Dinheiro de ditador haitiano continua guardado na Suíça
Mais de 30 anos após a queda de Jean-Claude Duvalier, o Haiti ainda espera recuperar a fortuna que o ditador e sua família depositaram na Suíça. O atraso se deve a intrigas jurídicas em andamento nos tribunais suíços.
Por 15 anos, Jean-Claude Duvalier aterrorizou o Haiti, gastando milhões de dólares para financiar seu estilo de vida extravagante. Os crimes cometidos por “Baby Doc” entre 1971 e 1986 chegaram aos livros de história. Mas, na realidade, essa história está longe de terminar: a população haitiana ainda espera os milhões de dólares que o clã Duvalier escondeu em bancos suíços.
Funcionários do governo e os tribunais têm lidado com esta questão há mais de 30 anos. O Tribunal Administrativo Federal recentemente rejeitou uma reclamação dos herdeiros de um ex-ministro haitiano, que queria que milhões fossem descongelados. O veredicto marca o capítulo mais recente na história sem fim da sorte do regime de Duvalier.
Já em 1986, Porto Príncipe enviou um pedido de assistência jurídica à Suíça. Foi só em 2002 que o Conselho Federal do governo suíço decidiu congelar os fundos Duvalier nos bancos de Genebra, Vaud e Zurique – um total de CHF7,6 milhões ($ 8,3 milhões). Em 2009, o Escritório Federal de Justiça anunciou que o dinheiro seria devolvido ao Haiti. Um ano depois, porém, o Supremo Tribunal Federal anulou a decisão após uma reclamação dos Duvaliers. Em 2011, a Secretaria da Fazenda Federal requereu o confisco dos bens.
“Barões da ditadura”
Além dos Duvaliers, pessoas ligadas ao clã também depositaram milhões em bancos suíços – os chamados “barões da ditadura”. Por exemplo, Frantz Merceron, Ministro da Economia, Finanças e Indústria da República do Haiti de 1982 a 1985. No Relatório St FleurLink externo, publicado em 1987 pelo Ministro da Justiça haitiano, ele foi descrito como um banqueiro dos Duvaliers que ajudou a desviar fundos públicos e que acompanhava o ditador em suas viagens de compras no exterior.
Em 2015, a plataforma de denúncias SwissLeaksLink externo revelou pela primeira vez que Merceron tinha uma conta no banco HSBC. Cinco anos depois, o Tribunal Administrativo Federal descobriu que o ex-ministro também era cliente do Credit Suisse em Genebra
A conta era controlada pelo Opaline Group Services SA, uma empresa panamenha fundada em novembro de 2000, quatro meses antes de começar o relacionamento comercial com o Credit Suisse. Em outubro de 2001, mais de CHF6 milhões foram transferidos para o banco de outra conta operada pela Fundação Opaline com sede em Liechtenstein.
Em resposta a um artigo publicado em 1986 pelo Le Monde Diplomatique, que detalhava a “privatização do Estado haitiano” e a sistemática apropriação indébita de fundos pela dinastia Duvalier, o ministro Merceron escreveu que os ativos eram “de natureza puramente privada, fundos que foram economizados por um longo período de tempo e são documentados. ”
Em 2005, Frantz Merceron morreu repentinamente. Sua viúva Muriel se tornou a beneficiária da conta do Credit Suisse, que em 2011 ainda detinha mais de € 4 milhões. O Conselho Federal decidiu bloquear essa conta em 2012, o que o Supremo Tribunal Federal confirmou, apesar de uma reclamação de Muriel Merceron e Opaline Group Services AG.
No início de 2020, o Departamento de Finanças finalmente deu o primeiro passo para restaurar os ativos da Merceron para o Haiti, ordenando que os milhões fossem confiscados. Muriel Merceron morreu um dia após essa decisão.
Os descendentes de Merceron, juntamente com a Panamanian Opaline Group Services, contestaram essa decisão. Mas o Tribunal Administrativo Federal recentemente julgou improcedente a denúncia, julgando que os ativos estão em nome de Opaline e afastou os descendentes dos Merceron do processo.
De acordo com o Registro Comercial do Panamá, o administrador de ativos Arturo Fasana e o advogado de Genebra Dante Canonica são os diretores do Opaline Group Services SA. Assim como os descendentes de Muriel Merceron, a empresa é representada por Laurent Moreillon.
*Fundado pelos jornalistas investigativos Marie Maurisse e François Pilet, Gotham CityLink externo é um boletim informativo que enfoca a fiscalização legal e o crime econômico. A cada semana, a Gotham oferece aos assinantes relatórios sobre casos de fraude, corrupção e lavagem de dinheiro vinculados ao setor financeiro suíço, com base em documentos legais acessíveis ao público. A cada mês, a equipe seleciona um de seus artigos, que oferece gratuitamente aos leitores do SWI swissinfo.ch.
Adaptação: Clarissa Levy
Adaptação: Clarisse Levy
Certificação JTI para a SWI swissinfo.ch
Mostrar mais: Certificação JTI para a SWI swissinfo.ch
Participe da discussão