Superministro de Bolsonaro dá seu show a portas fechadas
Se a desenvoltura política do presidente brasileiro deixou muito a desejar em sua primeira participação internacional, seu ministro da Economia, Paulo Guedes, trabalhou intensamente nos bastidores, cortejando investidores e CEOs internacionais.
No saguão do Centro de Conferências de Davos, a fila era grande. Empresários, políticos, banqueiros e jornalistas de todo o mundo aguardavam para entrar no salão onde o presidente Jair Bolsonaro faria seu primeiro discurso à comunidade internacional, na última terça-feira. Sem a presença de Donald Trump, Emmanuel Macron e outros lideres, o brasileiro havia se transformado na principal estrela
Todos os holofotes estavam direcionados a ele. A plateia, praticamente lotada.
Mas, se ele tinha 45 minutos para falar, a oportunidade não foi usada como os organizadores esperavam. Lendo pelo teleprompter, Bolsonaro discursou por meros seis minutos, não deu detalhes de praticamente nenhum de seus planos e apenas repetiu generalidades.
Ao terminar, os aplausos foram escassos. O fundador do Fórum, que agia como anfitrião, já tinha algumas perguntas organizadas para Bolsonaro que, a cada uma delas, buscava em fichas pre-preparadas as respostas engessadas.
No total, foram 15 minutos no palco principal de Davos. Tempo suficiente apenas para que o Brasil dissesse que quer abrir sua economia, fazer reformas, respeitar contratos e “liberar” o Pais das “amarradas ideológicas”.
Bolsonaro, com um grupo de assessores inexperiente, deixou muita gente frustrada em Davos. “Ele me da medo”, disse o prêmio Nobel de Economia, Robert Schiller. “O Brasil merece alguém melhor”, insistiu o académico que, dias depois, confessaria que passou a ser bombardeado por ofensas na Internet por parte de apoiadores do presidente brasileiro.
A viagem ainda marcada por cenas pouco comuns em Davos. Numa cidade que reunia 3,5 mil líderes mundiais das finanças, multinacionais e políticos, Bolsonaro optou por usar seu tempo para almoçar em um bandejão de um supermercado local. Sozinho.
Se o capítulo público de Bolsonaro em Davos decepcionou a audiência, a real estreia do Brasil ocorreu atras das portas fechadas, e com a participação de Paulo Guedes, ministro da Fazenda.
Sua importância foi central durante a semana para detalhar aos CEOs das grandes empresas o que faria para transformar o ambiente de negócios no Brasil. Um de seus discursos chegou a ser qualificado como “um show” por parte de um empresário internacional.
Num outro encontro com Nestlé. Arcelor Mittal, Embraer e algumas das gigantes da economia mundial, Guedes uma vez mais roubou o show, dando detalhes das reformas que faria na previdência e privatizações. Seu discurso soou como música aos investidores.
Na quarta-feira, num almoço com empresários, Bolsonaro e Guedes uma vez mais faziam uma ofensiva de sedução. Mas, quando o presidente viu que seu ministro das Finanças havia deixado a sala para outros encontros, mandou seus assessores o buscarem e voltar a coloca-lo na sala.
Outra estratégia da delegação brasileira era a de colocar um fim à imagem de um país manchado profundamente pela corrupção. Para isso, Bolsonaro levou para Davos o ministro da Justiça, o ex-juiz Sérgio Moro. Sua presença para falar de ética foi interpretada como uma tentativa do governo de mostrar que tem um fiador.
Mas o que poucos contavam nessa estratégia era com a sombra que os escândalos envolvendo seu filho, Flavio Bolsonaro, colocaria sobre a viagem e sua credibilidade. Seus ministros foram instruídos a não tocar no assunto e o próprio presidente, que deveria usar Davos para dar sua mensagem, passou a se esconder em seu hotel.
Ele cancelou a única coletiva de imprensa que havia marcado e, numa rara entrevista com um meio do mercado financeiro, foi surpreendido por uma questão envolvendo seu filho. Numa outra conversa com o Washington Post, surpreendeu a pessoa que o entrevistava afirmando que “os militares salvaram o Brasil de uma potencial ditadura” em 1964.
Se sua promessa era de que o Brasil faria comércio com todos os países, “sem viés ideológico”, sua agenda de encontros bilaterais em Davos privilegiou um diálogo com economias pouco expressivas, mas governadas pela direita ou extrema-direita. Entre eles estavam a Polônia e a República Tcheca, que o convidaram para a cúpula dos países do Leste Europeu que se organiza em Praga no segundo semestre e que visa reforçar uma visão de controle das fronteiras.
Ao final, o que era para ter sido a estreia mundial de Bolsonaro, não passou de um reconhecimento de que uma legitimidade internacional ainda terá um longo caminho a ser percorrido.
Luciano Huck, apresentador de TV e que também esteve em Davos, não deixou dúvidas de que há uma necessidade clara de “rever as expectativas” em relação ao governo Bolsonaro e que o maior teste que ele terá será o de implementar o que prometeu aos empresários em Davos.
Ao final da viagem, sem ter respostas a algumas das crises que já assolam seu governo, Bolsonaro optou por evitar a imprensa, nem mesmo para fazer uma avaliação de sua primeira missão ao exterior, três semanas depois de assumir o maior país da América Latina.
Ao deixar Davos na quinta-feira, ele saiu pela garagem do hotel onde estava hospedado. Longe dos holofotes da imprensa.
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