 27 fábricas desse tipo (“Carbon Capture and Storage”) em operação e podem capturar mais de 40 milhões de toneladas de CO2 por ano, cerca de 0,1 por cento das emissões globais.

– Os pesquisadores da Escola Politécnica Federal em Lausanne (EPFL) acreditam que estas tecnologias serão capazes de eliminar uma parte correspondente a 5-10% das emissões atuais.Link externo

– Entretanto, ambientalistasLink externo e parte da comunidade científica, não as veem como uma solução para o problema climático. Em questão estão os custos elevados, o alto consumo de energia, o impacto ambiental e a complexidade do processo. Além disso, temem que estas tecnologias possam servir de desculpa para prolongar a dependência de combustíveis fósseis.

swissinfo.ch: ONGs ambientais como a Greenpeace argumentam que o DAC poderia ser uma distração perigosa e desviar a atenção da ação mais urgente e eficaz a ser tomada, ou seja, a redução drástica das emissões. Por que investir milhões de dólares em uma tecnologia que atualmente tem a capacidade de remover apenas 0,0000003% (10.000 de 35 bilhões de toneladas) do CO2 emitido anualmente no mundo? 

J.H.: Infelizmente, não é mais uma questão de discutir se devemos fazer uma coisa ou outra. Precisamos de ambos. Estamos convencidos de que a redução das emissões deve ser a prioridade número um, já que uma tonelada de CO2 evitada será sempre mais barata do que uma tonelada de CO2 removida da atmosfera. Por isso deveríamos também investir na remoção do carbono. E devemos fazer isso hoje para atingir a capacidade necessária em 2050.

Os níveis de CO2 atmosférico são muito altos e são responsáveis pelo aquecimento global. Elas continuarão a aumentar durante a próxima década, pois as emissões que são muito difíceis de remover, por exemplo, da aviação, da produção de cimento e aço, continuarão a existir, pelo menos em médio prazo.

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swissinfo.ch: Climeworks tem metas ambiciosas: até 2030, quer atingir uma capacidade de um milhão de toneladas por ano e reduzir pela metade o preço atual de cerca de 600 dólares para capturar e armazenar permanentemente uma tonelada de CO2. Como a empresa quer atingir este objetivo?

J.H.: A estratégia de crescimento da Climeworks está dividida em duas partes: atingir uma capacidade de vários milhões de toneladas (de CO2 removido da atmosfera) até 2030 e depois continuar em direção a uma capacidade de bilhões de toneladas através de uma implantação em larga escala até 2050.

Estamos visando uma taxa de crescimento semelhante à da energia eólica. A necessidade de energia renovável para alimentar as instalações do DAC é tanto significativa quanto razoável. As projeções mais conservadoras falam de uma capacidade eólica e solar adicional de 25 gigawatts por ano a partir de 2030. Isto representa cerca de 10% da capacidade instalada em 2021, ou 3% da capacidade anual projetada em 2030.

Operacionalmente, para desenvolver a capacidade, entre 30 e 50 bilhões de dólares terão que ser investidos anualmente na captura direta do ar a partir de 2030. Isto representa 10% do investimento anual atual em capacidade de energia renovável: é realizável e o apoio do governo, em estreita cooperação com o setor privado, deve atuar como um catalisador para atingir este nível de investimento.

A chave para reduzir os custos é a escalabilidade industrial. Esperamos que o custo potencial de nossa tecnologia atual esteja na faixa de 250-350 dólares por tonelada de CO2 em 2030. A longo prazo, é realista imaginar uma redução adicional no custo para 100 a 200 por tonelada.

swissinfo.ch: Climeworks recebeu há pouco uma injeção de capital de 600 milhões de francos suíços e assinou acordos de compensação de carbono de longo prazo com a Microsoft e outras empresas como seguradoras e bancos. O que seria necessário para aumentar ainda mais a capacidade de remoção de CO2 da empresa?

J.H.: Em 2022, houve desenvolvimentos significativos nas indústrias DAC e de remoção de carbono em geral: os EUA investiram 3,5 bilhões de dólares na criação de centros regionais DAC no país e recentemente aprovaram a Lei de redução da inflação, sem dúvida a lei climática mais ambiciosa da história. A indústria de remoção de CO2 tem sido ainda mais apoiada pelo forte compromisso de vários atores, por exemplo, o “Fundo de Fronteira” da Stripe, o prêmio XPrize do investidor Elon Musk ou a coalizão “First Mover”. 

Mas sabemos que o caminho para chegar a uma capacidade de bilhões de toneladas é uma jornada ambiciosa e continuaremos a precisar da cooperação de todos: ações corporativas, investimentos, políticas e diretrizes devem se unir para facilitar a escalada necessária.

Edição: Sabrina Weiss

Adaptação: Alexander Thoele

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