Davos espera mais frustração do que crescimento
As bolsas passaram por uma forte recuperação em 2013 e os especialistas estão otimistas com o crescimento econômico. No entanto, a reunião anual do Fórum Econômico Mundial (WEF), em Davos, teme algumas mudanças que podem ameaçar a recuperação.
O WEF começa nesta quarta-feira, 22 de janeiro, na estação dos Grisões e terá a duração de cinco dias. Os participantes vão discutir questões fundamentais que podem causar mais problemas ou abrir novas perspectivas. Para os especialistas, o desempenho do mercado de ações em 2013 revela apenas parte da realidade diante de um contexto global em rápida mutação.
Previsões positivas
O Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, declarou que a economia americana, que mostrou sinais de recuperação no ano passado, deve ainda passar por um “avanço” em 2014. A Reserva Federal americana anunciou que vai limitar sua estratégia para estimular a economia através de taxas de juro mais baixas.
O Banco Mundial estima que o crescimento da economia mundial deve passar de 2,4%, no ano passado, para 3,2% em 2014. O Fundo Monetário Internacional, por sua vez, sugeriu que deve rever para cima o ritmo de crescimento de 3,6% que a instituição planejava até agora para 2014.
A Suíça também espera um ligeiro aumento das exportações que deve aumentar sua taxa de crescimento de 1,9% em 2013 para 2,3% este ano, segundo previsões da Secretaria de Estado para os Assuntos Econômicos.
“Pela primeira vez, desde 2010, temos sinais tangíveis de uma recuperação econômica global sustentada, declarou Janwillem Acket, economista do Banco Julius Baer, ao site swissinfo.ch. A recuperação é mais pronunciada nas economias desenvolvidas. Quanto ao peso pesado chinês, ele diminui, mas seu crescimento econômico ainda é bastante respeitável.”
Mas além destes números impressionantes, há uma falta de entusiasmo com as reformas necessárias que ameaça castrar a recuperação econômica. Isso é algo que a elite política e econômica deve abordar durante estes poucos dias de isolamento soberbo na estação dos Grisões.
A 44ª edição do Fórum Econômico Mundial (WEF) de Davos acontece sob o tema geral “Remodelar o mundo: consequências para a sociedade, a política e os negócios”.
De 22 a 25 de janeiro cerca de 2.500 participantes ouvirão líderes da política, dos negócios, das finanças e de outros setores da sociedade civil.
Cerca de 50 chefes de governo são esperados em Davos, incluindo o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe, o primeiro- ministro israelense, Benjamin Netanyahu, o presidente iraniano Hassan Rohani, o primeiro-ministro britânico David Cameron e a presidente brasileira Dilma Rousseff, entre outros.
O WEF foi fundado em 1971 por Klaus Schwab, em Davos. Foi originalmente destinado a estabelecer contatos entre líderes políticos e econômicas europeus e americanos. O evento foi crescendo ao longo dos anos, se transformando em uma reunião para discutir os principais problemas econômicos globais.
O WEF é uma organização sem fins lucrativos que tem sua sede em Genebra. É financiado por várias doações e contribuições dos seus membros.
Durante a conferência de imprensa de apresentação, em 15 de janeiro, Klaus Schwab disse que o WEF estaria se transformando gradualmente em uma parceria público-privada, o que exigirá alguns ajustes em seus estatutos. O WEF continuará sendo uma organização sem fins lucrativos, mas seu fundador não deu mais detalhes sobre a nova estratégia.
“Interesses particulares”
Em um artigo escrito para o WEF, o prêmio Nobel de economia Joseph Stiglitz descreve a atual situação econômica de “muito desconfortável”. O americano denuncia o empobrecimento dos cidadãos comuns, o que tem gerado descontentamento e agitação social em países como o Brasil.
“Grande parte da nossa sociedade não se beneficia do sistema. Tanto a nível nacional como internacional, os sistemas políticos parecem incapazes de introduzir reformas que criem oportunidades para um futuro melhor”, diz no artigo.
Em outro artigo publicado no site do WEF, o fundador do fórum, Klaus Schwab, também mostra uma pitada de pessimismo, prevendo “um período em que as expectativas diminuem” (as pessoas tendo que viver com menos). Klaus Schwab se diz preocupado que as reformas para resolver a questão da corrupção e das barreiras ao comércio estejam “bloqueadas por poderosos interesses particulares”.
Enquanto Klaus Schwab não dá nenhuma indicação quanto à natureza exata desses “interesses particulares”, eles podem muito bem ser revelados por alguns dos principais participantes esperados este ano em Davos, que inclui chefes de Estado, ministros e líderes do setor econômico e financeiro.
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O Fórum de Davos por trás das lentes
Omeletes
Outra grande preocupação é o fato de que as economias da Europa, Estados Unidos, China e Japão são infladas artificialmente por dinheiro barato distribuído por governos ou bancos centrais, que se baseiam, em muitos casos, sobre taxas de juro tão baixas que não seriam sustentáveis a longo prazo.
A dívida pública maciça e o desemprego desenfreados são “duas grandes sombras que pairam sobre a Europa”, disse Janwillem Acket. Para este último, os governos se tornaram “preguiçosos” na introdução de reformas que reduzam o nível de gastos e estimulam o mercado de trabalho.
Janwillem Acket acaba apelando a uma metáfora culinária: “Todo mundo na Europa adora omeletes, mas ninguém gosta de quebrar os ovos”, diz, se referindo às reformas difíceis que poderiam ser dolorosas a curto prazo antes implantar seus efeitos benéficos.
No ano passado, a frustração em torno da natureza fragmentada e localizada da legislação dos bancos criou muito mais confusão do que resolveu o problema. Este ano, os mesmos argumentos podem ser ouvidos novamente, já que vários países continuam adotando medidas para evitar que os bancos puxem a economia para baixo.
Como em 1914
No plano político, as tensões diplomáticas entre China e Japão são apenas um dos vários problemas geopolíticos que podem surgir a qualquer momento e desestabilizar a recuperação econômica global.
Daniel Woker, ex-embaixador da Suíça na Austrália, Cingapura e Kuwait, acredita que é possível traçar alguns paralelos entre a situação na região da Ásia-Pacífico em 2014 e a Europa de 1914.
Comparando a China moderna ao Império Alemão de cem anos atrás, Daniel Woker acha que o surgimento dessas duas potências constitui de maneira similar um desafio à ordem mundial estabelecida. E a presença de um país imprevisível como a Coreia do Norte na região, aumenta ainda mais o risco, como uma fagulha em um barril de pólvora.
“Nenhuma potência mundial quer um conflito, mas era possível dizer a mesma coisa em 1914. Os conflitos nem sempre começam de uma maneira lógica. Às vezes, eles começam pequenos e acabam fora de controle”, diz o embaixador suíço.
Ao contrário do Oriente Médio e do norte da África, onde os conflitos ficaram confinados à região, a Ásia-Pacífico se tornou tão importante no nível mundial que o risco de propagação é muito maior, acrescentou.
Adaptação: Fernando Hirschy
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