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Atentado no Parlamento de Zug: o dia que mudou a Suíça

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Uma rosa decora o Parlamento regional de Zug, em 27 de setembro de 2011. O cantão suíço comemora na terça-feira as vítimas de um ataque de 27 de setembro de 2001, quando um homem armado com um fuzil e uma granada invadiu uma sessão parlamentar regional e matou 14 e feriu outros 18 antes de atirar em si mesmo. Reuters / Arnd Wiegmann

Há 20 anos, Friedrich Leibacher disparou uma série de tiros no salão do Parlamento cantonal de Zug, matando 14 pessoas e ferindo 15. O inquérito policial revelou que o suíço não tinha problemas mentais. O tiroteio foi traumatizante para a Suíça e marcou um ponto de mudança no entendimento em torno de medidas de segurança.

O ataque de repentina ira assassina ao Parlamento cantonal de Zug, pouco mais de duas semanas após o atentado terrorista às Torres Gêmeas em Nova York, foi um pesadelo não só para a população local, mas todo o país.

Pela primeira vez, a Suíça reconheceu a necessidade de uma abordagem moderna de segurança pública. As instituições políticas examinaram atentamente seus conceitos de segurança, por vezes com resultados assustadores. Mesmo no edifício do Parlamento federal em Berna houve ajustes, com a instalação, por exemplo, de aparelhos raio-X como nos aeroportos. O livre-acesso ao plenário, uma tradição de anos, terminou.

Zug tirou suas próprias lições da tragédia e criou o posto de um ouvidor de justiça para mediar os conflitos entre as autoridades, por um lado, e os cidadãos e cidadãs, por outro. Quase ao mesmo tempo que os EUA, a Suíça entrou em uma nova era de uma “sociedade de risco moderna”, para usar as palavras do sociólogo alemão Ulrich Beck.

Mas onde tudo começou? Onde estava o “point of no return”, após o qual a tragédia numa região próspera, internacionalmente conhecida pelo seu regime fiscal, já não podia ser detida?

Discussão com o motorista de ônibus

Poderia a discussão que Leibacher teve com um motorista de ônibus alguns anos antes ter sido a proverbial última gota que fez transbordar o copo? O futuro assassino tinha concluído na altura que o motorista estava embriagado. Seguiu-se um longo processo judicial, que terminou sem resultados.

Será que esse incidente aparentemente insignificante convenceu Leibacher de uma vez por todas de que nenhum funcionário, seja um juiz, um político ou um simples motorista de ônibus, é digno de confiança? Que todos eles apenas fingem ser, como disse o próprio Leibacher, “servidores do povo”, quando na realidade são egoístas e criminosos, membros de uma “Máfia de Zug”? 

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Equipes de resgate e policiais no local, onde ocorreu o atentado em 27 de setembro de 2001. Keystone / Urs Flueeler

Nunca saberemos a resposta a essa pergunta. O que sabemos é que Leibacher agiu sozinho e planejou deliberadamente o atentado: cuidou de todos os seus assuntos financeiros, vendeu sua casa, escreveu uma carta de despedida à sua mãe, redigiu um testamento e até incumbiu um agente funerário de cremar seu corpo.

De acordo com Roland Schwyter, o investigador especial que mais tarde assumiu o caso Leibacher, não havia indícios ou pistas de que o assassino pertencesse a uma organização criminosa. Mas o que aconteceu? De onde Friedrich Leibacher extraiu esse ódio às autoridades, aos políticos, ao poder judicial? O que o fez armar-se (legalmente, aliás) com todo um arsenal, incluindo um rifle de assalto 90 e uma pistola SIG Sauer P232, e depois disparar 91 tiros?

Luta por um amigo 

A história com o motorista de ônibus foi apenas um episódio de uma série de incidentes que culminou em tragédia. Leibacher já havia tentado contrabandear relógios para a Turquia, onde foi preso por isso. Ou, em outro caso, ele e um amigo enviaram faturas a empresas e negócios a fim de inseri-las em uma lista telefônica comercial fictícia. E, como relatou a revista “Beobachter”, ele contrabandeou armas para a Suíça e foi até condenado por abuso de crianças.

