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As mudanças que um ano de guerra na Ucrânia causaram na Suíça

Dois homens falando no pódio
O presidente da Confederação Suíça, Ignazio Cassis (esq.) e o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelenskyy, durante um encontro em Kiev, em 20 de outubro de 2022. Keystone / AP

A Suíça está sendo confrontada com exigências que seriam impensáveis antes da invasão da Ucrânia como o confisco de bens privados russos ou abandono da neutralidade. Mas quão realista são mudança no estável país alpino? 

Ativos financeiros russos

A Suíça ainda não confiscou quaisquer fundos russos para a reconstrução da Ucrânia, mas interna e externamente a pressão para tanto está aumentando.

Isso fica claro no tom de declarações como a do ministro das Relações Exteriores, Ignazio Cassis, durante o Fórum Econômico Mundial (WEF) em janeiro deste ano em Davos. Segundo Cassis, os fundos congelados de oligarcas são “uma possível fonte para a reconstrução da Ucrânia”. Ele acrescentou que isso não se daria sem uma base jurídica e cooperação internacional.

Por mais vaga que fosse a declaração, ela foi o suficiente para causar certo nervosismo na praça financeira suíça.

Meio ano antes, o mesmo Cassis, que representa o partido liberal (FDP) no Conselho Federal, havia advertido veementemente contra a expropriação. Seria um “precedente perigoso”, disse ele na época na conferência da Ucrânia, organizada pela Suíça, em Lugano.

O fato de a retórica mudar deixa duas coisas claras:

Em primeiro lugar, fica claro que a Suíça não vai liderar uma iniciativa. Isso não é novidade. Especialmente quando se trata do centro financeiro, a Suíça age geralmente de forma defensiva. Ela hesitou em sanções contra a Rússia antes de finalmente seguir a União Européia (UE).

Para a Suíça, é uma situação periclitante: eles não querem irritar os EUA e a Europa, mas, ao mesmo tempo, a promessa de que os ativos do mundo estão a salvo de arbitrariedade aqui deve permanecer o mais ilesa possível. 

Em segundo lugar, isto revela a difícil situação jurídica de eventuais medidas em relação às exigências políticas. A garantia de propriedade está consagrada na Constituição Federal da Suíça. 

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Der ukrainische Präsident Selenski am World Economics Forum

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É possível desapropriar bens confiscados na Suíça?

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De acordo com a maioria dos juristas suíços, não há base legal para a expropriação de ativos privados russos. Mais recentemente, um grupo de trabalho de alto nível liderado pelo Ministério da Justiça confirmou esse fato.

Para ser justo, outros estados ocidentais não foram mais além. Até agora, o Canadá e a Croácia anunciaram o uso de ativos privados russos para a Ucrânia. Todos os outros estados estão apenas discutindo a questão.

Além da Ucrânia, a pressão vem dos estados do Leste Europeu, mas também dos EUA. As cartas foram embaralhadas de novo com a mudança de maioria na Câmara dos Representantes dos EUA. Se os republicanos apoiarão expropriações de longo alcance é, no mínimo, questionável.

A pressão internacional sobre a Suíça é resultado do número de oligarcas aqui. A Associação de Banqueiros estima que os russos concentraram cerca de 150 a 200 bilhões de francos suíços em bancos suíços.

Até agora, o governo federal congelou 7,5 bilhões e 17 propriedades de indivíduos privados sancionados da Rússia. A título de comparação, apenas cerca de 19 bilhões de euros foram bloqueados em toda a UE.

As reservas do banco central russo também são mantidas por bancos suíços. De acordo com um informativo da Secretaria de Estado para Assuntos Financeiros Internacionais, isso equivale a até dois por cento dos fundos do banco central da Rússia.

Eles não estão oficialmente congelados, mas de fato não podem ser transferidos. Alguns juristas expressaram a opinião de que é mais provável que seja encontrada ou inventada uma base jurídica para o confisco para estes fundos.

Prognóstico: Está ficando cada vez mais claro hoje que a Suíça somente arriscará dar um tal passo, se houver uma base legal internacional para tanto.

Armas suíças

A Suíça não aumentou sua popularidade junto aos países ocidentais com seu veto à reexportação de equipamentos militares.

