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Análise: “Quanto custa o fim do sigilo bancário?”

A economia suíça não vive só dos bancos. Keystone

O significado econômico dos bancos na Suíça é grande, mas ele sempre foi superestimado. Os bancos terão de adaptar seu modelo de negócio, mas a praça financeira suíça não vai afundar por causa da flexibilização do sigilo bancário.

É o que afirma o economista Rudolf Strahm na seguinte análise sobre o peso do setor bancário na economia helvética.

Por Rudolf Strahm*

A Suíça está ameaçada de ser arruinada? Com uma flexibilização do sigilo bancário “a prosperidade progressivamente diminuiria de forma sensível” e os baixos juros hipotecários subiriam, afirmou um guru da bolsa na semana passada. “O fundamento da nossa prosperidade está em perigo”, dramatizou um membro da linha de frente do Parlamento. O chefe da autoridade supervisora dos mercados financeiros (Finma) falou de uma “guerra econômica” envolvendo a revogação do sigilo bancário. E um banqueiro privado de Genebra teme uma “redução à metade da geração de riqueza da praça financeira”.

Afirmações desse tipo alimentam um velho mito e revelam incompetência econômica. Para que esta retórica de guerra e o pânico não sejam fomentados ainda mais diante de futuras mudanças, pretendo expor aqui o significado econômico do setor bancário com base nos dados da contabilidade nacional (CN) do Banco Nacional (central) Suíço (SNB) e do Departamento Federal de Estatística (DFS).

O significado econômico dos bancos na Suíça é grande, mas sempre foi superestimado. Quem viaja ao exterior percebe o estereótipo de que nós suíços só seríamos ricos por causa dos bancos. Bancos como suporte do emprego? Todo o setor bancário empregou em 2008, antes da atual onda de demissões, 132 mil pessoas em horário integral ou jornada parcial – 3,3% de todos os empregados da Suíça. Em comparação, as indústrias mecânica, eletroeletrônica e metalúrgica ocupam cerca de 380 mil funcionários ou o comércio, 617 mil. Dois terços de todos os empregos continuam sendo oferecidos por pequenas e médias empresas. Sobretudo isso caracteriza a nossa riqueza.

Hipotecas baratas graças ao dinheiro estrangeiro? A Suíça é uma economia com superávits crônicos de poupança. Segundo a balanço de pagamentos do Banco Nacional, esse superávit foi de 68 bilhões de francos em 2007. Pessoas físicas e empresas, portanto, economizam muito mais do que pode ser investido na Suíça. Para o financiamento das hipotecas e dos investimentos não dependemos do dinheiro da poupança externa. E, além disso, os juros baixos dependem da política monetária do Banco Nacional e da baixa taxa de inflação, e não – como afirmou o guru da bolsa – das fortunas estrangeiras. Estas últimas novamente são aplicadas no exterior.

Motores da riqueza? Segundo a conta de produção na contabilidade nacional, o setor de crédito em anos de ponta contribuiu com 8,3% da geração da riqueza nacional (2006). Esta participação dos bancos no Produto Interno Bruto (PIB) deve encolher este ano de 8% para 6% devido à crise financeira. Portanto, os dados da Associação dos Banqueiros sobre a participação da praça financeira no PIB são completamente exagerados. Eles baseiam-se num parecer partidário encomendado pela própria entidade, que inclui também todos os seguros, caixas de pensão, agentes fiduciários e empresas de contabilidade.

Bancos ricos por causa das fortunas estrangeiras? Os 330 bancos (segundo estatística do SNB) – mais um mito – são todos colocados na mesma panela dos beneficiários do sigilo bancário. Na prática e na verdade, apenas cerca de três dúzias de bancos dão muito peso à aquisição de fortunas estrangeiras. Para os bancos cantonais, as caixas regionais, os bancos Raiffeisen, Migros, Coop e muitos outros bancos, o negócio com fortunas estrangeiras praticamente não desempenha papel algum, também não para o Banco Cantonal de Zurique, como me explica um grande conhecedor do mercado. Fortunas estrangeiras que podem estar vinculadas à sonegação fiscal são administradas principalmente pelos dois grandes bancos, os 14 bancos privados e por uma parte, mas somente uma parte, dos bancos estrangeiros e filiais de bancos na Suíça. A flexibilização do sigilo bancário vai atingir fortemente alguns banqueiros privados. Por isso é que vem deles, de St-Gallen e Genebra, a retórica hostil contra o Conselho Federal (Executivo suíço) e contra o fim dos seus privilégios.

Quanto dinheiro de sonegação fiscal? A pergunta mais freqüente é: quanto dessas fortunas estrangeiras entre 2,5 e 3 trilhões de francos é dinheiro da evasão fiscal? Não se pode dizer seriamente quanto é. Mas uma coisa é estatisticamente significante: cerca de 60% das fortunas estrangeiras vêm de investidores institucionais, isto é, de bancos estrangeiros, sociedades de seguros, caixas de pensão, bancos nacionais, que fazem suas aplicações em diferentes moedas e não precisam do sigilo bancário. Porque eles, de qualquer modo, são obrigados a publicar dados sobre seu capital e seus lucros nos balanços.

Também dos cerca de 500 bilhões de francos de fortunas estrangeiras administradas por agentes fiduciários pouco vem de investidores privados que procuram a proteção do sigilo bancário. Por saldo, no máximo um quinto da riqueza gerada pelos bancos vêm da administração de fortunas privadas estrangeiras tributadas ou não tributadas. O negócio com o dinheiro da evasão fiscal representa uma fração e beneficia poucos.

A realidade, portanto, desmonta o mito. Os bancos terão de adaptar seu modelo de negócio por causa da revogação do sigilo bancário para dinheiro de sonegação fiscal. Mas a praça financeira não vai afundar. Uma mudança estrutural semelhante já foi realizada há muito tempo pelo resto da economia por causa das novas regras globais (OMC) – e na maioria dos casos sem ajuda do Estado.

A flexibilização do sigilo bancário forçada pelo exterior jamais causará perdas tão grandes à praça financeira Suíça como as que ocorreram na atual crise financeira. E esta crise, note-se bem, foi causada pelos bancos com sua economia especulativa.

* Rudolf Strahm (www.rudolfstrahm.ch) foi controlador de preços da Suíça durante quatro anos. Este artigo foi publicado originalmente no jornal Tagesanzeiger em 10 de março de 2009 (página 26). Sua tradução e publicação por swissinfo.ch foi gentilmente autorizada pelo autor.

Nascido em 1943, em Emmental, no cantão de Berna (oeste da Suíça)

Formado em Economia e Administração pela Universidade de Berna

Foi secretário da ONG “Declaração de Berna” de 1974 a 1978

Docente na Universidade de Zurique (1977/1978)

Secretário-geral do Partido Social-Democrata (a denominação em francês é Partido Socialista) da Suíça (1978 a 1985)

Deputado federal de 1991 a 2004

Controlador nacional de preços de 1° de agosto de 2004 a outubro de 2008 (ao assumir esta função, renunciou a todos os outros cargos para impedir conflito de interesses)

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