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Rendimento básico para todos é refutado nas urnas

A renda mínima continua sendo uma utopia na Suíça. Keystone

A Suíça não será o primeiro país no mundo a oferecer uma renda básica incondicional a cada um dos seus habitantes. Mais de três quartos dos eleitores rejeitaram no domingo uma iniciativa popular lançada por um grupo de cidadãos. Os temores de incapacidade de financiar uma medida dessas e seu impacto em desvalorizar o trabalho pesaram na balança na hora de votar. 

A proposta não consegui a maioria dos cantões: o eleitor suíço diz “não” ao projeto de renda básica incondicional. Segundo os últimos cálculos, 78% dos eleitores não aprovaram uma das ideias mais visionárias da democracia direta no país nessas últimas décadas. Apenas 23.1% disseram “sim”. A participação eleitoral foi de 46,3%. 

Em um país alérgico às grandes rupturas sociais e intrinsecamente ligado ao valor do trabalho, o projeto de renda básica incondicional não teve praticamente nenhuma chance de obter a maioria de apoio dos eleitores e dos cantões. A confirmação ocorreu já nas primeiras pesquisas – o texto nunca conseguiu conquistar mais de um quarto do eleitorado – e a suspense acabou no domingo, logo após as primeiras contagens dos votos.

Porém os defensores veem os resultados como a “metade cheia de um copo”. “Uma pessoa em cinco votou a favor da renda incondicional de base, ou seja, podemos falar em um sucesso”, declarou Sergio Rossi, professor de economia e membro do comitê de apoio da iniciativa.

Para os promotores da renda mínima – que contam hoje em dia com grupos de apoio nos quatro cantos do planeta – a ocasião era perfeita para lançar o debate na Suíça através do instrumento da democracia direta: a iniciativa popular. E eles primaram pela criatividade. A lista de eventos espetaculares organizados nos últimos três anos pelo comitê da iniciativa é impressionante: oito milhões de moedas de 5 centavos do franco jogadas na rua frente ao Palácio federal (o prédio do Parlamento e sede de alguns ministérios), a distribuição gratuita de notas de 10 francos nas estações de trem, um registro no livro Guinness dos recordes e outros.

Bastante presentes nas redes sociais, os defensores da renda mínima também conseguiram mobilizar os jovens, dos quais um número considerável se mobilizou pela primeira vez por um tema público. O objetivo também foi alcançado no que diz respeito à visibilidade do plebiscito na imprensa nacional e internacional. Raramente uma votação despertou tanto interesseLink externo no exterior: além do lado insólito e utópico, a medita proposta começou a interessar, em diferentes níveis, especialistas e grupos diversos em várias partes do globo. Correspondente do jornal Estado de São Paulo também comentouLink externo os resultados.

Não à mudança de paradigma

Quanto ao mérito, no entanto, os iniciadores nunca foram capazes de convencer os cidadãos a tentar uma experiência que teria induzido a uma mudança radical de paradigmas e criação de um novo contrato social. 

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Nos olhos dos promotores da iniciativa, conceder uma renda básica incondicional a cada indivíduo, do seu nascimento à morte, teria permitido não apenas acabar com a pobreza e a dependência da assistência social, mas também a cada um de escolher um emprego que lhe agradasse, estimular a formação, a criatividade e o voluntariado, assim que valorizar a guarda das crianças e os cuidados com parentes idosos ou doentes. O novo sistema funcionaria em um contexto de automatização e a digitalização crescentes da economia, que ameaça de fazer desaparecer inúmeros empregos.

Os argumentos foram refutados pelos oponentes ao projeto. O principal argumento contrário era a impossibilidade de financiá-lo. Mesmo se nenhuma soma foi articulada no texto da iniciativa, os promotores utilizaram como base de discussão uma renda mensal de 2.500 francos para adultos e 625 francos para os menores de idade. A renda mínima incondicional teria custado dessa forma 35% do produto interno bruto (PIB), um montante qualificado de “estupefaciente” pelos oponentes da iniciativa.

Lançado por um grupo de cidadãos, a ideia da renda mínima também não encontrou apoio nos partidos políticos a não ser com uma exceção: o Partido Verde e a extrema-esquerda. No Parlamento federal, apenas um punhado de representantes dos partidos de esquerda votaram a seu favor. Sem importar a tendência política, as críticas gerais era de que o projeto poderia colocar em perigo o sistema de segurança social do país. “Não é possível apoiar um sistema do qual ninguém sabe concretamente como ele seria colocado em prática”, declarou em várias ocasiões o ministro suíço do Interior, Alain Berset.

Temor dos efeitos migratórios

Nos círculos empresariais e liberais muitos denunciaram a “apologia de falta de responsabilidade e do assistencialismo” propagado aos seus olhos por muitos defensores da iniciativa. Nos cartazes e nas redes sociais, eles não hesitaram em propagar a imagem de um rei indolente, vestido com uma manta branca e caído frente a restos de pizzas, latas vazias de cerveja e um cinzeiro repleto, sugerindo dessa forma que a renda mínima iria encorajar a ociosidade e decadência.

Com base em uma pesquisa realizada no início da campanha, os defensores da iniciativa responderam que apenas 2% dos suíços parariam de trabalhar no caso de introdução da renda mínima incondicional. Aos seus olhos o projeto teria permitido revalorizar os empregos penosos ou ingratos, já que os trabalhadores ganhariam dessa forma uma margem de manobra maior no momento de negociar o seu contrato de trabalho.

Mas um dos golpes mais duros à iniciativa foi dado possivelmente por um dos próprios promotores do texto. Em uma entrevista publicada no final de abril no jornal Tages-Anzeiger, o antigo porta-voz do governo federal, Oswald Sigg, estimava que a renda mínima não poderia ser colocada em prática sem um acordo com os países vizinhos da Suíça. “Não creio ser possível introduzir a renda mínima na Suíça se ela é o único país a fazê-lo. Isso provocaria muito provavelmente um aumento forte da imigração. Mudanças tão profundas só poderiam ser introduzidas em uma rede de países em escala europeia”, declarou.  

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Adaptação: Alexander Thoele

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