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Política agrícola suíça e brasileira

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Por Paul Ammann Suíço do Brasil é convidado da redação.

O fracasso da reunião de julho 2008 da “Rodada de Doha”, em Genebra, lançada em 2001 na capital de Quatar (Doha) pela Organização Mundial do Comércio (OMC), realça as discrepâncias das políticas agrícolas entre os 153 países-membros da OMC.

Esses países organizaram-se em blocos ou grupos de interesse. A Suíça liderou o G 10, composto dos 10 países mais pobres em termos agrícolas, chamados “importadores líquidos de produtos agrícolas”, ou seja, que importam mais alimentos do que exportam. São países com pouca terra agricultável e com clima desfavorável à plantação durante os 12 meses do ano.

O Brasil liderou o G 20, com (atualmente) 23 países emergentes e/ou em desenvolvimento. As nações emergentes são predominantemente agro-exportadoras, possuindo imensas terras férteis e clima que permite atividades agrícolas durante todo o ano. O Brasil se destaca no G 20 não somente como líder, mas como “país que mais cresce no mundo em geração de excedentes” de alimentos, conforme consta no Plano Agrícola e Pecuário 2008/2009. São nações ávidas de vender os frutos de seus abundantes recursos naturais, sem tolerar restrições ou proteção por parte dos países importadores. Por isso são os grandes promotores do livre comércio mundial de produtos agricolas.

A política agrícola suíça

A política agrícola suíça é caracterizada por séculos de luta pela segurança alimentar da população. Já no ano de 58 antes de Cristo os suíços, percebendo que a topografia montanhosa e o frio não permitiriam mais colher produtos agrícolas suficientes para manter a comunidade, decidiram emigrar para a França. O exército do Império Romano, entretanto, os forçou a retornar à sua terra.

Durante séculos, os agricultores conseguiram suprir uma parte da demanda da população, tendo a outra que ser importada. No século 20, duas guerras isolaram a Suíça, dificultando sobremaneira a importação dos alimentos que faltavam.

O governo, então, incentivou a agropecuária e aplicou um plano de expansão da plantação, a chamada “batalha da plantação” que conseguiu dobrar a área plantada, utilizando inclusive as superfícies de parques públicos, campos de esporte e terras em altitudes acima de 1500 metros. O grau de abastecimento interno aumentou o suficiente para salvar da fome a população e os 300.000 refugiados estrangeiros.

Alto custo de produção

Contudo, a produção agrícola suíça é cara, devido à topografia, ao clima e a elevada remuneração do trabalho agrícola. Por uma questão de justiça social, a qualidade de vida dos agricultores e dos trabalhadores rurais é igual à dos demais trabalhadores públicos e privados. Por essas razões, o custo da produção é tão elevado que o preço do produto final não é mais competitivo com os produtos de países emergentes que pagam baixos salários.

Para que o agricultor suíço possa vender seus produtos em quantidade suficiente e com um preço adequado para sobreviver, o governo toma medidas de proteção, estabelecendo tarifas de importação e fornecendo subsídios aos agricultores.
Esse protecionismo é combatido veementemente pelo Brasil e pelos demais países agro-exportadores.

Por outro lado, a aceitação da proposta da reunião Doha-OMC – de reduzir as tarifas de importação em 60% – levaria em torno de 30% das atuais fazendas suíças à falência e poria em perigo a segurança alimentar da população em caso de crises internacionais.

Apesar do futuro sombrio para a agropecuária nacional, a Suíça coopera com a OMC. Na “Política Agrária 2011”, o Ministério da Agricultura elimina as subvenções às exportações e corta a metade dos subsídios aos agricultores. Os agricultores são conscientes de que devem intensificar a redução dos custos da produção, melhorar mais ainda a qualidade dos produtos para garantir preços melhores e, finalmente, preparar-se gradativamente para a liberalização global da agricultura até 2016.

Política agrícola brasileira

Desde sua descoberta, a política agrícola do Brasil é essencialmente uma política de exportação de produtos primários e, mais recentemente, de produtos industrializados.

O “Plano Agrícola e Pecuário 2007/2008”, lançado em 28 de junho 2007 pelo ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, confirma essa linha. Na ocasião do lançamento, o ministro da agricultura proferiu um discurso apresentando o sucesso da política agrícola.

O agronegócio brasileiro responde por 25% do PIB. Em 2006, “o setor exportou 50 bilhões de dólares, apresentando um superávit de 43 bilhões. E do total do superávit da balança comercial brasileira, as exportações do agronegócio contribuíram com 92,5%. Nos últimos cinco anos, a agricultura do País é a que mais cresce em exportações. A taxa anual de crescimento foi de 16,3%, a mais alta do mundo”.

Segundo exportador mundial

Especificando a mercadoria exportada, o ministério explica que o Brasil é o maior exportador de carne bovina, frango, açúcar, café, suco de laranja e o segundo maior exportador de grãos, farelo e óleo de soja do mundo. O valor das exportações coloca o Brasil na segunda posição no ranking dos principais exportadores de alimentos e matérias primas, no mundo.

O ministério conclui que “as previsões para o futuro são excelentes: temos terra, água, tecnologia de ponta e competitividade e, por fim, gente para produzir”. Para realizar as previsões, o ministério subsidia os agricultores através de grande número de prêmios ou benefícios, como créditos com juros reduzidos, aquisição de produtos e garantia de preços mínimos.

Conforme o ministro, “o agronegócio cumpre, com eficiência”, a função básica de “levar alimentos à mesa dos brasileiros, em quantidade, com qualidade e preços baixos”. Essa função, entretanto, não foi inteiramente cumprida e em razão disso o Presidente Lula criou o Programa Fome Zero. Graças ao Programa a renda de 11 milhões de famílias pobres aumentou de modo que podiam comprar mais alimentos.

Segurança alimentar

Uma avaliação, realizada pelo Ibase-INEP, mostra que em 2007 dois milhões de famílias beneficiárias do Programa chegaram ao estado de plena segurança alimentar, sete milhões alcançaram um grau de insegurança alimentar leve ou moderada e dois milhões de famílias (onze milhões de pessoas) encontram-se ainda em situação de insegurança alimentar grave.

Nos últimos 12 meses o preço dos alimentos básicos subiu – arroz 50% e feijão 140% – mas ao mesmo tempo a economia cresceu. No 1º semestre de 2008 a economia gerou 1,4 milhão de novos empregos formais o que melhorou a renda das famílias e sua segurança alimentar. Se a economia continuar crescendo e se uma parte dos rendimentos adicionais do capital for redistribuída na remuneração dos trabalhadores, a segurança alimentar será alcançada em pouco tempo.

Paul Ammann nasceu em Davos e mora em Natal. Estudou filosofia (Munich), sociologia (Paris) e economia (Boston). Trabalhou como diretor de escola técnica em Surakarta (Indonésia) e como assessor chefe do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) em Brasília.

Foi coordenador no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e assessor científico dos Ministérios do Trabalho do Brasil e da Suíça e das Secretarias de Saúde Pública do Rio Grande do Norte e do Estado de Berna.

Atualmente é consultor do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA).

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