Sara Ribeiro: A petite-couturière portuguesa de Monthey
Nasceu e viveu toda a sua vida em Lousada, no distrito do Porto. Nunca tinha saído de Portugal até que há 13 anos se mudou para Monthey, no cantão do Valais. O seu marido chegou em agosto de 2004 e Sara Ribeiro chegava no mês de novembro desse mesmo ano, acompanhada pela filha e o filho.
Após cerca de cinco anos a trabalhar como costureira, decidiu agarrar a oportunidade e fundar a sua própria empresa de costura. Em 2009 abria a porta da sua loja Mágique CoutureLink externo, no centro de Monthey. Numa manhã de folga, a swissinfo.ch esteve à conversa com Sara na sua loja.
Em Lousada, Sara tinha dois táxis, em conjunto com o seu marido, e fazia trabalhos de costura em casa, de forma independente. O saber-fazer associado à costura herdou da mãe, que geria uma pequena confecção. Quando a fábrica encerrou, Sara optou por ficar com as máquinas de costura e os ferros de engomar industriais para dar continuidade a essa arte que sabia praticar. Na sua vida orbitou sempre em redor das agulhas e linhas, “praticamente trabalho desde os 11 anos nesta área”, recorda.
Um tio do seu marido vivia na Suíça e, através dele, tiveram ajuda para se mudarem para o país helvético. Nesses primeiros meses, ele acabou por ser a ponte entre eles e a realidade local. Quando Sara começou a procura de emprego, entregou o seu currículo noutro atelier de costura. Durante cinco anos esteve empregada nesse estabelecimento. No entanto, o trabalho aumentava, mas a sua patroa não lhe subia o salário, justificando-o pela ausência de certificado profissional: “Eu não tenho certificado, mas não tenho qualquer problema em trabalhar ao lado de pessoas que tenham”, mostrando confiança nos seus atributos.
O início da loja
Quando tomou a decisão de abrir a sua própria loja, foi incentivada por várias pessoas que diziam que as suas mãos tinham imenso talento. No começo, teve algum receio de perder o emprego e o negócio não chegar a bom porto, “mas não me arrependi. Não tive um único dia sem trabalho”, sorri-nos orgulhosa.
Sara Ribeiro conta-nos que a sua anterior entidade patronal a proibiu de fazer publicidade à sua loja enquanto esteve a trabalhar. Por isso, numa sexta-feira deixou aquele emprego e, no fim-de-semana, andou a distribuir panfletos em parques de estacionamento e cartões-de-visita em lojas de roupa. Esse esforço foi recompensado e, “hoje em dia, trabalho com todas as lojas de roupa, bombeiros, polícia municipal de Monthey, para além dos clientes particulares”.
Para Sara, todo o processo foi bastante simples, também porque entregou o processo à sua contabilista e apenas teve de assinar documentos, “há assuntos que uma pessoa tem de tratar, mas não sabe o que é”, confidencia-nos. Por isso, solicitou o auxílio de alguém com experiência. O agente imobiliário foi compreensivo com a sua situação e realizaram um contrato de aluguer de um ano, não obstante ser habitual três, cinco ou dez anos. No final do primeiro ano, a situação contratual foi reavaliada, mas “como a imobiliária está em frente da minha loja, ele via que tudo estava a correr bem e renovou-me automaticamente por cinco anos”.
O dia-a-dia entre linhas, tecidos e agulhas
Para a nossa entrevistada a diversidade de trabalho é uma constante. Sara não esconde que haja mais clientes a socorrerem-se dos seus serviços para efetuarem alguns arranjos nas roupas: bainhas de calças, mangas, apertar calças e saias, entre outros. Em virtude da sua versatilidade, Sara Ribeiro recebe também pedidos para fazer cortinados, forrar estofos em napa e fazer roupa por medida. Quando lançamos o desafio de nos dizer qual foi o pedido mais complicado de concretizar, não hesita em apontar um fato de noivo, “foi bastante exigente e não permite jogar tanto com o preço como um vestido de noiva. O noivo ficou muito feliz, enviou-me fotografias e tudo, mas se eu tivesse contabilizado todas as horas de trabalho, ele não me poderia pagar”, sorri.
