Anistia fiscal brasileira traz à luz US$52 bilhões
A Suíça é o quinto principal paradeiro desse montante. Os grandes bancos do país estão agora incitando seus clientes a aproveitar a oportunidade, ou encerrar suas contas.
Terminou na segunda-feira o prazo para a legalização de ativos brasileiros no exterior no RERCT, Regime Especial de Regularização Cambial Tributária, previsto na lei 13.254 de 13 de Janeiro de 2016.
Dados divulgados pela Receita Federal na terça contabilizaram a regularização de quase R$170 bilhões (US$52 bilhões) no contexto do regime. Desse montante R$164 bilhões eram de pessoas físicas e R$6 bilhões de pessoas jurídicas.
O esforço de regularização rendeu à Receita Federal R$50,9 bilhões de arrecadação entre multas e impostos de renda. Dentro das próximas semanas o Banco Central deverá disponibilizar uma lista indicando a origem por país das remessas feitas no contexto desse programa de regularização.
Para se ter uma ideia, dados do Banco Central de 2015 – não relacionados ao programa – estimam que estoques de brasileiros mantidos no exterior de investimentos em moedas e depósitos totalizam US$45,7 bilhões.
Principais paradeiros
A Suíça é o quinto país mais importante, abrigando 3,4% desse montante, fatia que em valores corresponde a US$1,5 bilhão. A lista contempla na seguinte ordem: Estados Unidos (52%), Ilhas Cayman (23%), Reino Unido (5,7%), Bahamas (3,9%), entre outros países.
Houve incerteza até o último minuto por parte do governo brasileiro. Existia a possibilidade de uma mudança na lei durante as semanas anteriores ao fim do prazo, o que encorajou os investidores a aguardar uma definição antes de se posicionarem. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, DEM-RJ, chegou a cogitar votar alteração no texto, mas o esforço político não se concretizou.
Essa situação acabou causando correria nos bancos suíços. Os setores especializados, também chamados de “Brazilian desk”, tiveram ordens de transferência e fechamento de câmbio acima do usual nos dias que antecederam o fim do mês de outubro.
Para muitos, a oportunidade de anistia foi considerada excepcional. O secretário da Receita Jorge Rachide estimou em entrevista coletiva divulgada no site do órgão que não haverá uma nova oportunidade: “A Receita Federal entende que não se faz necessário, mas trata-se de matéria de lei”, disse.
À imprensa brasileira, entretanto, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-Al) afirmou que vai apresentar projeto para reabrir a o programa de novamente em 2017. O interesse dos políticos é poder incluir seus parentes diretos, condição vedada no texto atual pelo artigo 11.
Troca automática de informações
A partir de 2018 entrará em prática o acordo de troca automática de informações fiscais, assinado no âmbito da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), o que permitirá ao leão brasileiro obter dados de sonegadores.
“Sem dúvida esse é um grande estímulo. As pessoas sabem que precisam se regularizar e a oportunidade é agora”, opina o advogado advogado Sérgio Mitsuo Vilela da Bravest, escritório de advocacia e contabilidade com sede em Zurique.
Não é barato o quinhão necessário para regularizar o capital sonegado no estrangeiro. A lei prevê cerca de 30% do valor, sendo que 15% é imposto de renda sobre o ativo e outros 15% de multa.
A oportunidade também é única porque a participação permite anistia a crimes fiscais pesados. Quem participa do programa recebe “extinção da punibilidade” até para lavagem de dinheiro, desde que praticada no contexto da sonegação, trecho que consta no inciso 7 do parágrafo 1 do artigo 5 e faz menção à Lei no 9.613, de 3 de março de 1998. O perdão, porém, só é válido se não pesar condenação criminal contra o dono do ativo.
Lista de indulgências
Além de lavagem de dinheiro, o catálogo de pecados perdoados inclui também: sonegação de impostos, sonegação de INSS, falsificação de documentos, falsidade ideológica e evasão de divisas.
Para escapar de cair na contravenção, todas pessoas físicas e jurídicas domiciliadas no Brasil em 31 de dezembro de 2014 com patrimônio no exterior não declarado precisavam enviar, até segunda-feira, uma declaração à Receita Federal listando seus ativos.
Essa obrigatoriedade recai sobre todos os indivíduos ou organizações residentes, ou domiciliados no Brasil em 31 de dezembro de 2014, inclusive os estrangeiros.
“Cerca de 40% dos meus clientes são estrangeiros morando no Brasil. Há muitos suíços que se aposentaram décadas atrás e foram morar lá, mas nunca declararam a pensão ou heranças que receberam por aqui”, afirmou Vilela.
O perfil predominante entre os clientes dos grandes bancos é justamente de famílias e herdeiros declarando investimentos antigos, bens de parentes que até já faleceram, segundo informou um profissional do mercado sondado para essa reportagem.
Concomitante com o esforço da Suíça em transformar seu sistema bancário em um setor mais transparente, as grandes instituições enviaram cartas solicitando aos clientes que aproveitassem a oportunidade de anistia brasileira e declarassem todos seus ativos.
Aqueles que optam por não fazer, recebem um convite para encerrar suas posições financeiras.
“A Suíça está mudando e apertando o cerco contra o dinheiro ilegal. Os investidores até conseguem mover os recursos para bancos menores, onde as regras são mais complacentes, mas também essas instituições ainda terão que se ajustar. É uma questão de tempo”, disse um profissional familiarizado com a situação.
Luz vermelha: Bens a declarar
É extensa a lista de bens a declarar para obter a anistia. Inclui além de capital líquido, imóveis, veículos, aeronaves, embarcações e propriedades que exijam registro. Ativos intangíveis disponíveis no exterior como marcas, copyright, software, know-how, patentes e todo e qualquer direito submetido ao regime de royalties.
Na questão dos ativos líquidos consta depósitos bancários, fundos de investimento, instrumentos financeiros, apólices de seguro, operações de capitalização, depósitos em cartões de crédito, fundos de aposentadoria ou pensão, entre outros.
Ainda precisavam ser declarados: operações de empréstimo com pessoa física ou jurídica; recursos decorrentes de operações de câmbio ilegítimas ou não autorizadas; recursos integralizados em empresas estrangeiras sob a forma de ações, integralização de capital, contribuição de capital ou qualquer outra forma de participação societária ou direito de participação no capital de pessoas jurídicas com ou sem personalidade jurídica.
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