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Alguns não sabem, mas Portugal também é o pais da ciência

Mulher em um laboratório
Christa Rhiner no seu laboratório no centro de pesquisas da Fundação Champalimaud, em Lisboa. swissinfo.ch

O nível da pesquisa em Portugal é tão elevado, que até a União Europeia premia cientistas lusitanos com bolsas milionárias. Pesquisadores de ponta como a suíça Christa Rhiner aproveitaram as boas condições oferecidas no país para continuar em Lisboa um trabalho científico promissor. Porém no início ela teve de convencer os parentes que não havia motivos para receio.

Em visita à Portugal no início de dezembro, a presidente da Confederação Suíça, Doris Leuthard, e sua delegação tinham uma agenda apertada de encontros oficiais. Mas encontraram tempo para visitar um prédio de arquitetura futurística, localizado às margens do rio Tejo, em Lisboa, poucos metros distantes de dois dos mais conhecidos monumentos do país, a Torre de Belém e o Padrão dos Descobrimentos.

O objetivo era visitar a Fundação ChampalimaudLink externo, uma instituição que abriga um dos centros de pesquisa multidisciplinar no campo da biomedicina mais renomados do continente. O centro, inaugurado em 2008, ocupa hoje uma área de 60 mil metros quadrados com instalações de diagnóstico e tratamento clínico, um amplo jardim exterior e inúmeros laboratórios de investigação. Para apresentá-lo às autoridades, foi escolhida como guia um dos 300 pesquisadores originários de 35 países atuantes no centro, a neurocientista suíça Christa RhinerLink externo

Originária do vilarejo de Neuenegg, próximo à Berna, Rhiner formou-se na Universidade de Berna, fez o mestrado na Universidade de Zurique, o doutorado em neurociência na Escola Politécnica Federal de Zurique (ETH) e Universidade de Zurique e o pós-doutorado no Centro Nacional do Câncer em Madrid. Em outubro de 2016, ela e seu marido, o também pesquisador espanhol Eduardo Moreno, foram convidados pela Fundação Champalimaud para assumir um projeto de pesquisa. 

Cérebros que se autorregeneram

A suíça desculpa-se por não falar o português. No trabalho o idioma que domina é o inglês, como é comum no meio científico. Em seu escritório, com uma janela ampla dando visão para o rio, diversos livros técnicos e relatórios estão espalhados na mesa. Rhiner fala com uma vivacidade quase juvenil das descobertas feitas através das suas pesquisas.

Quando pesquisava na Universidade de Berna, a neurocientista descobriu que o cérebro da “drosophila”, a mosca da fruta, pode formar novas células nervosas após sofrer uma lesão. “Então descobrimos um grupo de células-tronco adultas, que normalmente não são ativas, mas que depois de uma lesão cerebral traumática ‘despertam’ e começam a se dividir e, disso, surgem novas células nervosas capazes de substuir aquelas que foram perdidas ou danificadas”, diz. 

A chegada em Portugal mostra o caminho seguido por muitos jovens acadêmicos. “Eu já fazia parte de um grupo de jovens pesquisadores da drosophilaLink externo. Eu e meu marido tínhamos a impressão que não havia mais potencial de crescimento na Universidade de Berna. Então conhecemos o trabalho feito na Fundação Champalimaud e achamos muito promissor”, lembra-se. Os dois se candidataram às vagas abertas, sendo aceito. Em outubro de 2016, a família chegava em Lisboa. 

O projeto coordenado por Rhiner explora agora quais são os fatores que ativam as células-tronco nas moscas da fruta e como elas formam eficientemente novas células nervosas. Se ela será capaz de encontrar uma tecnologia para aplicar em seres humanos, aumentando a sua sobrevida? “Difícil, pois no cérebro humano também são fabricadas células-tronco neurais após um acidente vascular, mas elas formam muito poucas células cerebrais e dessas, poucas sobrevivem”, avalia. Por isso seu objetivo, e o dos pesquisadores do grupo de pesquisas, é encontrar “maneiras de fortalecer os próprios mecanismos de reparo disponíveis no cérebro, para que a generação possa ocorrer após a lesão do cérebro.”

Jardins na Fundação Champalimaud
Prédio moderno da Fundação Champalimaud às margens do rio Tejo, uma das instituições de pesquisa de ponta mais renomadas em Portugal. swissinfo.ch

Medo dos parentes

Ela conhecia a capital portuguesa só de algumas curtas estadias como turista. Apesar de estar convencida do potencial do seu novo grupo de pesquisas, Rhiner teve de convencer à família na Suíça. “Eles me perguntavam como era possível largar tudo em casa para ir à Portugal com as crianças, onde não há trabalho”, lembra-se, acrescentando que os jornais na época ainda estavam cheios de artigos sobre a crise econômica que levou muitos portugueses a emigrarem. “Porém eu lhe disse que não apenas as condições na fundação eram muito boas, mas que também havia uma visão muito especial nesse projeto.”