No caso do motorista de ônibus, o então deputado-estadual Robert Bisig, entre outros, entrou na mira de Leibacher. O futuro assassino acusou-o de querer proteger o “condutor negligente”, funcionário da empresa cantonal Zugerland Verkehrsbetriebe, e de tentar difamá-lo como um querelante aproveitador.

No entanto, Friedrich Leibacher não só provocou escândalos, como também defendeu os interesses de seu amigo Elmar Wenger, que a seu ver era vítima do arcaico sistema social suíço. Leibacher exigiu que o cantão de Zug indenizasse Elmar Wenger pela injustiça e danos sofridos quando criança em vários asilos infantis e orfanatos.

Elmar Wenger foi entregue, por sua mãe quando ele tinha três anos de idade, aos cuidados de um orfanato administrado pela Igreja católica. Foi então enviado de um estabelecimento ao outro e acabou em uma instituição de ensino com o diagnóstico de “retardo mental”.

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Dez anos do atentado de Zug

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O capítulo das “crianças serviçais”, que eram retiradas das chamadas “famílias disfuncionais” por ordem das autoridades e entregues a famílias mais ricas e mais bem situadas para “reeducação” como parte das “medidas de bem-estar obrigatório”, continua a ser uma mancha na história da Suíça até aos dias de hoje.

As autoridades cantonais relutavam em admitir a culpa e não estavam dispostas a pagar qualquer indenização a Wenger. A luta arrastou-se durante anos, contribuindo para o ódio de Leibacher às autoridades.

Leibacher formulou uma vez seus motivos e exigências em uma carta à revista suíça “Beobachter”, de cujos editores ele tentou fazer um aliado na luta contra a “Máfia de Zug”. Nesta carta, Leibacher escreveu em particular que “estou travando esta luta por Wenger porque subjetivamente a considero justa”. 

“Se ao menos tivessem dado seguimento a uma de suas queixas”

Em um aspecto, os tristes acontecimentos em Zug diferem de muitos outros tiroteios: em Zug, não havia um perpetrador insano agindo no calor do momento. A força motriz era um ódio frio às autoridades políticas e judiciais que, aos olhos de Leibacher, agiam de maneira errada. “Se ao menos tivessem dado seguimento a uma de suas queixas, isso não teria acontecido”, disse Elmar Wenger mais tarde, segundo o “Beobachter”.

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Roupas e armas utilizadas pelo atirador. REUTERS/HO/Kantonspolizei Zug

Em 26 de Setembro de 2001, contudo, a Justiça indeferiu todas as demandas de Leibacher. No dia seguinte, ele conduziu seu carro até o edifício do Parlamento cantonal, o qual adentrou com as palavras “Vou mostrar-lhes tudo agora mesmo”. Gerhard Spengeler, chefe do serviço forense da polícia de Zug, descreveu mais tarde todos os detalhes em um artigo para a revista especializada “Kriminalistik”.

Após Leibacher ter alvejado o primeiro deputado no átrio do salão de sessões, ele invadiu o próprio salão, onde matou outras treze pessoas e feriu quase duas dezenas de deputados e representantes da imprensa, alguns gravemente. Depois deu um tiro em si mesmo. O ataque durou apenas dois minutos e 34 segundos. O próprio Robert Bisig, que era na verdade o principal alvo de Leibacher, saiu ileso.

Presidente presta homenagem às vítimas

Vinte anos após o ataque, ainda é dolorosamente lembrado na Suíça. Guy Parmelin, atual presidente da Confederação Suíça, participou de uma cerimônia memorial no cantão de Zug.

“Mantermos viva a memória dessa tragédia é importante porque esse atentado foi também um ataque aos valores liberais de uma sociedade livre. Os acontecimentos de 27 de setembro permanecerão igualmente como uma exortação de que a violência, sob qualquer forma, é inaceitável”, declarou. Não houve um ataque comparável ao sistema político na Suíça desde o atentado em Zug.

Adaptação: Karleno Bocarro

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