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“Se você está disposto a trabalhar só pode dar certo”
Neste momento, a nossa entrevistada é a única costureira de Monthey. Isso tornou-se um fator importante para que fosse cada vez mais requisitada, inclusivamente por autoridades oficiais. Habitualmente ajusta as fardas dos polícias municipais e bombeiros e coloca as insígnias para cada atividade, “a comuna pediu-me um orçamento e desde então, trabalho com eles. Estão satisfeitos com o meu trabalho”.
Graças a ter trazido as máquinas de costura industriais consigo de Portugal, recorre aos serviços de reparação no país luso. Sara diz que não encontra na Suíça francófona empresas de máquinas de costura, “apenas há na parte alemã, mas como não falo a língua e tenho confiança no trabalho em Portugal, continuo a socorrer-me deles”, mesmo que seja um pouco mais dispendioso.
Relativamente ao futuro profissional, Sara Ribeiro assume que a dimensão da loja que tem e o volume de trabalho são suficientes para si. Não pretende expandir o negócio, mesmo quando algumas pessoas a incentivaram. Algumas senhoras portuguesas têm ido ter consigo em busca de trabalho, mas Sara diz-nos que não são costureiras porque, “na sua maioria trabalharam em confecções, na produção em série. Por isso, não sabem trabalhar em qualquer área da costura”. Contudo, não fecha a porta, até para que fosse possível ter alguma redução de trabalho e efetuar as entregas num espaço de tempo mais reduzido.
Os clientes
Sara Ribeiro diz-nos que a sua clientela é diversificada, “tenho de tudo, suíços, portugueses, outras nacionalidades. Mas digo-lhe já que os portugueses não são os melhores”. Convidamo-la a desenvolver um pouco essa observação e não vacila em afirmar que os emigrantes portugueses, tendencialmente, procuram regatear mais o preço e são exigentes com o trabalho. Por seu lado, os clientes suíços reconhecem a qualidade do trabalho e quando aceitam o preço, mantêm-no até ao fim. Na sua opinião, são mais generosos e partilha conosco que no natal e no seu aniversário oferecem-lhe sempre alguma recordação, “mesmo quando estive no hospital, mandaram-me muitas flores, quase parecia um funeral”, partilha a sorrir.
Apesar de a tendência em Portugal estar a mudar, Sara ficou surpreendida pelas pessoas na Suíça procurarem arranjar as peças de roupa em detrimento de colocarem no lixo e comprarem novo, “aqui têm outra mentalidade. Com cerca de 30 francos já se compra umas calças novas, mas as pessoas preferem arranjar”. Por esse motivo, Sara Ribeiro também sente que é mais agradável fazer negócios com os suíços, “as pessoas não são tão quadradas, ainda dão importância à qualidade e valorizam o trabalho que faço”.
Monthey é o seu lugar
A nossa entrevistada recorda-se que chegou num sábado de novembro e que de imediato lhe agradou ver as lojas fechadas. Na sua opinião, é uma questão de organização da comunidade e ela sente-se confortável neste sistema, “ao domingo é para estar em família, a descansar porque na segunda é dia de trabalho”, atira. Em Monthey, a nossa entrevistada sente-se em casa e não troca a vila por outro lugar na Suíça, “estamos bem localizados, a uma hora de Genebra, o Lago Léman é próximo. É um cantinho sossegado e bonito”.
Embora pague bastantes impostos e o custo de vida seja elevado na Confederação Helvética, Sara reconhece que a qualidade de vida não se compara com Portugal. Sem qualquer contrição, partilha conosco que não tem qualquer intenção de regressar ao país natal, “o meu marido se pudesse ia já, mas eu gosto muito de estar aqui”. Para além disso, os seus filhos cresceram no Valais e voltar para Portugal é uma ideia que não lhes faz sentido.
Sara Ribeiro encontrou o seu lugar para viver e trabalhar. Já não se sente emigrante, de tal forma se sente integrada na comunidade. Portugal é apenas um destino de férias e uma miragem no horizonte. As pessoas de Monthey vão continuar a ter a sua petite-couturière por muito tempo.
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