O exemplo mais saliente é o da munição para o tanque antiaéreo Gepard, com o qual a Alemanha queria apoiar a Ucrânia. A Suíça também rejeitou pedidos da Espanha e da Dinamarca. 

Mais recentemente, a Alemanha anunciou que deseja produzir a própria munição no futuro, o que desencadeou uma discussão na Suíça sobre empregos na indústria de armas.

De fato, a indústria de armas é considerada em geral como economicamente insignificante, contribuindo com apenas 2,5% para o volume de negócios das indústrias metalúrgica, elétrica e de engenharia mecânica.

Ela possui, contudo, um forte lobby político, e seu argumento mais importante é de que sem exportações, a indústria de armas suíça não pode ser mantida em seu tamanho atual por razões econômicas.

Isso contrariaria a autossuficiência da Suíça em armas e, portanto, indiretamente ao princípio da neutralidade armada. Assim, a ala nacional-conservadora da política suíça reage com sensibilidade a quaisquer cortes na indústria de armas.

A reexportação de equipamento militar suíço para zonas de guerra por países terceiros é proibida pela Lei do Material Bélico, que foi tornada mais restritiva há apenas um ano. Durante anos, partidos à esquerda e no meio do espectro político pressionaram a indústria de armas. A guerra da Ucrânia está agora dando novas direções ao debate. De repente, a prática restritiva não é mais isenta de controvérsias, mesmo entre partidos de esquerda. 

Prognóstico: É quase certo que a Suíça avançará neste ponto. Em nível federal, estão pendentes duas iniciativas políticas que procuram criar uma base jurídica correspondente. Num dos casos a base jurídica é temporária e limitada ao conflito na Ucrânia. No outro caso, ela tem efeito geral e uma base jurídica internacional.

Por exemplo, a reexportação deveria ser subordinada à condição de um conflito ter sido considerado contrário ao direito internacional pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas ou por dois terços da Assembleia Geral das Nações Unidas. No caso da guerra na Ucrânia, a Assembleia Geral já decidiu em conformidade.

Recentemente, no entanto, o apoio no Parlamento federal ruiu. Uma maioria depende dos social-democratas e, não menos importante, da questão de como o novo “movimento de paz” iniciado por intelectuais alemães da esquerda ressoará na Suíça.   

Resta saber também se uma mudança na lei para a Ucrânia viria a tempo. A democracia suíça precisa de tempo. Para muitos, esse processo em nível nacional leva demasiado tempo. Políticos de vários matizes estão, portanto, discutindo abertamente evasões. Por exemplo, uma substituição de armamentos (Ringtausch, em alemão) está em discussão.

A ideia é que a Suíça venda tanques desativados de volta ao fabricante na Alemanha, o que é legalmente possível sem restrições. A Alemanha poderia então disponibilizar os tanques aos países que forneceram tanques à Ucrânia e, assim, reabastecer seus próprios estoques.

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ليا شاد

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Neutralidade

A reação internacional foi considerável quando a Suíça aderiu às sanções da UE contra a Rússia no final de fevereiro de 2022. Isso pode ter algo a ver com o fato de que ela levou mais tempo para tomar uma decisão.

Acima de tudo, no entanto, as reações demonstraram que a neutralidade suíça não é compreendida no exterior. As sanções fazem parte da política externa suíça desde os anos noventa, e a reimplementação é habitual.

A Suíça, é preciso saber, não persegue a neutralidade como um princípio universal, mas puramente militarmente. Simplificando, não participa em conflitos armados e não fornece armas a partes em conflito. Isso é regulado na Convenção de Haia de 1907, que a Suíça oficial ainda considera vinculativa sob a lei de neutralidade.

Houve violações politicamente motivadas da Convenção ao longo da história suíça, tanto durante a II Guerra Mundial quanto na Guerra Fria. No entanto, elas sempre permaneceram casos excepcionais.

De acordo com alguns especialistas, a emenda à Lei de Material Bélico agora em discussão, que de fato permite entregas indiretas de armas à Ucrânia, significaria um afastamento da lei da neutralidade.

