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Mundo cheira a Givaudan (II)

A sede mundial da Givaudan está em Vernier, próximo a Genebra. Givaudan

Aromas são o principal produto da Givaudan. O desafio de criar em laboratório o cheiro de frutas tropicais, chocolate e café. Tecnologia de ponta na produção da comida do futuro.

O nascimento da multinacional suíça em 1895 através da iniciativa dos irmãos Givaudan. Fusões, compras e vendas até a liderança do mercado mundial.

O nariz é um dos órgãos mais espetaculares e sensíveis do corpo humano. Ele é capaz de reconhecer mínimas partículas em um bilhão. Aromas complexos como o de carne grelhada são compostos de gases com até mais de mil diferentes compostos químicos.

Como tudo o que o ser humano ingere precisa passar pelo crivo exigente do olfato, nada mais importante para a indústria alimentar de dar aos seus produtos os odores necessários.

O setor mais importante da Givaudan é o de aromas, que responde a 59% do faturamento anual da empresa (1,2 bilhões de dólares). Os principais compradores são os fabricantes de produtos alimentícios, de bebidas, farmacêuticos e de cosméticos. E as vendas não param de crescer.

Jornalistas visitam a cozinha-laboratório da Givaudan

Nos Estados Unidos mais de 95% dos alimentos consumidos são industrializados. O tempo escasso, a falta de conhecimento na cozinha e os preços baixos são os fatores que fizeram as famílias trocarem as panelas pela comida pré-fabricada.

Nos laboratórios da Givaudan em Kemptthal, um povoado próximo a Zurique e onde no passado se produziu pela primeira vez as sopas “Maggi”, especialistas desenvolvem aromas para a indústria alimentícia. Frutas tropicais também estão no cardápio da empresa.

Numa demonstração feita para jornalistas convidados, a empresa mostrou como se produz um aroma. O exemplo escolhido veio da América Latina.

Software substitui cozinheiro

Um chefe de cozinha foi trazido especialmente do México para a demonstração. Ele trabalha de forma tradicional e começa a cozinhar numa panela um molho para nachos, os tradicionais chips de milho. Os ingredientes são simples: tomates, pimenta, cebola, alho, sal, coentro e água.

Em cima da panela é colocado um aparelho especial que suga a fumaça. Esta é conduzida por um tubo e atravessa por um filtro especial. O filtro é um cilindro branco que acumula todas as moléculas de aroma. Colocado num computador, ele revela os segredos do cheiro de qualquer receita. “Utilizamos um software especialmente desenvolvido por nós, o Miniwas, que nos possibilita analisar os ingredientes do aroma e reconstituí-lo posteriormente, utilizando ingredientes naturais ou químicos”, explica o técnico da empresa.

A versão industrial molho necessita de apenas quatro ingredientes: extrato de cebola, resina de pimenta, coentro e o elemento químico CIS-3-hexenol.

Desconfiados, os jornalistas pedem para experimentar as duas versões. A supresa é grande ao descobrir que o molho industrial cheira melhor e é mais saboroso. A resposta é dada pelos técnicos: – “Aromas são muito voláteis e em questão de horas desaparecem. Na indústria alimentícia é necessária a sua utilização, pois senão os alimentos embalados ficam insossos e inodoros”.

Se alguns produtos necessitam de apenas quatro componentes, outros são mais complexos: os aromas de café e chocolate são considerados os mais difíceis de manipular devido a sua complexidade.

Enxofre vira maracujá

No desenvolvimento de aromas de frutos tropicais a multinacional suíça também tem uma grande experiência. No teste, seus técnicos mostram como é possível criar o cheiro de maracujá em laboratório. “Esse é um dos aromas mais fáceis de criar, pois é composto quase interamente de enxofre”.

Depois que o cheiro forte do mineral é reduzido atravé da adição discreta de outros componentes, o aroma lembra realmente a fruta tropical. A prova é feita através dos “cheiradores”, aparelhos onde os técnicos colocam seus narizes para analisar suas novas descobertas.

O caju é mais complicado e exige a utilização de pelo menos 40 componentes químicos. Na natureza, o cheiro da fruta tropical vem de 100 diferentes tipos de moléculas.

O aroma artificial de coco também não é complicado: seu segredo está na “lactone”, um monossacarídeo tirado do leite. Depois de pronto, ele faz com que produtos mais diversos como sabão, sorvetes, xampu, balas e detergente, nos tragam lembranças tropicais e aumentem as vendas da indústria.

