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Cientistas dão lugar aos políticos na conferência de São Paulo

Exposição sobre biocombustíveis durante a Conferência Internacional de São Paulo Keystone

Saem os debatedores e entram os ministros. Terminou quarta-feira (19/11) a primeira fase do Fórum Internacional sobre Biocombustíveis, em São Paulo.

As observações dessa primeira fase serão debatidas hoje e sexta-feira por 38 ministros de Estado. O encontro será encerrado pelo presidente Lula.

No segundo e último dia dos painéis temáticos do 1° Fórum Internacional sobre Biocombustíveis, em São Paulo, foram discutidos mais três temas de interesse geral do setor do que convém chamar doravante de agrocombustíveis: biocombustíveis e sustentabilidade, inovação tecnológica e mercado internacional.

A crise financeira serviu de pano de fundo de vários debates. Ela foi vista como uma oportunidade para um novo ciclo econômico – a partir da expansão da produção de biocombustíveis – como foi a crise de 1929 para o início da industrialização do Brasil – na visão do economista Ignacy Sachs.

Henrique Iglesias, ex-diretor do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), falou da crise atual, mas também das projeções de futuro, em 2050, em que haverá necessidade de sobrevivência alimentar e energética para 9 bilhões de habitantes do planeta.

Maria da Graça Forster, engenheira com 30 anos de carreira na Petrobras, disse que a segurança energética e alimentar “são essenciais para a soberania nacional” e fazem parte da “integridade de um país”. Quanto à questão da produção de biocombustíveis por países africanos, ela respondeu que “sem energia, é muito difícil ter acesso aos alimentos.”

Floresta tem de ser floresta

Para Roberto Smeraldi, fundador da ONG Amigos da Terra/Amazônia, a sustentabilidade dos biocombustíveis existirá na medida em que substituirem os combustíveis fósseis e não se somarem a eles.

Ao abordar a necessidade do zoneamento para produção de biocombustíveis, a senadora e ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, falou da importância “que a floresta continue floresta”.

No painel sobre inovações tecnológicas, o debate foi bastante animado. Falou-se da necessidade de disseminação da pesquisa em biocombustíveis, hoje concentrada em 75% no Brasil e nos Estados Unidos. Isso é um dos entraves para os países africanos, afirmou Mohamed Assan, presidente da Academia Africana de Ciências. “Precisamos de um grande centro internacional de excelência em biocombustíveis”, afirmou Hassan.

O professor e físico José Goldemberg, outro debatedor do painel, concordou com Hassan, afirmando que “o problema é aprofundar a tecnologia e disseminar conhecimentos”. Ele ressaltou que a produção de biocombustíveis é capaz de gerar até 60 vezes mais empregos do que seu equivalente em combustíveis fósseis.

Cana é como boi

Grande defensor do etanol, Goldenberg lembrou que, como gaúcho, “a cana é como o boi, aproveita do chifre ao rabo.”

Luiz Laranja, coordenador do programa de Agricultura e Meio Ambiente do WWF (Fundo Mundial pela Natureza), lembrou que a melhor energia é a que economizamos, para falar da inadequação dos carros (mesmo consumindo etanol) que pesam uma tonelada para transportar uma pessoa de 70 kg.

A pernambucana Lucia Melo, presidente do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), falou da dependência de fertilizantes importados para a produção de cana e que há pesquisas de substitutos na Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária.

Não há mercado

O último painel de debates abordou a questão do mercado internacional de biocombustíveis, constatando que ele ainda não existe. Para criá-lo, ainda há muito trabalho pela frente.

Como exemplo, o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, disse que “hoje, o Brasil só exporta etanol quando algum país aceita importar o produto, ou quando há alguma crise.”

Para haver um mercado internacional, o caminho seria incluir os biocombustíveis, especialmente o etanol, como comoditie ambiental e global na Organização Mundial de Comércio (OMC), sugere Tolmasquim.

o diretor-geral de Pesquisa Ambiental e Desenvolvimento do Ministério do Meio Ambiente da Itália, Corrado Clini, citou um estudo internacional que aponta para um mercado potencial de bioenergia da ordem de 25% da demanda energética global futura, nos próximos 25 a 30 anos.

Para isso, concordaram os debatedores, é necessário criar uma certificação internacional, com normas simples e consensuais, embora não haja as mesmas exigências por outras comodities como o petróleo, por exemplo.

Para criar um mercado internacional, é necessário ainda que outros países produzam e sejam capazes de exportar. Marcos Jank, presidente da União da Indústria de Cana-de-Açucar (UNICA) lembrou que “110 países produzem cana-de-açúcar, mas apenas um, o Brasil, exporta etanol. “Os outros, quando muito, fazem melaço e só exportam açúcar.”

A crise financeira pode adiar os investimentos para que esses países passem a produzir etanol, embora o Brasil se diga disposto a transferir tecnologia.
Mesmo assim, a capacidade do Brasil exportar etanol é limitada. Estima-se que a produção deverá aumentar de 150% nos próximos dez anos, 85% para atender a demanda interna.

Mecanização e certificação

A mecanização em curso dos canaviais preocupa o presidente da Confederação Nacional de Trabalhadores da Agricultura (CONTAG), Manoel José dos Santos. Quase um milhão de pessoas trabalham nos canaviais, “trabalho duro aceito por quem não pode fazer outra coisa”. Cada máquina substitui 100 trabalhadores, segundo Santos, e a melhor solução é transformá-los em agricultores familiares, de acordo com a Contag.

O problema da certificação internacional dos biocombustíveis, com critérios de sustentabilidade ambiental, social e econômica ainda não tem solução. Marcos Jank disse que atualmente há 51 propostas de certificação.

Charlotte Opal, chefe do Secretariado da Mesa Redonda de Biocombustíveis da Escola Politécnica Federal de Lausanne (EPFL), Suíça, participou dos debates e disse à swissinfo que a proposta é a única de caráter internacional e que ouve todas as partes.

Seminários estão sendo realizados nos cinco continentes e um texto básico, dito “versão zero” está em fase de consultativa até fevereiro próximo. Para abril ou maio está prevista uma nova versão, ainda provisório, com propostas de certificação.

swissinfo, Claudinê Gonçalves, São Paulo

Presentes na conferência de São Paulo, organizada pelo Ministério das Relações Exteriores:
92 delegações, entre elas a da Suíça,
38 ministros,
14 organizações internacionais,
250 jornalistas

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