Absinto encanta o mundo
Depois de 95 anos de proibição, a liberalização do absinto na Suíça traz esperanças de bons negócios para os habitantes no Val-de-Travers, a região onde surgiu a bebida dos poetas.
swissinfo revela a história, os segredos e perigos do absinto. Visitamos também um dos mais antigos fabricantes da “Fada Verde”.
A “Fada Verde” chegou. Depois que a produção e comercialização do absinto passou a ser oficialmente uma atividade legal na Suíça, desde 1º de março de 2005, agricultores e produtores do Val-de-Travers estão sonhando alto.
Essa região, localizada na região oeste da Suíça e não muito distante da fronteira com a frança, é o berço histórico do absinto. Porém ela hoje vive os problemas de muitas regiões rurais do país como o desemprego, a fuga de jovens para as grandes cidades e a falta de perspectiva.
– Agora queremos tornar o Val-de-Travers mais uma vez conhecido mundialmente. Não vamos abandonar o mercado internacional às imitações baratas vindas da República Tcheca ou Espanha”, declara Yves Kübler.
O absinto Kübler
O proprietário da destilaria Blackmint, em Môtiers, um pequeno povoado do Val-de-Travers, acredita no futuro da “Fada Verde”. Seu bisavô já fabricava o produto em 1863 e o distribuía em toda a Europa com o nome de Kübler & Romang. Com a proibição do absinto na Suíça em 1910, a fábrica da família passou a produzir apenas xaropes.
A falta de interesse das novas gerações fez com que a empresa fosse vendida em 1962. Aos 23 anos, Yves Kübler, que havia sido demitido do seu trabalho de técnico industrial, decidiu em 1990 recomprar a firma e reequipá-la. A destilaria foi então batizada como “Blackmint”.
– Meu primeiro produto foi a La Rincette, o primeiro aperitivo de absinto com anis desde a proibição. Onze anos depois consegui uma autorização especial do cantão de Neuchâtel para produzir um extrato de absinto, que tinha apenas 45% de graduação alcóolica e 1 miligrama de thujone por litro, o princípio ativo presente na planta do absinto.
Porém a liberalização oficial do absinto permitiu que ele utilizasse a receita secreta da família para fabricar o verdadeiro absinto. “Agora eu já não preciso chamar meu produto de extrato. Nosso absinto tem agora 53% de graduação alcóolica e 16 miligramas de thujone”.
A receita secreta do absinto
Absinto é o nome abreviado da planta “Artemisia Absinthium”. A bebida é um destilado alcóolico que não apenas utiliza o absinto, mas também outros ingredientes.
– O absinto é composto de várias ervas. A maior parte é o anis, a segunda é a raiz de erva doce. Em seguida utilizamos o pequeno e o grande absinto, o anis estrelado, o coentro, erva cidreira e o hissopo – explica Yves Kübler.
Na sua pequena fábrica, quatro funcionários cuidam da produção que, devido à forte demanda, funciona vinte e quatro horas por dia. O empresário exibe a destilaria, o depósito de ingredientes e aproveita a ocasião para explicar o processo de produção.
– Nós processamos as ervas em álcool de cereais e destilamos tudo. O que sai é o absinto quase puro. Depois misturamos com água especialmente tratada, tirando os sais que possam danificar o gosto. Não incluímos nem açúcar ou colorantes como a clorofila.
Transparente e incolor, o líquido é engarrafado manualmente em garrafas de meio e um litro. O absinto é então distribuído na Suíça e em vários países europeus para o consumo de um público curioso. Outros fabricantes também incluem açúcar ou colorantes como a clorofila, como era feito no passado. Daí a origem da expressão “Fada Verde”.
Absinto como alucinógeno líquido
O escritor inglês Oscar Wilde já conhecia os efeitos provocados pelo consumo excessivo da bebida: – “Depois do primeiro copo, você vê as coisas como você gostaria que elas fossem. Depois do segundo, você vê coisas como elas não são. Finalmente, você passar a ver as coisas como elas realmente são, e essa é a coisa mais horrível do mundo”.
Os óleos etéreos da planta do absinto têm na sua principal composição o “thujone”, uma neurotoxina que tem realmente efeitos alucinógenos, mas que ao ser tomado em grandes doses, pode também provocar danos físicos e psicológicos.
Porém as diferenças entre o absinto que é comercializado atualmente e o que era tomado no século XIX como “droga da boêmia” são enormes. Hoje em dia o álcool é mais puro, a mistura de ervas mais refinada e a graduação alcóolica menor. Antigamente o absinto chegava a ser 80% de puro álcool. Hoje na Suíça, a graduação da bebida está limitada a 53%.
Também a concentração de thujone diminuiu. Leis européias limitam esta em 35 miligramas por litro. Há cem anos, cronistas da época falavam de absintos com até 260 miligramas.
Absinto como mina de ouro
Mais importante do que os efeitos alucinógenos do absinto são suas conseqüências econômicas para a região do Val-de-Travers.
Depois da liberalização, agricultores, comerciantes e destiladores imaginam formas de aproveitar o mito do absinto para ativar a economia e o turismo no Val-de-Travers. Por isso, seus promotores comerciais criaram a marca “País das Fadas” e imaginaram diversas atividades para promover a região: além do museu do absinto, recentemente aberto em Môtiers, excursões temáticas com guias especializados e até mesmo uma grande festa popular, prevista para ocorrer em 18 de junho.
A economia local aproveitou a onda para criar novos produtos: um fabricante de chocolate inventou uma barra com recheio à base de licor de absinto; um açougueiro de Couvet oferece salsichas e lingüiças secas com absinto: quatro agricultores da região se associaram para cultivar 2.800 metros quadrados de absinto aromático e até uma empresa de cosméticos anunciou o lançamento de produtos contendo a “Fada Verde”.
Já os produtores de absinto apostam na introdução de um selo de qualidade como para a champanhe – Apelação de Origem Controlada (AOC) – para o produto fabricado em Val-de-Travers. Porém esse é um processo mais complicado, pois envolve leis européias e o reconhecimento do absinto que também é fabricado em outros países.
De qualquer maneira, todos se orgulham de produzir uma bebida que é a única a ter sido proibida em constituição. O cliente não se incomoda com esses detalhes e degusta o líquido na sua forma clássica: acrescentando
água mineral e uns cubos de gelo.
swissinfo, Alexander Thoele
Reportagem continua no texto “Fada Verde nasce em vale suíço”. Clique AQUILink externo para lê-la.
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