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Suíça junta ajuda humanitária e cooperação ao desenvolvimento

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Enfermeiras tratam uma criança, vítima de um terremoto no Haiti em 2010. Keystone / Michael Fichter Iff

O governo helvético anuncia a intenção de fusionar em um órgão a ajuda humanitária e a cooperação internacional para o desenvolvimento. Porém existe uma diferença entre as duas: a ajuda emergencial raramente precisa ser justificada, ao contrário dos projetos de desenvolvimento. O esforço organizacional acaba dando mais brechas para ataques.

Após um devastador terremoto em 2010, a Suíça ajudou a reconstruir muitas escolas no Haiti. Ela enviou especialistas em construção, forneceu às autoridades haitianas projetos de edifícios escolares e treinou pessoal.

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Essa ajuda pode ser considerada como cooperação para o desenvolvimento? Não. Para a Suíça foi ajuda humanitária.

Mudança de cenário: No final dos anos 1990, uma guerra civil estava em curso no Sri Lanka. No calor dos ânimos, a Suíça apoiou a apresentação da peça “Mãe Coragem e Seus Filhos” – um drama de guerra de Bertolt Brecht – em tâmil e cingalês. A ideia era sinalizar às pessoas que o país não avançaria sem uma solução de paz. E o que foi isso? Para a Suíça, foi uma cooperação ao desenvolvimento. Sem paz não há desenvolvimento. Essa foi a reflexão transmitida pelo país helvético.

Se isto lhe parece estranho, você não está sozinho. De acordo com uma pesquisa interna realizada pela Aliança Sul, uma rede de organizações suíças de assistência, a maioria das pessoas tem dificuldade em distinguir entre ajuda humanitária e cooperação ao desenvolvimento. Muitos confundem as duas áreas e tendem a perceber o trabalho das ONGs como sendo mais no campo da ajuda humanitária.

“Provavelmente ninguém pensa na cooperação ao desenvolvimento como um projeto de teatro na Birmânia, onde se trata de capacitação e boa governança”, diz Konrad Kuhn, que fez pesquisas sobre política de desenvolvimento e movimentos do Terceiro Mundo. Atualmente o historiador suíço leciona como professor de etnologia europeia na Universidade de Innsbruck, na Áustria.

Kuhn afirma que a cooperação ao desenvolvimento surgiu fluidamente da ajuda humanitária, e hoje as duas áreas estão cada vez mais entrelaçadas uma na outra. E é por isso que muitas pessoas acham difícil diferenciar entre elas.

Tendência internacional para a fusão

O fato de que a ajuda humanitária e a cooperação ao desenvolvimento estão se fundindo cada vez mais não é o resultado de um discurso teórico, mas se desenvolveu na prática. Por exemplo, durante a epidemia de cólera no Haiti, a ajuda humanitária internacional não só interveio a curto prazo com cuidados médicos, mas também sistemicamente com o abastecimento de água. Esta é a única maneira de garantir que a ajuda seja sustentável.

Fluss in Haiti
O rio Meille, no Haiti, próximo a uma antiga base da ONU. Especialistas consideram que membros das forças de paz da ONU originadas do Nepal tenham trazido a cólera para o Haiti. Copyright 2020 The Associated Press. All Rights Reserved

Por outro lado, pode acontecer que uma guerra irrompa repentinamente em um país onde a clássica cooperação ao desenvolvimento estava presente. “No passado, a cooperação ao desenvolvimento deixava o país quando as coisas ficavam ‘muito quentes'”, diz Markus Heiniger, que trabalhou para agências de desenvolvimento suíças por muitos anos. Hoje, diz ele, ela deve permanecer engajada mesmo em situações frágeis. Especialmente porque os conflitos duram mais tempo, e muitas regiões são mais instáveis do que eram há 30 anos.

Segundo Heiniger, esta não é uma discussão puramente suíça: já há algum tempo este desenvolvimento também tem sido uma questão internacional. É chegada a hora de os atores se reestruturarem.

Reorganização da agência suíça

De fato, o Departamento Suíço para a Cooperação e Desenvolvimento (DEZA, na sigla em alemão) está prestes a passar por uma reorganização: os departamentos de ajuda humanitária e cooperação ao desenvolvimento devem ser fundidos até setembro de 2022.

“Por razões históricas, a ajuda humanitária e a cooperação ao desenvolvimento do DEZA são institucionalmente separadas. Entretanto, esta separação faz cada vez menos sentido”, escreve a porta-voz Léa Zürcher, a pedido. Uma avaliação externaLink externo de 2019 recomendou que o DEZA adaptasse sua organização à mudança. Ao contrário da recomendação, entretanto, esta fusão não será feita.

Segundo a agência, este ajuste da ajuda humanitária com a cooperação ao desenvolvimento ocorre nos escritórios de cooperação da Suíça in loco. “Sob a gerência nova diretora, Patricia Danzi, o trabalho conjunto da ajuda humanitária em crises prolongadas e a cooperação ao desenvolvimento também será institucionalmente fundido na sede em Berna”, diz Zürcher. “Isto significa, por exemplo, que o trabalho de ajuda humanitária e cooperação ao desenvolvimento em Mali será coordenado a partir de um único escritório na capital política do país.” Isto permitiria utilizar os instrumentos da cooperação internacional sem interseções e de acordo com o que se precisa, e assim atender melhor às necessidades no local.

Questão sensível

A reorganização (com as correspondentes mudanças de pessoal) não só está causando agitação dentro do DEZA, mas também é politicamente sensível: os dois tipos de ajuda estrangeira gozam de uma imagem muito diferente uma da outra.

