Votação sobre pesticidas: uma campanha ‘Davi contra Golias’
Finalmente é hora de uma mudança na política agrícola da Suíça? O agricultor orgânico e político do Partido Verde, Kilian Baumann, diz que sim - e explica porque está apoiando as próximas votações sobre o uso de pesticidas no país.
No dia 13 de junho, os eleitores votarão em duas iniciativas populares relacionadas à agricultura que já geram debates acalorados. A primeira proposta visa acabar com os subsídios aos agricultores que usam pesticidas ou antibióticos profiláticos, ou que importam ração para gado. A segunda apela à proibição total da utilização de pesticidas sintéticos, bem como à proibição da importação de produtos fabricados com ou que contenham esses pesticidas.
Os oponentes dizem que as iniciativas são muito extremas. Segundo eles, as propostas interpretam erroneamente a realidade do setor agrícola na Suíça e causariam danos massivos aos agricultores se aprovadas. Além disso, avaliam que as iniciativas nem mesmo trariam o progresso almejado, pois a produção de alimentos acabaria simplesmente sendo terceirizada.
Do outro lado, Kilian Baumann é um parlamentar de Berna do Partido Verde e também fazendeiro. Ele está do lado que votará “sim” para ambas as iniciativas, embora não tenha se envolvido em suas formulações iniciais. Baumann sempre criticou o adiamento da reforma agrícola na Suíça. Ele sonha com um crescimento acentuado na agricultura orgânica do país alpino.
SWI swissinfo.ch: Na Suíça, a ideia da natureza e da terra como puras e “intocadas” é amplamente difundida. Essa imagem é enganosa?
Kilian Baumann: Com o tempo, retrocedemos. Antes, estávamos no caminho certo, mas nos últimos anos as reformas agrícolas foram bloqueadas e as medidas necessárias foram suspensas. Olhe para os nossos vizinhos: a Áustria está muito à frente no que diz respeito aos níveis de terras agrícolas e propriedades orgânicas; na Alemanha, Baviera e Baden-Württemberg também estão à frente da Suíça. Infelizmente, não vivemos no paraíso intocado que gostamos de imaginar.
Este problema não é novo – quase todos os dias, lemos relatórios sobre vestígios de pesticidas na água potável, sobre nascentes naturais que não podem mais ser usadas porque os valores máximos de toxicidade foram ultrapassados, sobre abelhas morrendo, desaparecimento de insetos, biodiversidade sendo deteriorada e assim por diante. As raízes de tudo isso também são conhecidas, e a agricultura é responsável por grande parte disso. Ou, mais precisamente, a política agrícola. Não somos nós, agricultores, os culpados, mas sim o enquadramento político.
SWI: Qual seria a posição da Suíça se essas duas iniciativas fossem aceitas?
KB: Daríamos um grande passo em frente, se como país – a nível nacional – deixássemos de usar pesticidas sintéticos e se correlacionarmos melhor o número de gado sendo criado de acordo com a quantidade de terra disponível.
Até agora, apenas regiões individuais decidiram parar de usar esses pesticidas. Se todo o país fizesse o mesmo, teria um impacto internacional incrível. Eu vejo isso como uma oportunidade. A Suíça seria uma pioneira, posicionando-se a favor da sustentabilidade, ecologia e proteção do clima – todas as questões importantes do futuro.
SWI: Qual é a posição dos partidos verdes em outros países europeus? Estão também sendo desenvolvidos esforços a nível da UE?
KB: O Acordo Verde europeu quer tornar a agricultura mais ecológica em todo o continente. Existem movimentos semelhantes em praticamente todos os países ocidentais, onde existem sistemas de pagamento direto [ou subsídio] para os agricultores e onde a agricultura pode ser avaliada por seu impacto ecológico. Todos os países enfrentam os mesmos problemas.
Mas também há muita oposição, já que interesses financeiros estão em jogo. Grandes lucros são obtidos em um sistema de agricultura intensiva que usa muitos fertilizantes, pesticidas e maquinários.
SWI: Ambas as iniciativas foram rotuladas de “extremas demais”. Não teria sido mais eficaz formulá-los com um pouco menos de força?
KB: Os períodos de transição propostos de oito e dez anos, respectivamente, são generosos. Além disso, haverá um processo parlamentar para traduzir as iniciativas em legislação. E há um certo espaço para flexibilidade na implementação, por exemplo, para as mudanças nas regras de alimentação animal, que seriam impactadas pela iniciativa “água potável”.
Também é importante dizer que ambas as iniciativas foram lançadas por comitês de cidadãos, não por partidos políticos ou grupos de interesse. Isso mostra que há preocupações claras sobre essas questões na sociedade. Nos últimos anos, a política não conseguiu acompanhar essas preocupações. A reforma agrícola está bloqueada e nem sequer houve contrapropostas em relação a essas duas iniciativas. As pessoas agora estão dizendo: “chega, chega”.
SWI: Mas, além de tais preocupações, há o argumento de que a agricultura orgânica não gera grandes lucros. Isso mudaria se a iniciativa fosse aceita?
KB: Sim, eu espero que sim. As medidas de acompanhamento para implementar as iniciativas também seriam importantes aqui, por exemplo, nos direitos sobre as importações e exportações. Não é apenas uma questão de o mercado livre ditar as regras do jogo. Também podemos preparar mecanismos de controle com antecedência.
SWI: Também há divergências entre os próprios agricultores orgânicos sobre as iniciativas. Os dirigentes da associação Bio Suisse são contra a iniciativa da “água potável”, pois dizem que geraria muitos produtores orgânicos e uma queda nos preços.
KB: Essa é uma posição problemática que eu não entendo. É muito focada na situação atual. Nosso objetivo deve ser expandir o setor de agricultura orgânica. Como resultado, é bem possível que os preços ao consumidor caiam. Mas também devemos dizer que, no momento, alguns grandes produtores estão empurrando os preços para cima, colhendo margens excessivas.
SWI: Qual é o seu pressentimento sobre a votação de 13 de junho? A campanha está começando para valer agora…
KB: Teremos que ver: os comitês de cidadãos estão lutando contra forças muito maiores. Empresas agroquímicas globais estão fazendo campanha, assim como empresas nacionais e a maior associação de agricultores. É Davi contra Golias.
Vai ser difícil, mas é sempre o mesmo na política suíça – o gotejamento constante desgasta a pedra. Para iniciativas agrícolas, em particular, você pode perder um voto, mas ainda assim conseguir fazer certas mudanças. O fato de os debates já estarem sendo tão animados mostra que as iniciativas deram certo. E, no final, estamos falando sobre os problemas, o que por si só é muito importante para mudanças de longo prazo.
Adaptação: Clarissa Levy
Adaptação: Clarissa Levy
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