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Justiça na Índia decide sobre medicamento de multi suíça

Ativistas organizam protesto contra a Novartis em Nova Délhi. Keystone

A Corte Suprema indiana deve divulgar até o final do mês a decisão relativa à proteção de patentes de um medicamento contra o câncer, em uma disputa legal envolvendo a multinacional farmacêutica suíça Novartis.

Grupos de defensores de causas específicas promovem campanhas contra a Novartis no caso “Glivec/Gleevec” desde 2007.

Eles acusam a empresa de “perenizar”, ou seja, estender a validade da patente através de alterações insignificantes no medicamento já existente.

Os grupos – que incluem a Declaração de Berna, Oxfam e Médicos sem Fronteiras (MSF) – vêm no caso um teste no qual a vitória da Novartis pode significar o enfraquecimento da indústria indiana de genéricos, apoiada pelas ONGs por promover a produção de medicamentos a preços acessíveis, estendendo no país as limitações impostas pela proteção de patentes.

“Se a Novartis sair vitoriosa na disputa, as patentes serão defendidas na Índia em um contexto muito mais amplo do que já ocorre nos países desenvolvidos e nas novas fórmulas de medicamentos conhecidos já em uso. A Índia não será mais capaz de fornecer os países em desenvolvimento com medicamentos de qualidade a preços acessíveis.”, argumentam os representantes da Médicos sem Fronteiras.

Esse cenário apocalíptico é desmentido pela Novartis, que defende o alinhamento da Índia com outros países produtores de farmacêuticos. Ela afirma que os produtores de genéricos continuarão livres para produzir os medicamentos, cujas patentes já estão vencidas.

Porém medicamentos podem perder rapidamente a proteção de patentes. Foi o que observou essa semana a Bayer ao perder uma disputa legal com o governo indiano.

A multinacional farmacêutica alemã foi forçada a conceder uma licença a um fabricante local de genéricos para o Nexavar, um medicamento de preço elevado. As autoridades indianas consideraram que o produto utilizado no combate ao câncer de fígado e rim estava fora do alcance financeiro para os pacientes. Foi a primeira vez que uma disposição legal foi aplicada no caso.

Como a Bayer, também a Novartis afirma que apenas está tentando proteger a propriedade intelectual. “Não queremos que as pessoas copiem nossas substâncias sem ter feito nenhuma pesquisa e depois distribuí-las a baixo custo, arruinando nossos negócios”, defende Paul Herrling, chefe de pesquisa na Novartis, durante uma entrevista dada à televisão suíça.

O que há de novo? 

No cerne do argumento está o “Imatinib”, um composto molecular desenvolvido pela Novartis em 1993. Ele foi posteriormente desenvolvimento no sucesso de vendas “Glivec/Gleevec”, um remédio patenteado em quarenta países.

A Índia só introduziu a defesa de patentes para farmacêuticos em 2005, com uma disposição específica que exclui proteção de patentes para modificações de drogas existentes. A maioria das aplicações de patentes farmacêuticas na Europa cai na categoria de “nova e melhorada”. A Novartis sustenta vigorosamente que o Glivec não.

“Esse processo, que levou anos, foi muito mais do que uma melhoria incrementada: foi um avanço e que certamente não pode ser interpretado como um ‘evergreening’ (n.r.: mecanismo de extensão do monopólio)”, escreve a empresa no seu site.

No entanto, apoiando-se na oposição dos fabricantes de genéricos e na Associação Indiana de Pacientes de Câncer, um órgão indiano de registro de patentes rejeitou o pedido para a patente do Glivec em janeiro de 2006, baseando sua decisão no fato que este seria apenas uma versão do já existente “Imantib” e não representaria uma verdadeira inovação de “maior eficácia”.

A decisão desencadeou a saga legal, que deve ser concluída finalmente pela Corte Suprema indiana em 28 de março. Mas por que ir tão longe?

“A Novartis esteve frequentemente na linha de frente para moldar o ambiente regulatório”, avalia o analista farmacêutico Karl Heinz Koch, da Helvea, uma empresa de análises de finanças e investimentos sediada em Genebra.

A Índia é considerada importante no caso não apenas através da sua indústria de genéricos, mas também pelas dimensões do seu mercado.

“Pela sua população o país é visto como um dos mais importantes mercados emergentes. Lá existe uma classe média que pode facilmente se dar o luxo de financiar até os tratamentos mais custosos contra o câncer como é o caso do Glivec,” considera Koch.

