Paz trabalhista suíça comemora 75 anos
Assim como o federalismo, a neutralidade ou a tradição humanitária, a ordem social é considerada como um dos pilares da "exceção suíça". 75 anos após a assinatura do primeiro acordo de paz trabalhista, este modelo sofre diversas críticas.aujourd’hui soumis à rude épreuve.
No final de outubro, em Tolochenaz, sede da Federação de empresários do cantão de Vaud (oeste), patrões, sindicalistas, acadêmicos e políticos discutiam o futuro das relações sociais na Suíça. A conferência é marcada por trocas educadas, argumentos frequentemente partilhados em ambos os lados e o desejo de preservar um modelo de 75 anos de idade.
Esse relacionamento pacífico, cuidadosamente mantido desde 1937, surgiu com o primeiro acordo de paz trabalhista assinado entre os sindicatos e os empregadores do setor relojoeiro.
Para o historiador Olivier Meuwly, a situação trabalhista atual é o resultado “de um fenômeno construído no qual os suíços aprenderam a administrar seus conflitos e encontrar soluções”.
O mesmo vale para Christophe Reymond, diretor do Centre patronal (CP): “A paz trabalhista e as convenções coletivas de trabalho (CCT), que constituem seu substrato, não são o resultado de um sistema ou de uma ideologia, mas ao contrário, o de uma prática empírica. Este modelo permitiu negociar soluções para a realidade de cada setor econômico, sem a intervenção do governo. Hoje, 1,8 milhões de trabalhadores estão submetidos a 620 CCT, na Suíça”.
Modelo de sucesso
Embora muitas autoridades presentes no encontro façam a ligação entre paz trabalhista, prosperidade e estabilidade política da Suíça, o historiador Bernard Degen lembra que a Suíça não tem atuado como pioneira na questão da ordem social. “No início do século XX, apenas as pequenas empresas assinavam as CCT. Esse número era muito maior na Grã-Bretanha e na Alemanha”, disse.
Segundo o historiador, o nexo de causalidade entre prosperidade e ordem social não pode ser estabelecido. “Alguns países enfrentaram grandes greves, como a França dos anos 60, e cresceram mais do que a Suíça”. Com um pouco de ironia, o historiador acha que “o número de dias passados em negociações na Suíça custaram certamente mais caro do que os dias perdidos com greves em outros países”.
Para o consultor francês Henri-Jean Tolone, entretanto, a paz trabalhista parece mais com uma pax atomica. “Os patrões temem que suas empresas sejam bloqueadas e os trabalhadores temem que as empresas se mudem para o exterior. É o Terror”, disse.
Mudanças profundas
Já o professor Yves Flückiger, da Universidade de Genebra, acha que a paz trabalhista, juntamente com a diversificação da economia e os ganhos de produtividade ajudaram a Suíça a resistir melhor à crise econômica do que os seus vizinhos. “A evolução da taxa de desemprego e os níveis salariais estão fortemente ligados, permitindo uma melhor absorção dos choques de competitividade. Uma situação que deve muito à descentralização da negociação salarial”.
Patrões e sindicatos concordam, porém, que uma certa visão pragmática da ordem social e das virtudes da negociação custam a decolar nos dias de hoje. Secretário Regional do sindicato UNIA, Alessandro Pelizzari acredita que as profundas mudanças no mundo do trabalho – terceirização, precarização, feminização e principalmente a livre circulação – observadas durante os últimos 20 anos, bem como a financeirização da economia que acompanhou a mudança ideológica para a neoliberalismo, desestruturaram e desorganizaram sindicatos e organizações patronais.
Secretário da Federação dos empresários de Vaud, Pierre-Michel Vidoudez chega à mesma conclusão: “O empresário agora não passa de um interlocutor financeiro, um mercenário. Ele está perdendo a sua ligação com o trabalho. Essa tendência ameaça ao paz trabalhista e a ordem social”. Para ele, “o que faz a atratividade da Suíça, não é a ausência de greves, mas um mercado de trabalho liberal que permite às empresas estrangeiras contratar e demitir como bem entendem”.
Politização do diálogo
Citando o recente fechamento do polo Merck Serono em Genebra, Alessandro Pelizzari argumenta que a internacionalização do capital e dos patrões – 50% das empresas suíças são administradas por empresários estrangeiros – levou a uma renovação do conflito. Para lidar com a falta de parceria social, “temos que recorrer cada vez mais às armas da democracia direta”, disse o representante da UNIA.
Essa politização do diálogo social, que é particularmente evidente com o lançamento de muitas iniciativas populares – para seis semanas de férias, introdução de salários mínimos ou redução da diferença salarial – não agrada Sabine von der Weid, da Federação das Empresas Romandas: “Mudar o debate do campo da negociação para o campo político é prejudicial para ambos os sindicatos e empreiteiras. Ambos os lados perdem um canal de proximidade e peso na negociação. Isso poderia prejudicar o futuro da paz social”.
Um contrato coletivo de trabalho (CCT) é um acordo entre as organizações de trabalhadores e os patrões ou organizações de empregadores. Este acordo estabelece quais são as condições de trabalho em um determinado setor e regula as relações mútuas entre os parceiros sociais.
Um CCT contém disposições normativas, especialmente sobre os salários e horas de trabalho, bem como as disposições contratuais relativas aos direitos e deveres de ambos os parceiros, tais como o respeito da paz trabalhista.
Na verdade, apenas metade dos assalariados da Suíça está sujeita a um CCT. Em comparação, essa proporção é de 2/3 na Alemanha, 4/5 na Itália e quase todos os trabalhadores na Áustria. A outra metade dos assalariados depende exclusivamente do direito trabalhista, que é menos desenvolvido na Suíça do que na maioria dos países europeus.
Adaptação: Fernando Hirschy
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