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“Não saio daqui nem morto!”

A mercearia Trancosense está na Rue de Carouge, em Genebra, há mais de 20 anos. Nelson Pereira

Por que gosta assim tanto da Suíça? Manuel de Almeida não tem hesitações: “Quando aqui cheguei em 1985 foi muito difícil e estive mesmo para me ir embora, mas hoje gosto muito de Genebra e nada me faria voltar para Portugal.” 

O proprietário da Casa Trancosense, a popular mercearia portuguesa da Rue de Carouge, gosta do ambiente pacato e bairrista da cidade. Diz que “aqui é tudo simples, tudo à medida das pessoas, está tudo perto”, e não poupa louvores ao país que o acolheu: “Aprecio muito o funcionamento das instituições suíças – até dá gosto pagar a tempo os meus impostos sabendo que o reembolso chega sem falta na data certa, uma pessoa sente-se respeitada”. 

Ganhou raízes fundas na cidade mais internacional da Suíça, onde conheceu a mulher e nasceram os dois filhos. “Têm 22 e quatro anos e meio e nunca nos deixariam sair daqui, isto é a terra deles, o mais velho tem toda a vida e os amigos dele aqui, sente-se suíço, gosta do país”, explica. E se Portugal estivesse melhor? Perde o sorriso por uns instantes para responder que “o nosso país poderia ser um lugar muito melhor para se viver, mas não temos sorte com os nossos políticos, há demasiada corrupção, não pensam no interesse do país”, mas remata que não é homem de se queixar e que gosta de viver feliz com a vida que tem.

 É o único da família que saiu de Portugal. Veio de Resende, no distrito de Viseu, a terra das célebres cavacas, que hoje vende na mercearia, a par de muitos outros produtos portugueses: “Recebo todas as semanas chouriços, requeijão, grelos, agriões, castanhas e muitos outros produtos de Portugal, mas 60% dos meus clientes não são portugueses”. A Trancosense tem mais de mil e quinhentos produtos à venda. Dos legumes frescos a uma nada modesta oferta de vinhos, que o resendense faz questão de explicar que não é só de Portugal: “Tenho aqui cerca de 85 vinhos portugueses e mais de 70 estrangeiros.”

Talento de psicólogo

Não esconde um grande apego aos seus clientes. A Casa Trancosense atrai os habitantes da Rue de Carouge e redondezas mas também tem clientes que vêm especialmente de França. “Entram aqui por dia cerca de 250 pessoas”, diz Manuel de Almeida, orgulhoso de ter conquistado a confiança de tanta gente. “Os meus clientes dizem que enquanto esta loja existir não querem saber de hipermercados”, sublinha com satisfação, acrescentando que este trabalho tem um segredo: “É preciso ter talento de psicólogo, ter muita paciência e gostar das pessoas. Vem aqui todos os dias uma velhinha de oitenta e tal anos comprar o pão e tudo o mais que precisa. Noutro dia dizia-me: ‘vou deixar o meu marido, é muito difícil de aturar’. Estava mesmo zangada e eu fiquei ali de conversa com ela ‘E para onde iria? Isso amanhã passa, vizinha’ – ela queria ter com quem falar, as pessoas precisam que alguém as escute.”

Manuel de Almeida diante de sua mercearia em Carouge, Genebra. Nelson Pereira

A Trancosense existe na Rue de Carouge há mais de vinte anos e até já teve publicidade na televisão pública portuguesa. Na era da tirania das grandes superfícies, esta mercearia é um espaço especial, onde os clientes se sentem acolhidos, conhecidos, apreciados, um lugar com espírito de bairro. Sem dúvida em grande parte graças a este homem, que com a sua loja dá um bom exemplo de integração no país que o recebeu. Manuel de Almeida comprou o estabelecimento em 2005, mas durante uns anos manteve a empresa de entregas a domicilio que tinha criado e que chegou a ter seis motoristas. “Fazíamos entrega de flores, chocolates, presentes, o que fosse necessário”, recorda, acrescentando que só vendeu a empresa porque era demasiado trabalho. Passou então a trabalhar com a mulher e um empregado nesta loja e noutras duas que entretanto abriu noutros pontos da cidade.

Segue com muita atenção tudo o que vai acontecendo em Portugal e visita regularmente a família que lá deixou, mas é em Genebra que “Manu”, como lhe chamam os amigos, quer ficar: “Depois de uma vida a batalhar, consegui estabelecer uma casa que todos respeitam e sou muito feliz com os meus clientes”. Olhar vivo, não lhe escapa nada e volta à carga: “Está admirado? Sou um homem feliz, sim senhor. Pergunte aos meus clientes e eles lhe dirão.”     

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