Covid-19 freia investimentos no Brasil
Abrir oportunidades de negócios no Brasil e vender a Suíça como lugar de investimento: essa é a principal missão do Swiss Business Hub em São Paulo. Seu representante fala sobre o desafio atual de fazer negócios em meio à pandemia, mas se mostra otimista em relação ao maior país da AL.
Nascido em um pequeno vilarejo de montanha, o suíço Philippe Praz foi parar longe de sua terra natal: os 30 anos de carreira diplomática levaram-no para a maior cidade da América Latina. Em São Paulo, Praz coordena as estratégias de exportações helvéticas para o Brasil. O suíço, que começou a se interessar pelo país tropical ainda na juventude, lida diariamente com a missão de colocar o mercado brasileiro no radar das empresas helvéticas. Praz considera desafiador fazer com que empresas suíças identifiquem oportunidades no Brasil, sobretudo nos últimos meses devido às dificuldades do país em conter a pandemia da Covid-19.
“Uma pessoa que mora na Suíça ultimamente não lê nos jornais muita coisa positiva sobre o Brasil, então nós precisamos ajudar a balancear essas notícias”, aponta. Praz é o chefe do Swiss Business Hub Brasil, entidade que há mais de 15 anos auxilia a entrada de produtos helvéticos no mercado brasileiro. Além de facilitar as exportações, o escritório também promove a Suíça como destino de negócios. Localizado dentro do Consulado Geral, o Swiss Business Hub conecta as empresas brasileiras que buscam expansão internacional com autoridades suíças. Em entrevista, Praz explica como funciona a promoção de negócios no fluxo Suíça-Brasil.
swissinfo.ch: Na prática, o que é o Swiss Business Hub?
Philippe Praz: O Swiss Business Hub no Brasil Link externoé o escritório da Switzerland Global Enterprise (S-GELink externo), uma organização que recebeu o mandato do governo suíço para fazer a promoção das empresas suíças nos mercados internacionais. Ou seja, ajudar as empresas suíças que queiram exportar os produtos para que elas achem o caminho certo de entrada nos mercados.
E também é nossa função identificar empresas nos diversos países onde estamos localizados – no meu caso empresas brasileiras – que tem potencial para investir em outros mercados e abrir filiais fora do Brasil. Nesse caso o trabalho é conectar essas empresas com vários parceiros na Suíça para explicar o que a Suíça pode oferecer para receber essa empresa brasileira que tem um projeto de internacionalização.
swissinfo.ch: Qual é a abrangência do trabalho da Switzerland Global Enterprise? Além do Brasil, onde mais está presente?
PP: Nós temos agora 27 escritórios no estrangeiro, nos vários continentes. Aqui no continente americano estamos no Canadá, EUA, México, Chile e São Paulo.
Um elemento importante é que todos os escritórios fora da Suíça estão sempre localizados dentro de uma embaixada ou dentro do consulado geral. Isso é uma vantagem porque cria uma certa oficialidade para nosso trabalho: não somos vistos como um escritório independente ou como um consultor privado. Somos vistos como um ente que faz parte do governo suíço.
swissinfo.ch: Pensando nos últimos quatro anos em que o senhor chefiou o Swiss Business Hub em São Paulo, como analisa a atuação do escritório nesse período? Qual é o balanço das atividades?
PP: O balanço das atividades é muito positivo apesar de o momento não ser, digamos, o mais fácil para fazer o trabalho. Eu cheguei aqui depois dos Jogos Olímpicos, então depois de que quase todos os holofotes sobre o Brasil tinham se apagado. E no momento em que o país já estava enfrentando dificuldades com a crise econômica. Então teve, digamos, uma redução das atividades. Mas de toda forma a gente sempre tem empresas que têm interesse no Brasil. Porque apesar das dificuldades momentâneas ficam no Brasil nossos maiores parceiros econômicos para a América Latina, a nível de exportações e importações. É um país de um mercado enorme, de mais de 200 milhões de consumidores, sempre tem um certo atrativo para as empresas.
swissinfo.ch: Quais são as áreas de atuação das empresas que geralmente se interessam pelo mercado brasileiro?
PP: Na verdade, um pouco de tudo. No Brasil a gente identifica uma presença de mais ou menos 350, 360 empresas suíças. Se você olhar os dados das exportações suíças para o Brasil, vai ver uma fotografia um pouco do que é nossa economia [suíça]: primeiro você vai achar os produtos farmacêuticos, produtos da indústria química. Depois produtos técnicos da indústria elétrica, eletrônica, da indústria de máquinas e médica. No final, o segmento de luxo e um pouco de produtos de alimentação.
Quando nós promovemos o Brasil na Suíça, para falar com as empresas nas quais enxergamos oportunidade, trabalhamos muito a área relacionada ao agronegócio. Nós sabemos que o agronegócio é um setor muito importante no Brasil, um setor que continua a crescer independente do momento ser difícil ou não. E um setor que sempre se moderniza.
Trabalhamos muito com novas tecnologias que podem ser aplicadas no segmento de agribusiness. Por exemplo, a utilização de drones, algo que está sendo cada vez mais usado. Na Suíça temos um cluster de drones que está entre os mais eficientes do mundo, muitas empresas estão conectadas com setores de pesquisa e nos últimos anos startups desenvolveram tecnologias para drones. E algumas, que tem aplicação no campo do agribusiness, já estão aqui no Brasil.
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swissinfo.ch: Além do setor dos agronegócios, quais outros segmentos o senhor destacaria?