Ao chegar em Lisboa, o desafio da família era encontrar escola e moradia em Lisboa para permitir também que se dedicassem às pesquisas. Não imaginavam, porém, que o mercado imobiliário em Portugal estivesse tão aquecido. “A primeira casa interessante foi vendida no dia seguinte a chineses, que nem a haviam visitado. Vimos então que era necessário ser rápidos, pois quase não há imóveis para alugar. Na última tentativa decidimos por uma casa muito bonita na região de Cascais”, diz Rhiner. E o detalhe mais importante é que ela estaria na rota do ônibus escolar que leva os filhos à Escola Alemã, onde são alfabetizados. 

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Doris Leuthard (esq.) e o presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa.

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“Esperamos que os portugueses continuem a viver na Suíça”

Este conteúdo foi publicado em O programa oficial seguiu durante todo o dia e incluiu encontros com o presidente português Marcelo Rebelo de Sousa, o primeiro-ministro António Costa, o presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues e outros parlamentares, além da tradicional deposição de uma coroa de flores no túmulo de Luís de Camões, um passeio de bondes por alguns…

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No início o seu medo era que as crianças tivessem dificuldades de aprender o português. “Porém em cinco meses eles já estavam falando o idioma, pois as aulas são dadas tanto em alemão como em português”. E a vantagem de ter conseguido encontrar uma escola para os filhos, foi de que Rhiner conseguiria manter um estilo de vida que estava acostumada na Suíça. “Poder utilizar o transporte público é muito importante para mim. Eu saio de casa e pego o trem, que me leva diretamente para a fundação”, afirma, ressaltando que o único problema que vê no país é o estilo de condução dos motoristas no trânsito diário.

Nivel elevado em Portugal

Na fundação, o grupo de pesquisas de Rhiner é pequeno: uma pós-doutoranda italiana, duas doutorandas, uma estudante de mestrado e uma assistente de laboratório, todas de Portugal. Questionada sobre a qualidade dos acadêmicos do país, a suíça aponta para as distinções alcançadas pela Fundação Champalimaud. “Hoje recebemos a boa notícia que três dos nossos investigadores ganharam as famosas bolsas de consolidação do Conselho Europeu de PesquisaLink externo (ERC, na sigla em inglês)”, revela. Segundo os porta-vozes da instituição, no total foram oito em Portugal, nas áreas das ciências da vida e das ciências físicas e engenharias, valor total superior a 16 milhões de euros. “A Itália só recebeu uma, a Espanha teve duas e a Suíça, quatro. Isso mostra que a educação é muito forte em Portugal.”

A crise financeira que acometeu Portugal entre 2010 e 2017 é sentida por ela nos seus passeios pela cidade. “Ainda vejo muitos prédios em mau estado, mas que agora estão sendo renovados”. Porém a suíça sente um otimismo generalizado, que, ao seu ver, pode ter sido potencializado por alguns acontecimentos recentes. “A vitória da seleção portuguesa no Campeonato Europeu de Futebol em 2016 e a escolha do país para sediar o Festival Eurovisão da Canção de 2018”, diz sorrindo. Questionada se retornará um dia à Suíça, diz simplesmente que já está feliz se os filhos continuarem a falar alemão, no caso de um dia retornar. Mas, olhando pela janela do escritório a um barco que atravessa o Tejo ressalta que os projetos em Portugal ainda vão lhe ocupar nos próximos anos. “Temos ainda muito a pesquisar”. 

Suíços em Portugal

O governo português reconheceu em 1815 a neutralidade da Suíça. Desde então se estabeleceram relações diplomáticas entre os dois países.

Em 1817 a Suíça abriu em Lisboa um consulado. Este se transformou em 1874 em consulado-geral. Em 1936 o consulado se tornou chancelaria; em 1945, missão e, em 1959, embaixada.

Segundo o Banco de Portugal, a Suíça era, em 2016 o décimo maior investidor direto estrangeiro no país, com um estoque de investimentos de 1,5 bilhões de francos, que garantem aproximadamente 7.300 empregos diretos.

Em 2016, a colônia suíça era de 3.723 pessoas.  

O clube (oficialmente “Société Suisse de Lisbonne”) foi fundado por 125 suíços durante as comemorações de 1º de agosto em 1947 no Estoril.

A primeira sede oficial do clube foi inaugurada em 23 de julho de 1949 nas instalações da missão suíça.

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