Críticos da indústria

A Givaudan continua expandindo. Em 2002, ela comprou o setor de aromas do gigante do setor de alimentos Nestlé. Nos últimos anos o mercado tem vivido um processo de concentração crescente. Não sem efeitos para o consumidor.

Uma sopa em pó de galinha, um produto encontrado comumente nas prateleiras dos supermercados, deve seu gosto e sabor aos produtos como os fabricados pela Givaudan. Na realidade, essa embalagem contém apenas dois gramas de carne seca em forma de grão. O resto é composto de condimentos, vegetais desidratados, sal, corantes e aromas. Para muitos, a fronteira entre a realidade e a ficção está se tornando muito tênue na indústria alimentícia.

O jornalista alemão Hans-Ulrich Grimm é um dos críticos mais conhecidos na Europa desse setor. “A industria alimentícia já não tem interesse de utilizar matérias-primas saudáveis, de boa qualidade, para fabricar seus produtos”, escreve o autor no famoso best-seller intitulado “A sopa que mente”.

Para Grimm, a humanidade já não conhece mais os verdadeiros sabores e odores dos produtos naturais, já que é “enganado pelos produtos que vem das esteiras rolantes na indústria”.

Givaudan contrapõe às críticas através de programas como a pesquisa realizada em regiões exóticas à caça de novos sabores e utilização de produtos naturais. “Já organizamos expedições em florestais tropicais na Guiana Francesa, Gabão, Madagascar e Nova Guiné para capturar com aparelhos portáteis novos aromas que irão nos inspirar na criação dos nossos produtos”.

História da Givaudan

A história da Givaudan mostra o crescimento alucinante dos mercados de aromas e perfumes e a luta encarniçada das multinacionais para dominá-lo. A industrialização crescente é o motor que impulsiona compras e fusões.

Tudo começou em 1895, quando o químico Léon Givaudan e seu irmão, o farmacêutico Xavier Givaudan, criaram em Zurique uma empresa para a fabricação de aromas. Três anos depois ela foi transferida para Vernier e nunca mais saiu de lá. Até mesmo a rua onde hoje está localizada a sede mundial da empresa tem um nome inspirador: “chemin de la Parfumerie” (caminho da perfumaria, em português).

No início dos anos 1920, Givaudan criou suas primeiras filiais nos Estados Unidos e comprou uma empresa francesa chamada “Sopros”. Nos anos 30 ela continuou a expansão e abriu filiais na Itália e Canadá.

Dois séculos passaram-se e a empresa já tinha fábricas na Inglaterra e no Brasil. Ao mesmo tempo, ela comprava uma empresa química em Dübendorf, localizado nas proximidades de Zurique. Atualmente lá está localizada a sede européia da divisão de aromas e um gigantesco laboratório para pesquisa e desenvolvimento de perfumes.

O filtro solar mais conhecido no mundo

Porém, não apenas com aromas e perfumes a Givaudan conquistou os mercados mundiais. Nos anos cinqüenta ela desenvolveu o Parsol MCX, um filtro solar que até hoje é componente de produtos populares no mercado, assim como o Parsol 1798, que no folheto da empresa é considerado “o mais célebre filtro UVA do mundo.

Em 1963, a companhia era comandada por um dos seus fundadores, Xavier Givaudan, que tinha 97 anos. Devido a forte concorrência no mercado mundial e falta de sucessores, ele decidiu vender sua empresa para a grande multinacional farmacêutica Hoffmann-La Roche.

Mesmo estando integrada ao grupo Roche, Givaudan continuou sua corrida pela liderança mundial pelo mercado bilionário do setor de perfumes e aromas. Como uma célula, ela não parou de aglutinar ou a se fundir com outras grandes empresas. A lista de aquisições parece interminável: Riedel-Arom (Alemanha); Fritsche, Dodge & Olcott (EUA); Roure (França); Fries & Fries (EUA) e Polaks Frutal Works (Holanda). No final dos anos 80, Givaudan já estava presente em 96 países e possuía 16 filiais espalhadas pelo mundo.

Em 8 de junho de 2000, a empresa se separou da Roche para tornar-se uma sociedade anônima, com ações cotadas na bolsa de valores suíça. Dois anos depois ela compra da Nestlé o seu setor de aroma. A última aquisição da Givaudan foi a IBF, uma pequena empresa especializada na criação de aromas naturais de queijo e produtos laticínios.

swissinfo, Alexander Thoele

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