O especialista em direito internacional Oliver Diggelmann, da Universidade de Zurique, disse recentemente em entrevistaLink externo ao jornal Tages-Anzeiger que: “Não seria uma maneira atípica da Suíça (…) Agimos como se não soubéssemos que isso não é possível em termos de lei de neutralidade. E poderia, assim, amortecer a pressão internacional.”

Prognóstico: O Partido do Povo Suíço (SVP), está atualmente coletando assinaturas para uma iniciativa popular (projeto de lei levado à plebiscito) que visa garantir uma interpretação estreita da neutralidade, alterando a Constituição.

É quase certo que haverá um plebiscito. Um sim nas urnas, no entanto, é menos certo. O mais provável é um retorno à prática anterior, ou seja, à alegação de que a neutralidade suíça permaneceria intocada, enquanto no caso de uma crise, ela é interpretada de acordo com as contingências.

Refugiados

Em 2022, a Suíça experimentou o maior afluxo de refugiados desde a II Guerra Mundial. O sistema de alojamento e cuidados está nos seus limites. Apenas da Ucrânia, 75 mil pessoas deslocadas, principalmente mulheres e crianças vieram.

Após uma interrupção relacionada à pandemia, no entanto, o número de requerentes de asilo de outros países também aumentou. Foram cerca de 24 mil pedidos apresentados em 2022, e a tendência está aumentando.

A Suíça concedeu o visto de residência “S” aos refugiados ucranianos, que lhes permite trabalhar e lhes permite levar uma vida normal. Muitas famílias ucranianas foram inicialmente acomodadas em residências particulares.

Nem tudo funcionou bem, mas até agora o tratamento dos refugiados teve uma conotação positiva na percepção pública, como documentado pela cobertura da mídia.

Existem, sem dúvida, problemas, por exemplo, com a integração no mercado de trabalho. Apesar do alto nível de educação dos refugiados ucranianos, apenas 15% encontraram um emprego. Ou ao nível das escolas, que carecem de professores. Há também críticas crescentes ao alojamento. Alguns cantões tiveram que recorrer a soluções de emergência.

Prognóstico: Devido às eleições nacionais deste ano, uma discussão acalorada sobre imigração é previsível. Acima de tudo, é provável que o SVP, que é crítico da a migração, tenha interesse nesse debate. No entanto, o efeito desse tema ainda é pequeno. Nas eleições regionais em Zurique, que são consideradas um barômetro da política suíça, o partido apenas conseguiu obter pequenos ganhos.

Energia

Preocupações com a segurança energética da Suíça dominaram as manchetes no verão e no outono. O governo lançou uma campanha pedindo economia de energia, mas sem exigir muito da população. Tomar duchas em vez de tomar banho de banheira foi uma das recomendações.

Um outono ameno e intervenções a vários níveis na Europa, especialmente com a importação de gás natural liquefeito do estrangeiro, evitaram a crise energética. O embargo de gás de Vladimir Putin acabou por ser menos eficaz do que se temia. Assim, o tema ficou um pouco fora de foco na Suíça.

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O que resta são os efeitos a longo prazo, como novas cadeias de abastecimento de gás natural, um boom na indústria de bombas de calor e, acima de tudo, custos de vida mais elevados. Os preços da eletricidade na Suíça aumentaram consideravelmente, o que se reflete no consumo.

Embora a inflação seja menor do que no ambiente europeu, ela foi de incomuns 3,3% para a Suíça em janeiro. Algumas partes estão usando a situação para questionar o abandono da energia nuclear na Suíça, ou pelo menos seu cronograma.

Prognóstico: A Suíça não experimentará um novo boom nuclear como outros países. No difícil mercado de trabalho, que se caracteriza por uma escassez de trabalhadores qualificados, a inflação está sendo absorvida pelas medidas salariais tomadas pelos empregadores. Não há ameaça de agitação social. Tendo em vista que o preço da eletricidade está aumentando com atraso, a questão energética vai se tornar novamente politicamente mais importante em nível nacional no futuro.

Adaptação: DvSperling

A guerra na Ucrânia também dificultam o trabalho dos órgãos da ONU e colocam em questão o multilateralismo. O que os diplomatas pensam sobre a situação? swissinfo.ch encontrou algumas respostas no artigo abaixo.

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