Filme sobre Sida (Aids) marca volta do cinema moçambicano às salas
O Jardim do outro homem, de Sol de Carvalho, é o primeiro longa-metragem moçambicano depois de vinte anos marcando o regresso do cinema nacional às salas.
O filme, co-financiado pela Cooperação Suiça, é uma história de pobreza, corrupção, chantagem, Sida, mas também de amizade e grande força de vontade.
A família da Sofia, a jovem protagonista, é feita de mulheres que ganham o pão de cada dia partindo pedras. Sofia sonha ser médica, mas para entrar na universidade tem de passar no teste de biologia que é decisivo.
Compreendendo esta necessidade, o professor Mangueira, que partilha a mesma pobreza, aproveita para a chantagear trocando uma nota positiva com um favor sexual. A Sofia cai vítima da chantagem mesmo desconfiando que o professor possa estar infectado pelo HIV e não queira, como a maioria dos homens, usar o preservativo.
Festival de Milão
“Insisto em dizer que este não um filme sobre o Sida como insisto em dizer que o Sida não é um problema mas é o resultado de um problema. Este é um filme de como a corrupção pode ter consequência ao nível do Sida”, afirma Sol de Carvalho.
– Se nós estamos num país onde a maioria das pessoas ainda é analfabeta, e estamos a deixar que o sistema de educação esteja impregnado por esta corrupção, quem estamos nós a formar? Não estamos a formar uma nova geração de líderes, estamos a formar uma nova geração de corruptos. Estamos a matar pessoas se deixamos que isto se impregne dessa maneira com esse à-vontade com que as pessoas fazem chantagem sexual e até recusam usar a camisinha, afirma o cineasta.
O filme, que foi seleccionado para o Festival do cinema africano de Milão, acaba de ser estreado em Maputo. É uma co-produção França, Portugal, Moçambique, patrocinado e financiado por muitas instituições, entre as quais o Conselho Nacional de Luta contra o Sida a Direção de Desenvolvimento e Cooperação (DDC), órgão do governo suíço.
Doze mil professores morreram de Aids
– Quando o ministro da Saúde chega ao Parlamento e diz que 12.000 professores morreram por causa do Sida, é assustador e de repente percebemos o drama. Em 1975 tínhamos 4 ou 5 negros moçambicanos na universidade. Agora, passado este tempo todo, estamos a ver todo um esforço de muitos anos a ser deitado pelo cano abaixo por causa deste problema. O Sida para mim é um assunto de segurança nacional, disse Sol de Carvalho.
Durante três anos a história do filme foi sendo construída aos poucos. “Era para ser um filme vídeo, parte de um projecto de dez documentários financiados pela Cooperação Suíça. O guião foi muito bem recebido e pensamos que pudesse ser uma oportunidade para lançarmo-nos e fazer um filme grande”, conta o realizador moçambicano. “A história é moçambicana, a realização é também, e os actores são moçambicanos. A maioria deles não profissionais. Foi um trabalho duro, mas valeu a pena.”
Dez documentários para a DDC
A idéia surgiu enquanto Sol de Carvalho estava a fazer dez documentários para a Cooperação Suiça. Os dois últimos foram transformados em ficção. O primeiro foi A herança da viúva um filme sobre as viúvas em Inhambane, e a seguir um filme sobre as jovens. “A metodologia que usamos foi de recolher histórias e depois escrever a nossa história. Encontramos muitas realidades e sobretudo muitas jovens moçambicanas que tinham passado pela experiência da chantagem sexual.”
O filme é apenas o quarto longa-metragem em película desde a independência do país, em 1975. Desde O Vento sopra do Norte e O tempo dos leopardos, em meados dos anos 80, nunca mais se tinha produzido um filme moçambicano para as salas.
No circuito comercial
O filme, que custou no total 850 mil euros, começou a ser exibido no circuito internacional. Está a ser estreado em Goteborg, na Suécia, e nos Estados Unidos, bem como em Maputo.
– Neste momento estou a fazer o circuito de sala. Mas existe aqui um problema: o cinema está caro. Não fiz este filme para as pessoas que têm dinheiro, embora eu tenha prazer que elas vejam, mas quero que o filme atinja pessoas que às vezes não têm condições para comprar o bilhete que representa 10% do seu salário, diz Sol de Carvalho.
Depois do filme fazer o circuito comercial, vai entrar no ‘circuito do mato’, usando as salas que ainda existem no país. “Depois existe um sonho: projectar o filme nas escolas. Já fiz a apresentação para todos os directores das escolas primárias de Maputo. Espero que o Ministério da Educação veja o filme como potencial instrumento. Vamos ver nos próximos dias.”
swissinfo, Paola Rolletta, Maputo
O Jardim do outro homem é o quarto longa-metragem feito em Moçambique desde a independência do país, em 1975.
Segundo o diretor Sol de Carvalho, trata-se de um filme sobre a corrupção e não especificamente sobre o SIDA ou AIDS.
O filme, que foi seleccionado para o Festival do cinema africano de Milão, acaba de ser estreado em Maputo.
É uma co-produção França, Portugal, Moçambique, patrocinado e financiado por muitas instituições, entre as quais o Conselho Nacional de Luta contra o Sida a Direção de Desenvolvimento e Cooperação (DDC), órgão do governo suíço.
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