Aberta aos negócios 

Os ativistas acusam a Novartis de estar atacando “a indústria farmacêutica dos países em desenvolvimento”, mas a multinacional se opõe a essa descrição da Índia, destacando que os fabricantes de genéricos do país vendem mais medicamentos nos países ricos do que em outros lugares.

Michelle Childs, da ONG Médicos sem Fronteiras considera essa posição absurda. “É muito estranho que a Novartis faça uma afirmação dessas, pois organizações como a MSF, UNAIDS (programa das Nações Unidas para combater a AIDS), o Fundo Global (de Luta contra a AIDS, Tuberculose e Malária) e o PEPFAR (plano de ajuda de urgência na luta contra a AIDS criada pelo presidente dos EUA, George Bush, em 2003) têm 90% do seu suprimento de medicamentos antirretrovirais e também outros medicamentos para malária e cada vez mais vacinas originadas da Índia.”

Em uma resposta por escrito, depois de questionada pela swissinfo.ch acerca de alegação, os representantes da Novartis reiteram as observações feitas em seu posicionamento sobre o caso, disponibilizada através de um link no seu site.

“A realidade é que os fabricantes indianos de genéricos exportam seus produtos principalmente aos mercados onde eles podem vendê-los a lucro”, afirma a multinacional.

“Melhorar o acesso à saúde é muito mais do que preços reduzidos. O acesso a medicamentos sofre barreiras políticas, econômicas e mesmo de logística”, continua. 

O risco do HIV 

Novartis afirma que o caso do Glivec trata-se de “obter clareza na aplicação da lei de proteção de patentes na Índia, o que é importante para o futuro da economia do país.”

Não é coincidência que a Índia, como maior exportador do mundo de genéricos, pretenda limitar o quanto possível o acesso à proteção de patentes sob as leis internacionais. 

A preocupação das ONGs é que a vitória da Novartis possa significar que mais medicamentos estarão beneficiando da proteção de patentes na Índia, colocando-os fora do alcance dos pacientes pobres no mundo.

“Por exemplo, os que necessitam de combinações de doses fixas aonde você junta várias pílulas em uma ou versões de medicamentos voltados às crianças. Agora (se a lei for mudada) com esse tipo de adaptações as pessoas poderão pedir patentes”, afirma Childs.

Para a Novartis, esse é um argumento “falso e enganador”. Ela mantém a sua posição de que o acesso aos medicamentos, incluindo remédios para HIV/AIDS, não são atingidos pelo caso. “Genéricos que são disponíveis atualmente e lançados no mercado antes de 2005 continuarão a estar disponíveis, independentemente dos resultados jurídicos do nosso caso.”

Com os dois lados atuantes no negocio de salvar vidas, ainda que em diferentes papeis, é claro que a tensão será máxima quando os juízes em Nova Déli irão divulgar a sua decisão.

A Índia é signatária do acordo de proteção à propriedade intelectual da OMC desde 1o. de janeiro de 2005. Mas as próprias leis de proteção de patentes do país negam proteção aos medicamentos que foram patenteados antes de 1995 ou suas modificações ou novas formas de medicamentos já existentes.

As autoridades indianas rejeitaram a proteção de patentes a Novartis para o “beta crystal”, o ingrediente ativo do Glivec. Elas argumentam que ele é uma adaptação de um componente já existente. O “beta crystal” tem proteção garantida em 40 outros países. 

A Novartis ressalta que 95% dos usuários do Glivec na Índia recebem o medicamento gratuitamente, mas as ONGs contrapõem afirmando que as versões genéricas do Glivec são apenas um décimo do preço. Eles lembram que a cada ano surgem 25 mil novos casos de Leucemia mielóide crônica na Índia.

A Novartis lançou Glivec (ou Gleevec nos EUA), que freia a propagação das células cancerosas relacionada à doença sanguínea leucemia mielóide crônica e certas formas raras de câncer gastrointestinal, em 2001.

No ano passado a Novartis revelou que as vendas do Glivec totalizaram 4,7 bilhões.

O Glivec controla, mas não cura o câncer. Portanto ele obriga o uso até o fim da vida.

O tratamento anual custa entre 40 mil e 98 mil dólares dependendo do desenvolvimento da enfermidade e da dosagem.

Adaptação: Alexander Thoele

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