Genebra é mais uma vez palco de importantes conversações
O encontro de cúpula entre Putin Biden é um voto de confiança à Suíça. Graças ao diálogo entre os líderes dos EUA e Rússia, a chamada "Genebra internacional" volta a ter importância no palco diplomático.
Foi um golpe do destino: o encontro de Joe Biden e Vladimir Putin em Genebra foi uma das maiores histórias de sucesso diplomático do governo suíço nos últimos anos. O país alpino está agora centro das atenções internacionais, como mostra esse tweet publicado pelo canal televisivo CBS:
Switzerland isn’t just known for chocolate and army knives.@NorahODonnellLink externo reports from Geneva ahead of the Russia-U.S. summit on why the city continues to create the space for diplomacy. pic.twitter.com/gHZE7nVXFQLink externo
— CBS Evening News (@CBSEveningNews) June 16, 2021Link externo
E o momento é propício: a pandemia parece estar chegando ao seu fim.
É o retorno à normalidade, inclusive nos circuitos diplomáticos. A pressão para voltar a encontrar-se fisicamente cresce – e a conferência de cúpula russo-americana é um sinal de partida para esta nova fase. Para a chamada “Genebra internacional”, como se autodenomina a metrópole suíça localizada às margens do lago Léman para definir seu perfil de centro importante de organizações internacionais o encontro tem uma importância que não pode ser subestimada: o retorno da política internacional aos seus canais habituais parece lógico apenas em retrospectiva.
Antes o governo se preocupava com a possível perda de importância de Genebra e seu perfil multilateralista. O deslocamento de conferências, reuniões e encontros para os canais digitais foi uma ameaça real, o que foi registrado com tanta preocupação na capital Berna como na cidade de Calvino.
Coração do multilateralismo
Mas, ao que parece, tradições não desaparecem com facilidade. Ao mesmo tempo, a Suíça não permaneceu inativa. De um ponto de vista logístico, o país aproveitou da sua vasta experiência e se adaptou às novas circunstâncias. Graças a seus contatos internacionais, a “Genebra internacional” manteve seus trunfos como centro político: política e ciência interagem em um terreno fértil de inúmeras organizações internacionais, institutos acadêmicos e uma sociedade civil, o mais importante patrimônio de Genebra.
O coração do multilateralismo é, sem dúvida, a presença da Organização das Nações Unidas (ONU), que por si só realiza mais de doze mil encontros, assembleias e reuniões por ano na sua sede, o Palácio das Nações. Só seu secretariado ocupa pouco mais de 3.500 funcionários. Enquanto grandes decisões são tomadas na principal sede em Nova York, a organização em Genebra ajuda a estabelecer padrões internacionais que afetam a vida cotidiana das pessoas ao redor do mundo, sobretudo graças também ao apoio de centenas de ongs altamente especializadas.
Todavia, a concorrência é acirrada. As representações da ONU estão localizadas em cidades como Nova Iorque, Genebra, Viena e Nairóbi. Mas também há dezenas de escritórios especiais espalhados pelo mundo. Dentro da organização há uma pressão crescente para projetar um sistema de rotação para que os funcionários não ocupem exclusivamente postos em países com alto padrão de vida. Naturalmente, locais fora do chamado Primeiro Mundo esperam que essa visão aumente sua importância.
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A Suíça está ciente. Genebra procura agora atrair mais organizações internacionais. A chamada política de país-anfitrião é um ponto focal da política externa da Suíça. E mesmo antes da pandemia, foi decidido fortalecer ainda mais Genebra para o exercício do multilateralismo em espaços digitais.
Por último, mas não menos importante, o dinheiro também é investido para financiar reformas ou novas construções. Desta forma, as organizações estarão ligadas a Genebra a longo prazo. Isto também beneficiará delegações de países mais pobres, que até então evitavam se instalar na cidade de Calvino devido ao elevado custo de vida. Um exemplo ocorreu quando a Suíça convidou pequenos países insulares do Pacífico a estabelecer missões permanentes em Genebra. O objetivo é fortalecer ainda mais a universalidade da cidade e, por outro, criar amizades políticas que podem se beneficiar de alianças estratégicas em processos decisórios multilaterais.
Assim, quando o mundo volta os olhos à Genebra e assiste a reunião de cúpula entre Putin e Biden, vê apenas o iceberg da política internacional que é moldado no local diariamente.
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Capital político
As relações entre os EUA e a Rússia está no seu mais baixo nível. Mais um motivo para a Suíça estar orgulhosa de ter trazido o encontro de cúpula para os Alpes. Quando Joe Biden anunciou que queria conhecer Vladimir Putin, outros países também se ofereceram para organizar o encontro. Mas a Suíça é valorizada como mediadora por ambas as partes: a Suíça representa os interesses do Irã nos EUA e da Geórgia, na Rússia.
Os círculos diplomáticos dizem que a Suíça goza de boa reputação, especialmente entres russos. O fato de ter como política central a “neutralidade” e não ser membro do Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e da União Europeia a torna interessante.
Quando eclodiu o conflito no leste da Ucrânia, a Suíça, como presidente da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), manteve numerosas conversações com a Rússia. O ministro suíço das Relações Exteriores (EDA, na sigla em alemão) estava em contato estreito com Moscou. Criam-se, dessa forma, laços importantes.
O presidente da Confederação Helvética, Guy Parmelin, e o ministro Ignazio Cassis (EDA) avaliam o encontro de Joe Biden e Vladimir Putin como uma forma de “agradecimento”. É um gesto habitual para o país-anfitrião e, sem dúvida, um momento oportuno para levantar pontos importantes no mais alto nível. Guy Parmelin sondou o presidente americano sobre um possível acordo de livre-comércio. Também se falou muito sobre o Irã, acrescentou Cassis.
Sobre as conversações entre a Suíça e a Rússia, por exemplo, diz-se que o objetivo é “cultivar um diálogo construtivo, mas também crítico, a fim de fortalecer ainda mais as relações entre os dois países”. Estrategicamente, a Suíça está sempre interessada em mandatos adicionais para exercer seus bons ofícios, uma área no cenário diplomático internacional onde a concorrência é cada vez maior.
A escolha de Genebra para o encontro de cúpula é um sinal de confiança, ressaltam os círculos diplomáticos. Foi uma recompensa não apenas à Suíça por conseguir organizar um evento político tão importante, mas também à sua discrição.
Adaptação: Alexander Thoele
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