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As causas da controvérsia nas negociações agrícolas na OMC

O assunto mais controvertido nas negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC) são as subvenções agrícolas e as medidas protecionistas contra a importação de produtos agrícolas.

A maioria dos países industrializados, inclusive a Suíça, subvenciona a agricultura.

Nos países industrializados, a agricultura é considerada uma atividade econômica prioritária. Ela tem prioridade na política em geral e na política socioeconômica em particular porque ela é responsável pela alimentação, nutrição e saúde do povo.

Entre os países desenvolvidos formou-se um grupo de nações, chamado G 10, os dez países mais pobres em termos de recursos agrícolas (Suíça, Noruega, Japão, Coréia e mais seis países) que se caracterizam por uma agricultura nacional altamente vulnerável devido ao clima frio e ao solo pouco apto para plantio. Esses países subvencionam a agricultura para garantir sua sobrevivência. Mesmo com as subvenções, a produção agrícola não é capaz de satisfazer as necessidades de consumo da população o que os obriga a importar grandes quantidades de produtos agrícolas.

Garantia da alimentação é parte do desenvolvimento sustentável

Os referidos países, entretanto, não querem importar mais do que o necessário, a fim de evitar que a agricultura nacional, já problemática, seja totalmente extinta. Por isso estabelecem tarifas ou cotas de importação. Depois do fracasso da reunião da OMC no final de junho 2006 em Genebra, eles divulgaram o “G10 Press Release” confirmando que não poderão suportar e aceitar um corte maciço das tarifas de importação de produtos agrícolas. Vale destacar que os demais produtos são importados praticamente sem tarifa. A Suíça cobra tarifa zero para 81% dos seus produtos importados.

A remuneração dos trabalhadores rurais garante seu elevado nível de vida

Devido às condições climáticas adversas acima mencionadas, a produtividade das atividades agrícolas é baixa em comparação dos países tropicais ou subtropicais, o que encarece fortemente os produtos. Além disso, o custo aumenta mais ainda porque os referidos países pagam aos agricultores e trabalhadores rurais remunerações e salários altos, comparáveis à remuneração dos demais setores da economia, o que permite o acesso dos trabalhadores rurais e de suas famílias à educação de todos os níveis e aos demais serviços públicos e privados.

Em conseqüência o custo total da produção dos alimentos, por exemplo na Suíça, é tão alto, que seria muito mais barato importá-los de países que têm terras férteis e que pagam baixos salários como o Brasil ou os demais países do G 20.

Entretanto, pensando em termos de desenvolvimento nacional sustentável e de planejamento estratégico, ou seja, a longo prazo, os países desenvolvidos querem evitar que a alimentação de sua população dependa demasiadamente de países terceiros.

De fato, a Suíça tem longa experiência com problemas de importação, sobretudo nos períodos das guerras mundiais e da guerra fria. Durante a segunda guerra mundial, quando a importação foi fortemente restrita, o governo suíço lançou o chamado plano Wahlen, uma “batalha de expansão da produção agrícola” para garantir a alimentação da população, obrigando praticamente cada família a plantar hortas caseiras, mesmo nas regiões montanhosas. Ao mesmo tempo o governo promoveu a agricultura através de subsídios aos agricultores.

A desvantagem destas subvenções oficiais é que o setor primário produz hoje um excesso de alguns poucos produtos agrícolas e distorce, em geral, a demanda e a oferta do mercado. Apesar da forte redução do número de produtores rurais – somente na Suíça foram fechados, nos últimos 15 anos, 30.000 estabelecimentos rurais – o desequilíbrio entre oferta e demanda na produção agrícola permanece.

A situação e a posição dos países em vias de desenvolvimento


Nos países em vias de desenvolvimento os salários pagos aos trabalhadores são geralmente baixos, sobretudo no setor primário, implicando pobreza e indigência de um lado e baixo custo de produção ou alta competitividade de outro. Em vários países emergentes, entretanto, essa remuneração insuficiente não corresponde às leis e constituições nacionais. Consultemos, por exemplo, a legislação do Brasil que dispõe de uma Constituição Federal moderna, chamada também de “constituição cidadã”.

A Constituição estabelece logo no art. 3º como objetivo fundamental: “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades”. Para erradicar a pobreza, a Constituição prescreve um salário mínimo do trabalhador “capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social” (art. 7º).

O valor do salário mínimo brasileiro corresponde à renda mínima na Suíça

A definição do salário mínimo brasileiro, acima citada, coincide com os critérios da renda mínima na Suíça. Quem ganha menos do que isso, recebe do Serviço Social Municipal mensalmente o diferencial entre aquilo que efetivamente ganha e o que deveria receber “para atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família”.

No Brasil o valor constitucional do salário mínimo é calculado cada mês pelo DIEESE, conforme o preço da cesta básica vigente no mês. Em geral ele é cinco vezes superior ao salário mínimo efetivamente pago pelos empregadores privados e públicos. Se fosse igual ao valor exigido pela Constituição, provavelmente não haveria mais indigentes e o número de pobres seria significativamente reduzido.

Chegamos, assim, a uma proposta de solução intermediária da controvérsia quanto às barreiras protecionistas: os países desenvolvidos diminuiriam as tarifas de importação até chegar a zero, à medida em que os países emergentes aumentassem os salários dos seus trabalhadores até chegar ao valor que atenda a suas necessidades vitais básicas e às de sua família.

Paul Ammann, Natal-RN, Brasil

Paul Ammann, sociólogo e economista, é natural de Davos, no cantão dos Grisões, leste da Suíça.

Foi chefe da Coordenação de Desenvolvimento de Recursos Humanos do CNPq, Brasil. Foi chefe de planejamento da formação profissional do Ministério do Trabalho, Brasil. Foi fundador e primeiro chefe da Assessoria de Planejamento do SENAI de Brasília.

Foi coordenador e professor de pós-graduação na Faculdade Católica de Brasília. Atualmente é professor associado da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e consultor de empresas.

Obras: “As teorias e a prática da formação profissional” editado pelo Ministério do Trabalho, Brasil. Co-autor, com Safira Bezerra Ammann de “Cidadania, Exclusão e Migração” (no prelo) pela Liber Livros, Brasília.

Nos últimos 15 anos, 30 mil fazendas cessaram suas atividades na Suíça. Atualmente, 120 mil pessoas trabalham na agricultura. Nos anos 60, eram 420 mil.

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