Primeiro, nos países receptores. Ali, a ajuda humanitária é vista como mais neutra do que a cooperação ao desenvolvimento, sendo que esta última impõe condições aos Estados receptores e procura mudar as estruturas políticas e sociais. Se as duas forem misturadas, há o perigo de que as partes em conflito neguem o acesso à ajuda humanitária.

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Em segundo lugar, nos países doadores. Entre os partidos de direita a ajuda humanitária é muito mais popular do que a cooperação ao desenvolvimento. “A ajuda humanitária é utilizada a curto prazo e em situações agudas, portanto não é muito controversa internamente”, diz Kuhn. A cooperação ao desenvolvimento e sua eficácia, por outro lado, são frequentemente questionadas.

Por exemplo, uma das críticas de direita é feita pela deputada federal do Partido do Povo Suíço (SVP)  Barbara Steinemann. Ela afirma que as autoridades suíças perderam o foco sobre onde estabelecer as prioridades na cooperação ao desenvolvimento. “Pagamos bilhões de francos no exterior por projetos questionáveis e a Estados corruptos, por conferências internacionais e programas de gênero na agricultura na Geórgia”, diz Steinemann.

E é justo a ajuda humanitária – tão popular entre os de direita – que provavelmente se encontra numa posição mais fraca na fusão do que a cooperação ao desenvolvimento: a Unidade Suíça de Ajuda Humanitária é um corpo de milícias. Parte do pessoal especializado – tais como engenheiras e engenheiros civis, especialistas em engenharia hidráulica ou médicas e médicos especialistas – é destacado temporariamente. De acordo com uma avaliação externa, a Cadeia Suíça de Resgate, que presta assistência em caso de terremotos, já deveria até mesmo ter sido abolida, porque quase nunca entra em ação (a Suíça decidiu contra isso, por enquanto).

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De acordo com o ministério suíço das Relações Exteriores (EDA), já é uma prática comum para o pessoal do DEZA alternar entre posições entre a ajuda humanitária e de cooperação ao desenvolvimento. Embora seja verdade que duas culturas estão sendo fundidas, o trabalho conjunto já é bem estreito atualmente, e a reorganização aumentará ainda mais as sinergias.

No entanto, fica a questão de saber se a cooperação ao desenvolvimento irá quase “assumir” a ajuda humanitária quando elas forem fundidas. Se assim for, a cooperação internacional ficaria ainda mais na mira de ataques da direita do que já está.

Evitando confronto 

Os partidos de esquerda, que tradicionalmente têm sido solidários com a cooperação ao desenvolvimento, veem as coisas de maneira diferente. Por exemplo, para a especialista em política externa (partido Verde) Christine Badertscher – que faz parte do Conselho de Administração da Swissaid, a Fundação Suíça de Cooperação ao Desenvolvimento – todas as áreas da ajuda externa são importantes, e não devem ser jogadas umas contra as outras. “É como uma cascata: a ajuda humanitária é importante após um desastre, mas só funciona a curto prazo. A cooperação ao desenvolvimento ajuda a construir estruturas a longo prazo, para que um desastre não volte a acontecer.”

Em outras palavras, a ajuda humanitária é como um paramédico: funciona de forma rápida, urgente e onde é necessária. A cooperação ao desenvolvimento, por sua vez, é comparável à fisioterapia: funciona de acordo com um plano, a longo prazo e acompanhando o processo. Para ficar saudável, você precisa de ambos.

O DEZA também fala de uma “caixa de ferramentas”: os instrumentos dos diferentes tipos de ajuda devem ser perfeitamente interligados e usados simultaneamente, dependendo do contexto. Pois no final, nas palavras de Heiniger, antigo funcionário do DEZA: “Do ponto de vista das pessoas afetadas, não importa realmente sob que título elas são ajudadas, o importante é que algo aconteça.”

Adaptação: Flávia C. Nepomuceno dos Santos

Diferentes formas de ajuda estrangeira

A ajuda humanitária tem o objetivo de salvar vidas e aliviar o sofrimento após desastres, guerras ou crises. Exemplos: Procurar sobreviventes após um terremoto, distribuir alimentos em uma crise de fome ou fornecer tratamento médico para os feridos em uma guerra.

A cooperação ao desenvolvimento tem como objetivo erradicar a pobreza através do desenvolvimento econômico, e promover os direitos humanos e a democracia. Exemplos: Treinamento de apicultoras e apicultores, ajudando-lhes a vender mel no mercado local; coleta de dados para reduzir a prescrição de antibióticos para crianças; programas de alfabetização, empoderamento das mulheres ou projetos de mudança climática.

A cooperação ao desenvolvimento econômico tem como objetivo impulsionar a economia, em cooperação com o setor privado local e suíço. Responsável por isso é a Secretaria de Estado para Assuntos Econômicos (SECO). Exemplos: Conceder empréstimos a Pequenas e Médias Empresas locais; vincular a adjudicação de um contrato a uma empresa suíça no exterior com treinamento de aprendizes.

A cooperação com a Europa Oriental ou a assistência para transição econômica promove uma economia social de mercado, o Estado de Direito e a democracia nos países da ex-União Soviética e nos Balcãs Ocidentais. Exemplos: Treinamento de funcionários municipais, aconselhamento das administrações financeiras públicas ou reformas no sistema penitenciário.

A promoção da paz visa combater as causas do conflito e proteger os indivíduos da violência, da guerra e da arbitrariedade. Em algumas áreas este trabalho transita fluidamente para a diplomacia. Exemplos: Elaboração de diretrizes internacionais, monitoramento de eleições, bons serviços ou acompanhamento de como trabalhar/lidar com o passado (histórico/sociológico).

Fonte: EDALink externo

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