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A máfia dos cigarros no banco dos réus

O julgamento em Bellinzona entra em nova fase. Keystone

Nove pessoas são acusadas de lavagem de dinheiro e formação de quadrilha no maior processo da história da Justiça suíça contra o crime organizado, envolvendo a máfia italiana dos cigarros.

O julgamento iniciado em abril passado diante do Tribunal Penal Federal, em Bellinzona (sul do país), entra em numa nova fase. As testemunhas ouvidas até agora incriminam os acusados.

Segundo a Procuradoria Geral da República (PGR), entre 1994 e 2001, eles teriam participado do tráfico de 215 milhões de pacotes de cigarros no valor de 800 milhões de dólares. A Suíça teria sido usada como plataforma de transporte dos cigarros para Montenegro e para lavar o dinheiro desse negócio obtido na Itália.

Na segunda semana do processo, que entra numa nova fase nesta segunda-feira, os acusados foram confrontados com depoimentos prestados através de videoconferência por ex-mafiosos da Itália, que foram condenados e agora cooperam com a Justiça – assim chamados pentiti.

Esses “informantes” tinham, sobretudo, uma tarefa: seus depoimentos deveriam comprovar que os acusados sabiam muito bem que por trás do tráfico se encontravam a máfia e o crime organizado.

“Pentiti” incriminam acusados



Na avaliação da PGR, Raffaello Giuliano (39) e Pasquale Avagliano (44), ex-membros da Camorra, bem como Tommaso Laraspata (44), ex-integrante da Sacra Corona Unita (da Apúlia), cumpriram esse papel da melhor maneira possível.

Avagliano contou que, no anos de 1990, esteve duas vezes em Lugano, ocasiões em que teria encontrado vários dos agora acusados. Ele próprio na época encontrava-se na cladestinidade. Em Lugano, ele era apenas “turista” e teria almoçado e se divertido em clubes noturnos com alguns dos acusados. Não se falava de negócios, disse.

Também Vittorio Pisani, da polícia antimáfia de Nápoli, incriminou um dos acusados como sendo homem de confiança do camorrista Ciro Mazzarella, que tinha um papel decisivo no tráfico de cigarros para a Itália via Monteneo.

Acusados rebatem acusações



Os acusados até agora rebateram todas as acusações, principalmente a que estavam informados do envolvimento da máfia com o tráfico de cigarros. Alguns deles usam o direito de recusar o depoimento. Outros disseram que o auto de acusação é “infame”.

Um comportamento típico é o de Alfred “Fredi” Bossert (73), que tinha uma casa de câmbio em Lugano, o único acusado interrogado no tribunal até agora. Ele admitiu – também em conversa com os jornalistas – ter recebido quantias milionárias do tráfico. Como o tráfico não era crime na Suíça, ele disse não se sentir culpado.

Bossert diante do tribunal quão lucrativo era seu negócio. Ele disse que chegou a pagar entre 600 mil e 800 mil francos de impostos por ano. E que sua meta era sempre futurar mais de um milhão de francos por ano. Uma parte das enormes somas de liras (moeda italiana na époa) era transportada para o Ticino em bolsas esportivas.

Desde que ele foi preso preventivamente por 106 dias em 31 de agosto de 2004, “minha vida acabou”, disse diante do tribunal. Ele agora está aposentado e recebe apoio da filha, que tem um posto de combustíveis próximo à fronteira da Suíça com a Itália.

Problemas idiomáticos



Embora nenhum dos acusados seja alemão, o julgamento é em alemão, porque as investigações em grande parte foram feitas nesse idioma, também usado pelos advoados de defesa designados pela Justiça suíça.

Isso complica o processo, como foi o caso nos depoimentos dos pentiti, que falavam italiano com forte acento do sul daquele país. A fala dessas testemunhas também foi constantemente interrompida para fins protocolares.

Investiadores alemães

O julgamento não tem atraído muito público, fora os jornalistas e alguns parentes dos acusados. O interrogatório dos pentiti, porém, foi acompanhado por investigadores alemães. Também na Alemanha há investiações sobre o tráfico internacional de cigarros para Montenegro.

A Promotoria Pública de Augsburg (na Baviera) acusa oito executivos residentes na Suíça de sonegação de impostos, lavagem de dinheiro e formação de uma organização criminosa.

O julgamento em Bellinzona, sob a presidência do juiz federal Walter Wüthrich, continuará até 19 de junho – com interrupções. Ainda não foi definida uma data para a promulgação da sentenção.

Gerhard Lob, Bellinzona, swissinfo.ch

Sete absolvidos

O Tribunal Penal Federal em Bellinzona absolveu sete dos acusados. Dois foram condenados por apoio a organizações criminosas italianas.

Um dos condenados recebeu pena de dois anos em liberdade condicional e nove meses de cadeia. Para o outro, a pena foi de dois anos em liberdade condicional. Os principais acusados foram inocentados.

A Procuradoria Geral da República pede no processo em Bellinzona a aplicação do artigo 260 do Código Penal, que pune a participação em uma organização criminosa.

Este artigo está em vigor desde 1° de agosto de 1994. Por isso, a Procuradoria possivelmente não considerará crime ligado ao tráfico de cigarros pela máfia ocorridos antes dessa data.

O artigo 260 prevê pena de até cinco anos de reclusão ou pena pecuniária.

Nos anos de 1990, explodiu o tráfico de cigarros no Sul da Europa. Os cigarros comprados na Holanda eram levados por terra ou ar – sem pagar taxa aduaneira – até Montenegro, de onde eram transporados em barcos voadores através do Mar Adriático até o sul da Itália. Montenegro concedia até licenças de importação e trânsito.

Lá eram vendidos no mercado negro, principalmente em Nápoli. Os lucros era divididos pelas diversas gangues da máfia. O dinheiro era usado na compra de novos cigarros.

O negócio desmoronou em 2000, quando as autoridades italianas passaram a combater o tráfico entre Montenegro e o sul da Itália. Na ocasião, houve vários tiroteios entre os traficantes e os militares.

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