PP: Tem todo o setor da saúde que é importante. Aqui no Brasil, por exemplo, tem feiras deste segmento em que participamos. Na feira do setor odontológico há anos temos um espaço de exposição onde várias empresas suíças participam. Na Suíça existem diversas empresas que trabalham com tecnologia em odontologia. Como exemplo, posso mencionar a empresa Straumann, especializada em implantes dentários que se juntou com a empresa brasileira Neodent. Juntas, são agora a empresa líder no Brasil no segmento de implantes dentários.
swissinfo.ch: Considerando que várias parcerias são justamente no setor da saúde, como o senhor vê a expansão de empresas suíças para o Brasil no cenário da Covid-19?
PP: Bom, é claro que o cenário de Covid-19 freou todas essas atividades. Freou por vários motivos. Digamos que todos os representantes das empresas nesses últimos meses ficaram mais ou menos segurando o básico, sem começar grandes projetos e estratégias de expansão no exterior. Nós tínhamos alguns projetos que estavam andando e continuaram mesmo que um pouco mais devagar. Mas durante esses três ou quatro últimos meses não entraram novos projetos.
swissinfo.ch: No início de junho o senhor participou de um webinar em que discutiu os desafios e oportunidades para investimentos no Brasil e no México em meio a pandemia de Covid-19. Quais perspectivas o senhor vislumbra para os investimentos?
PP: Eu vejo oportunidades em setores como: digitalização dos processos dentro das empresas, e-commerce, telemedicina, equipamentos médicos e aumento na demanda por produtos farmacêuticos e hospitalares.
Cada vez que encontramos uma empresa suíça que nos fala do Brasil, a gente sempre fala que antes de se jogar no mercado a empresa tem que fazer todos os deveres de casa.
swissinfo.ch: No geral, quais são as principais dificuldades enfrentadas pelas empresas suíças que querem expandir para o Brasil?
PP: A maior dificuldade é complexidade dos processos. Cada vez que encontramos uma empresa suíça que nos fala do Brasil, a gente sempre fala que antes de se jogar no mercado a empresa tem que fazer todos os deveres de casa. Todo o cenário precisa ser bem estudado. Regimes de importação diversos são aplicados, então é necessário fazer o cálculo para ver o que é mais conveniente. E tem que ter consciência de como funciona o sistema fiscal, o que normalmente é complicado. Por isso sempre aconselhamos a empresa a pesquisar para que, uma vez que entre no mercado, entre num cenário justo.
swissinfo.ch: É difícil para as empresas suíças lidarem com o código fiscal brasileiro?
PP: Depende do tamanho da empresa. Quando se trata de uma empresa pequena, muitas vezes não há capacidade para financiar um ou dois funcionários somente para tratar de aspectos fiscais. O que nós aconselhamos é trabalhar com um especialista externo.
Justamente grande parte de nosso trabalho é acompanhar essas empresas e indicar em que portas elas têm que bater para não se perderem nas possibilidades que existem aqui no Brasil.
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swissinfo.ch: E no sentido oposto, pensando nas empresas brasileiras que querem investir na Suíça, como funciona o trabalho de vocês?
PP: Nós sempre tentamos procurar empresas que estão operando em segmentos que para nós tem um certo interesse. Porque se trata um pouco de fazer a promoção da praça econômica suíça e trazer empresas. Então, estamos procurando empresas que trabalham em setores inovativos, seja na saúde, na robótica, seja todo o setor conectado com blockchain, fintech e setor de digitalização também.
Primeiro fazemos a pesquisa e depois o trabalho de formiga: tentamos fazer contato diretamente com essas empresas para conversar, saber se a empresa tem um plano de expansão para o exterior e se faz parte da estratégia deles. Então, falamos mais detalhes sobre o que nós poderíamos oferecer.
Na Suíça nós temos uma grande capacidade de conectar as empresas com centros de pesquisa que operam dentro de universidades, parques tecnológicos e outros. Para fazer essa conexão contamos também com ajuda dos secretários de desenvolvimento econômico que estão na Suíça, nos cantões. Cada cantão tem sua especificidade e indica por exemplo ‘nós temos um pesquisador que trabalha com essa questão e eu posso conectar ele com essa empresa’. Os cantões podem ajudar a conectar essas empresas com credores e às vezes também podem conectar com investidores.
“…Atualmente a imagem deste governo, sendo franco, nos países europeus é negativa. Para as empresas que estão lá na Suíça chegam poucas notícias positivas sobre o Brasil…”
swissinfo.ch: E falando sobre o contexto atual do Brasil: já faz anos que o país enfrenta uma crise econômica e atualmente uma crise política que se soma à econômica. Como as empresas Suíças olham para o Brasil nesse momento?
PP: Bom, nós fazemos duas leituras quando falamos com as empresas. De uma parte tem essa leitura política e tem também a agenda econômica.
Atualmente a imagem deste governo, sendo franco, nos países europeus é negativa. Para as empresas que estão lá na Suíça chegam poucas notícias positivas sobre o Brasil. Então quando nós falamos com essas empresas tentamos sempre pontuar que o Brasil é um mercado importante, que não se pode ficar fora do Brasil. Se quer estar na América Latina tem que estar no Brasil. Não pode vir para a América Latina e estar, por exemplo, somente no Chile. Não faz sentido, é necessário colocar o Brasil na estratégia.
E depois, as ondas políticas podem mudar e uma economia como a brasileira pode se recuperar bastante rápido porque é um mercado de certo peso. Tem que balancear um pouco a imagem política que eles podem ler nos jornais na Suíça com a realidade econômica daqui. As empresas que têm bons produtos que não são encontrados no mercado brasileiro sempre vão ter oportunidade. Falamos do segmento da saúde, por exemplo, o Brasil importa grande parte desses produtos que utiliza na saúde. São 200 milhões de consumidores que um dia ou outro vão precisar desses serviços. É um mercado que não podemos deixar de lado.
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