Parlamento suíço aprova fim da dupla tributação de renda com Brasil
O Parlamento suíço aprovou na terça-feira (6.03) o fim da dupla tributação (bitributação) de renda com o Brasil. Porém o acordo só deve entrar em vigor em 2020 após aprovação pelo Parlamento brasileiro. A medida poderá estimular os negócios bilaterais entre os dois países.
Por 40 votos a 1, a convenção que prevê introduz limites às competências tributárias dos dois países, com objetivo de eliminar ou minimizar as possibilidades de bitributação da renda, foi aprovadaLink externo na terça-feira (06.03) no Conselho dos Estados (Senado), seguindo também a aprovação no início de dezembro pelo Conselho Nacional (Câmara dos Deputados). Antes de entrar em vigor, a convenção precisa ser aprovada pelo Congresso brasileiro. A previsão é de que a medida seja aplicada a partir de 2020 (ver entrevista abaixo).
As negociações entre a Suíça e o Brasil duraram muitos anos. Elas se intensificaram-se após o Brasil incluir, em 2010, a Suíça em uma lista nacional de países com baixa imposição fiscal. Depois de muitas discussões, o Brasil aceitou retirar a Suíça da lista em 2014. No mesmo período, surgiram denúncias contra brasileiros que teriam fortunas não declaradas em contas em bancos suíços.
Paralemamente à negociação para o fim da dupla tributação sobre a renda, os dois países assinaram, em 2015, um acordo para evitar a evasão fiscal. Em 2016, um novo acordo foi assinado. Desta vez permitindo a troca automática de informações fiscais. Assim, foi liberada a revelação das contas da população brasileira ou suíça, nos respectivos bancos nacionais.
Finalmente, a convenção foi assinada em Brasília em 3 de maio de 2018. É a primeiro do gênero entre os dois países. Ela prevê uma regulamentação favorável no domínio da tributação internacional dos lucros das sociedades e de outros rendimentos. Além disso, aplica várias disposições adotadas pela OCDELink externo e os países membros do G20 na chamada Convenção Multilateral (BEPSLink externo), destinada a implementar medidas para prevenir a erosão das bases fiscais e o deslocamento artificial de lucros, explicou o deputado-federal Pirmin BischofLink externo (Partido Cristão-Democrático), membro da Comissão de finanças.
O acordo contém igualmente uma cláusula de assistência administrativa em conformidade com a norma internacional relativa ao intercâmbio de informações. O Brasil é o principal parceiro comercial da Suíça na América Latina. A adoção dessas normas deverá ser favorável às relações econômicas bilaterais e a uma maior cooperação fiscal entre os dois países, considera o Conselho Federal (governo)
Questionado pela swissinfo.ch, Michaël C. Duc, membro do Conselho dos Suíços do Estrangeiro e advogado suíço residente no Brasil, explica as implicações do acordo para o contribuinte residente em um dos dois países.
swissinfo.ch: Como e quando entrará em vigor o acordo de fim da dupla tributação?
Michaël C. Duc: Ainda não há previsão para a entrada em vigor. Conforme notícias (veja abaixo), a convenção encontra-se ainda no Itamaraty, ou seja, nem foi enviada ao legislativo brasileiro para a sua aprovação. Portanto, conforme art. 29 da convenção em anexo, se aplicará o mais cedo no dia 1° de janeiro de 2020.
swissinfo.ch: Como o Brasil não aplica imposto sobre fortunas, esse acordo cobriria então só a renda? O que definimos como renda?
M.C.D.: O título do acordo é “Convenção […] para eliminar a dupla tributação em relação aos tributos sobre a renda e prevenir a evasão e a elisão fiscais” – “Abkommen […] zur Vermeidung der Doppelbesteuerung auf dem Gebiet der Steuern vom Einkommen und zur Verhinderung von Steuerhinterziehung und Steuerumgehung”. Ou seja, o acordo cobre apenas a renda. O imposto sobre fortunas não faz parte do acordo.
Simplificado, considera-se como renda os recebimentos (em dinheiro ou produtos naturais), sejam periódicos ou únicos. Por exemplo a remuneração para seu trabalho, pensões, rendimentos de alugueis e semelhante, ganhos de capital, lucros (depende), etc. Veja art. 2 da convenção:
ARTIGO 2 – Tributos Visados
1. Os tributos atuais aos quais se aplicará a Convenção são:
a) no caso do Brasil: imposto federal sobre a renda, a contribuição social sobre o lucro líquido, (doravante denominado “imposto brasileiro”);
b) no caso da Suíça:
impostos sobre a renda federal, cantonal ou local (renda total, rendas recebidas, renda do capital, lucros industriais e comerciais, ganhos de capital e outros itens de rendimento), (doravante denominado “imposto suíço”).
2. […]
3. Serão considerados como tributos sobre a renda todos os tributos cobrados sobre renda total ou elementos de rendimento, incluindo tributos sobre os ganhos decorrentes da alienação de propriedade móvel ou imóvel.
swissinfo.ch: Um brasileiro residente na Suíça que tenha fortuna no Brasil (imóveis, capital, etc.) continuará a ter de declará-la na Suíça?
M.C.D.: Precisa ser esclarecido que a convenção não isenta de declarar renda e/ou fortuna. A convenção apenas evita que a pessoa tenha que pagar impostos duas vezes sobre a mesma renda (veja art. 23). Portanto, sim, quem mora na Suíça e tem renda e/ou bens no Brasil, continuará obrigado a declarar na Suíça, as rendas e bens no Brasil. Quem mora no Brasil e tem renda e/ou bens na Suíça, continuará obrigado a declarar no Brasil, as rendas e bens na Suíça. O Acordo de Troca Automática de Informações Financeiras implica que as pessoas residentes em um dos países declarem no país de residência todos os bens, em ambos os países.
Além, a Suíça continuará – nas situações previstas em lei (no caso de imóveis, por exemplo) – a tributar bens no território suíço de pessoas residentes no Brasil. Bens situados no Brasil de pessoas residentes na Suíça, continuarão a ser considerados para definir a taxa de tributação, porém, não se paga impostos sobre o valor dos bens no exterior.
swissinfo.ch: Quais outras vantagens e mudanças trazem o acordo para o cidadão?
M.C.D.: A principal vantagem é que quem mora em um dos dois países e tem renda no outro, não precisará mais pagar impostos de renda na fonte no outro país e mais uma vez pagar impostos sobre a mesma renda no país de residência. Exemplo da situação atual: A. O brasileiro residente na Suíça que aluga sua casa no Brasil, deve pagar impostos no Brasil sobre a renda dos alugueis. Ao declarar o mesmo aluguel na Suíça, paga mais uma vez sobre a mesma renda. B. O suíço aposentado que mora no Brasil, paga impostos na fonte da sua previdência privada suíça. Declarando o valor no Brasil, paga mais uma vez impostos sobre a mesma renda. Um dos objetivos da convenção é evitar essa situação. Além, a economia espera que a convenção estimulará os negócios e investimentos entre os dois países
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